Indonésia. Adiada lei que visa proibir relações sexuais fora do casamento

por RTP
O presidente indonésio, Joko Widodo, durante uma sessão comemorativa no Parlamento Willy Kurniawan, Reuters

O Governo e o Parlamento da Indonésia chegaram a acordo sobre o novo código penal com vista a tornar ilegal o sexo fora do casamento, a venda de contracetivos e a possibilidade de criticar o presidente. Este pediu, contudo, que o projeto de lei fosse adiado, face à forte oposição da população.

A Indonésia é, há muito, considerada um exemplo de tolerância entre as diferentes religiões e culturas do arquipélago, mas um novo projeto de lei conservador está agora a gerar polémica. Em causa está uma série de proibições estimuladas por vozes de grupos islamitas conservadores, que vêm ganhando força no país nos últimos anos.

O projeto de lei em questão prevê que os casais que têm relações sexuais fora do casamento sejam presos por seis meses ou multados num montante até 10 milhões de rupias (1.046 dólares), o equivalente a três meses de salário para a maioria dos habitantes do país.

Ainda segundo o projeto de lei, o aborto passará a ser proibido e se uma mulher decidir fazê-lo sem que seja haja nenhuma emergência médica, e não sendo a gravidez fruto de violação, poderá ser punida com uma pena máxima de quatro anos de prisão.

Quem promover ou vender preservativos também será multado ou terá de cumprir um período de prisão de seis meses, por comércio não autorizado de "ferramentas de aborto".
Lei impede críticas ao presidente

O projeto de lei reintroduz também a proibição de "atacar a honra ou a dignidade" do presidente e vice-presidente da Indonésia.

“O Estado deve proteger os cidadãos de comportamentos contrários aos supremos preceitos de Deus”, disse à Reuters Nasir Djamil, do Partido Justiça Próspera, para justificar a decisão do Governo.

A nova legislação seria, contudo, fortemente criticada pelos defensores dos Direitos Humanos e por muitos cidadãos do país, que criaram uma petição contra o projeto de lei que conta entretanto com meio milhão de assinaturas. Entre estas, a de Joko Anwar, um realizador cinematográfico que expressou a sua discórdia no Twitter.



"É uma loucura se este texto for votado, uma loucura! No que é que se está a tornar este país?!!!", interrogou-se Joko Anwar na rede social, onde é seguido por 1,7 milhão de pessoas/perfis.

Andreas Harsono, investigador da Human Rights Watch, também mostrou a sua indignação. "O rascunho do código criminal da Indonésia é desastroso, não apenas para as mulheres e minorias religiosas e de género, mas para todos os indonésios", afirmou o ativista em comunicado.

Face às reações negativas que este projeto de lei tem suscitado, o presidente Joko Widodo veio já esta sexta-feira pedir que o texto fosse revisto.

A votação do texto estava marcada para a próxima semana, mas o chefe de Estado pediu que fosse adiada para a sessão parlamentar seguinte: "Depois de ter ouvido vários grupos que se opunham a vários aspetos da lei, decidi que eram necessárias discussões mais amplas sobre certos pontos", declarou o presidente reeleito recentemente para um segundo mandato.
Turismo será “certamente afetado”

Bali é uma das ilhas da Indonésia que atrai mais turistas, tendo sido visitada por mais de 6 milhões de estrangeiros no ano passado, mais de 1 milhão australianos, segundo o departamento de estatísticas da Indonésia.
Devido ao grande fluxo de turistas australianos, as autoridades de Camberra já emitiram um alerta a pedir aos seus cidadãos que viajem para a Indonésia para serem cautelosos.

Aaron Connelly, que lidera a Política do Sudeste Asiático e o programa de Política Externa do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, acredita que o turismo será "certamente afetado" no caso de a lei vir a ser aprovada: "O projeto de lei prejudicará a perceção da Indonésia como um local tolerante e fará com que muitos ocidentais pensem duas vezes antes de visitar o país".

É o caso, nomeadamente, de pessoas homossexuais, que estão diretamente visadas pela lei. "Casais do mesmo sexo podem sentir-se particularmente desconfortáveis em visitar a Indonésia, pois parte da cláusula criminaliza as relações entre pessoas do mesmo sexo”, concluiu Connelly.

O político indonésio Teuku Taufiqulhadi veio entretanto garantir que os estrangeiros que visitam o país não serão punidos. "Não há problema, desde que as pessoas não saibam", afirmou, embora esta seja uma leitura que não é consensual para a nova legislação que, sendo aprovada, levará dois anos a entrar em vigor.
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