Hong Kong. Nova lei da segurança nacional faz primeiros detidos

por Joana Raposo Santos - RTP
Cerca de quatro mil polícias mantêm-se em alerta por toda a cidade. Foto: Tyrone Siu - Reuters

As autoridades policiais de Hong Kong realizaram esta quarta-feira as primeiras detenções ao abrigo da nova lei de segurança nacional, que proíbe contestações contra o Governo chinês, apenas um dia depois de a mesma ser aprovada por Pequim. Entre as dezenas de pessoas detidas durante os protestos contra a lei está um homem que segurava uma bandeira de independência da região autónoma.

Centenas de pessoas saíram às ruas esta quarta-feira, dia da entrada em vigor da lei que pretende proibir contestações, divisões, insubordinações e atos de terrorismo e conluio contra o Governo chinês ou outras “forças estrangeiras”.

Em Causeway Bay, centro da atividade comercial em Hong Kong, a polícia disparou gás lacrimogéneo contra os manifestantes, preparou canhões de água e dispersou a multidão. Além disso, realizou cerca de 70 detenções, duas das quais por suspeita de violação da nova lei de segurança nacional.

Esses dois detidos foram um homem que segurava uma bandeira de independência e uma mulher com um cartaz onde se lia “Independência de Hong Kong”. Os manifestantes tinham já sido avisados de que determinadas frases ou símbolos poderiam constituir crimes ao abrigo da lei imposta por Pequim.

A entrada em vigor da nova lei e os protestos coincidiram com o 23.º aniversário da transferência de Hong Kong da soberania britânica para a chinesa. A ocasião, que costuma ser celebrada todos os anos, foi desta vez banida pelas autoridades devido à proibição de ajuntamentos de mais de 50 pessoas para prevenir a propagação do novo coronavírus.

Foi esse o argumento para a detenção de pelo menos 30 dos manifestantes, que de acordo com a polícia “estavam reunidos ilegalmente, violaram a lei de segurança, obstruíram a ação dos polícias e tinham armas na sua posse”.

Nas redes sociais tem circulado a fotografia, cuja veracidade foi confirmada pela polícia, de uma bandeira utilizada pelas autoridades para alertar as multidões para as consequências da nova lei. “Este é um aviso da polícia. Vocês estão a mostrar bandeiras e cartazes, a entoar cânticos e a comportar-se com intenções de contestar e dividir [a autoridade de Pequim], o que pode constituir crime sob a lei de segurança nacional. Poderão ser detidos e julgados”, lê-se na bandeira.


Apesar dos confrontos entre manifestantes e polícias, alguns dos ativistas pró-democracia presentes nas demonstrações desta manhã prometeram voltar a protestar durante a tarde de hoje. “Marchamos todos os anos, e continuaremos a marchar”, garantiu um deles à agência Reuters.

Os polícias mantêm-se em alerta por toda a cidade. De acordo com o South China Morning Post, são cerca de quatro mil os agentes destacados para lidar com qualquer agitação.

Uma fonte da polícia contou à CNN que, a 30 de junho, vários comandantes participaram numa sessão de treino na qual lhes foi dito que qualquer pessoa com bandeiras de independência ou a entoar cânticos nesse sentido deveria ser detida.
Os contornos da nova lei
Sob a nova lei, os crimes de contestação, divisão, insubordinação, terrorismo e conluio contra forças estrangeiras, entre as quais a China, passam a ser puníveis com um mínimo de três anos de prisão, sendo a pena máxima a prisão perpétua.

Uma das ações que passam a ser criminalizadas e que poderão levar a detenções são a vandalização de transportes e infraestruturas, algo que aconteceu por diversas vezes durante os protestos levados a cabo no ano passado. Agora, tal ação é equiparada a terrorismo.

De acordo com o artigo 38 da lei, esta também pode ser quebrada por estrangeiros e não apenas por residentes de Hong Kong, pelo que pessoas de fora podem ser detidas se se suspeitar que quebraram alguma das novas regras.

A lei dita ainda a criação de escritórios em Hong Kong para lidarem com casos de segurança nacional, mas que terão também poderes acrescidos, tais como a supervisão da educação sobre a segurança nacional nas escolas da região autónoma.

Na semana passada, a chefe do executivo de Hong Kong, Carrie Lam, tinha afirmado que a nova lei “apenas se aplica a uma extremamente pequena minoria de pessoas” e que o seu objetivo é assegurar “a prosperidade e estabilidade de Hong Kong a longo prazo”, estando “alinhada com os direitos e liberdades” da região.

A legislação tem sido amplamente criticada por legisladores da oposição em Hong Kong, grupos de defesa dos Direitos Humanos e políticos à escala internacional, que temem a solidificação do poder de Pequim sobre o território autónomo.

Em Hong Kong, defensores da democracia consideram que será o fim do lema “um país, dois sistemas”. Pequim argumenta, por outro lado, que a lei é essencial para proteger a segurança nacional após os mais de seis meses de violentos protestos em 2019 contra a lei da extradição e para combater a instabilidade na cidade.
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