Juízes cabo-verdianos contra pressão no processo de extradição de Alex Saab

por Lusa

O presidente do Conselho Superior de Magistratura Judicial (CSMJ) cabo-verdiano rejeitou hoje pressão sobre os juízes que vão decidir o pedido de extradição de Alex Saab, alegado testa-de-ferro de Nicolás Maduro, pedindo uma decisão com "fundamentos sólidos".

Falando aos jornalistas na Assembleia Nacional, na Praia, após entrega ao presidente do parlamento do relatório sobre a Situação da Justiça no ano judicial 2019/2020, o juiz Bernardino Delgado afirmou os "casos mediáticos", como este, opondo Estados Unidos e Venezuela, "suscitam normalmente" uma "tentação para haver pressão".

"Mas eu estou em crer que juízes cabo-verdianos, os juízes que vão decidir este caso, são incólumes, estão imunes, a toda essa pressão que está a vir", afirmou o presidente do CSMJ, órgão que tutela os 55 juízes colocados nos tribunais de Cabo Verde.

Alex Saab, 48 anos, foi detido em 12 de junho pela Interpol e pelas autoridades cabo-verdianas, durante uma escala técnica no Aeroporto Internacional Amílcar Cabral, na ilha do Sal, com base num mandado de captura internacional emitido pelos Estados Unidos da América (EUA), que o consideram um testa-de-ferro do Presidente da Venezuela, Nicolás Maduro.

Entretanto, o Tribunal da Relação do Barlavento, na ilha de São Vicente, a quem competia a decisão de extradição formalmente requerida pelos EUA, aprovou esse pedido em 31 de julho, mas a defesa de Saab recorreu para o Supremo Tribunal do país.

"A garantia que temos de dar às cabo-verdianas e aos cabo-verdianos é, em como este processo, seja qual for o sentido da decisão, que seja uma decisão forte, em termos de fundamentos, sólidos, e que não se deixe penetrar a pressão que tem havido e eu acredito que os juízes vão decidir com independência esse processo, independentemente do sentido da decisão que vier a ser tomada", afirmou Bernardino Delgado.

Este caso tem conhecido vários contornos mediáticos, com o antigo juiz espanhol Baltasar Garzón a integrar a defesa internacional de Alex Saab.

No início do mês de setembro, a Procuradoria-Geral da República (PGR) cabo-verdiana anunciou que realizou uma "visita surpresa" à cadeia onde está detido Alex Saab, não tendo encontrado indícios de tortura, como alegava o empresário colombiano.

A PGR afirmou que a visita foi feita por dois procuradores da República e um oficial de Justiça, na sequência de uma carta que Alex Saab tornou pública a partir da cadeia, na ilha do Sal, onde aguarda a decisão dos tribunais cabo-verdianos sobre o pedido de extradição dos EUA, na qual alegava estar a ser torturado por "quatro empregados" norte-americanos naturais de Cabo Verde.

"Das diligências efetuadas resulta que não existem indícios de que o detido tenha sido torturado, havendo, pelo contrário, indícios fortes de que o mesmo vem se automutilando dentro da cela, o que levou a direção do Estabelecimento Prisional a retirar-lhe o objeto pessoal utilizado para o efeito", afirmou a PGR.

No início de setembro, Alex Saab denunciou em carta citada pelo El Mundo que "os Estados Unidos têm quatro empregados naturais de Cabo Verde" que o estão a torturar na prisão onde está detido, no arquipélago.

"Os Estados Unidos têm quatro empregados que entram na minha cela todas as noites e me espancam para que faça declarações falsas contra [Nicolás] Maduro", de acordo com a carta enviada por Saab.

"Sou um enviado especial da Venezuela à Rússia e ao Irão, tenho imunidade diplomática e exijo a minha libertação", insistiu o empresário colombiano.

Alex Saab afirma que "o objetivo destes criminosos", os alegados quatro homens que o torturam, é que "assine a sua extradição voluntária para os Estados Unidos", assim como que faça declarações falsas contra Maduro.

O primeiro-ministro cabo-verdiano afirmou entretanto, em entrevista à Lusa, que a decisão sobre a extradição do empresário compete à Justiça, recusando participar na "novela" envolvendo o caso.

"O Governo de Cabo Verde e os tribunais de Cabo Verde não são pressionáveis", afirmou o primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, questionado sobre os contornos deste processo.

"Este caso está a ser transformado numa novela na comunicação social, com cartas, artigos, declarações, tentando levá-lo para o campo político `tout court` [simplesmente]. O Governo de Cabo Verde faz questão de não entrar no elenco da novela", acrescentou.

Durante a fase administrativa do processo de extradição, antes de seguir para decisão judicial, o Governo cabo-verdiano, através do Ministério da Justiça, autorizou esse pedido com base num parecer da PGR.

Ulisses Correia e Silva garante que a posição do Governo é inequívoca: "O caso está entregue à Justiça e é a Justiça que deve decidir em última instância".

Os EUA acusam Alex Saab de ter branqueado 350 milhões de dólares para pagar atos de corrupção do Presidente venezuelano, Nicolás Maduro, através do sistema financeiro norte-americano, enquanto a defesa do empresário colombiano afirma que este viajava com passaporte diplomático, enquanto "enviado especial" do Governo da Venezuela e que por isso a detenção foi ilegal.

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