Kansas rejeita proibição do aborto. Decisão é vista como um "grito de alerta" para os republicanos

por Mariana Ribeiro Soares - RTP
Defensores do direito ao aborto celebram a vitória no Kansas Reuters

O Kansas, um Estado tradicionalmente republicano e profundamente conservador, votou de forma esmagadora na quarta-feira para recusar uma emenda à Constituição que impediria o acesso ao aborto. A decisão foi vista como uma grande vitória para os democratas, mas para os republicanos foi um "grito de alerta", já que pode ser um indicador dos efeitos que a revogação da Roe v. Wade poderá ter nas eleições intercalares de novembro.

Na quarta-feira, para surpresa de muitos e contra todas as expectativas, o eleitorado do Kansas votou de forma esmagadora a favor do direito ao aborto. Naquela que foi a primeira votação popular desde que a lei foi revogada pelo Supremo Tribunal, a 24 de junho, 61 por cento do eleitorado rejeitou uma emenda à Constituição que proibiria o aborto.

"Os eleitores no Kansas participaram em números recorde para rejeitar os esforços extremistas de emendar a constituição estadual e retirar o direito da mulher a escolher e abrir a porta à proibição", afirmou o presidente norte-americano, Joe Biden, em comunicado.

Conservadores, republicanos, democratas e até alguns católicos dirigiram-se em grande número às urnas para manterem o acesso ao aborto no Kansas, onde este é legal até às 22 semanas.

“Algumas destas questões são realmente apartidárias – as pessoas não veem isso através das lentes partidárias da forma que muitos de nós vemos”, disse Ashley All, porta-voz do “Kansas for Constitutional Freedom”, uma organização que liderou o esforço para derrotar a emenda. “Conseguimos envolver as pessoas num discurso apartidário sobre esse assunto, e isso é algo que acho que realmente contribuiu para os nossos pontos fortes”, disse All, citada pelo New York Times.

O resultado do voto no Kansas, um Estado tradicionalmente republicano e profundamente conservador, foi visto como uma grande vitória para os democratas, já que é um indicador dos efeitos que a revogação da Roe v. Wade poderá ter nas eleições intercalares de novembro. Já para os republicanos, a derrota de quarta-feira foi um “grito de alerta” para o GOP (“Grand Old Party”), que procura alcançar a maioria do Congresso nas eleições de novembro.

"É definitivamente um alerta para nós", reconheceu o senador republicano Lindsey Graham na quarta-feira.


“Kansas é um Estado bastante vermelho [republicano] – é difícil encontrar as palavras. Acho que as pessoas deviam olhar para isso”, acrescentou o senador Thom Tillis, citado pelo HuffPost. O Kansas votou de forma esmagadora em Donald Trump nas eleições presidenciais de 2020 e não apoia um candidato democrata para presidente desde 1964.

A participação eleitoral na votação desta quarta-feira foi, inclusivamente, muito superior à das eleições primárias democratas e republicanas no Kansas, que aconteceram em simultâneo para decidir os candidatos a vários lugares em jogo nas intercalares de novembro.

Tal como explica o jornal HuffPost, a votação no Kansas veio agitar a política nacional norte-americana e poderá ser um indicador de que os republicanos terão uma dura batalha nas eleições intercalares nos Estados mais indecisos, principalmente naqueles que vão realizar um referendo semelhante sobre o aborto, como é o caso da Califórnia, que votará sobre essa questão em novembro.
Tiro no pé para os republicanos?
Os republicanos argumentam, porém, que as questões do aumento da inflação, particularmente dos preços do gás e dos alimentos, juntamente com os baixos índices de aprovação do presidente Joe Biden, irão ofuscar a questão do aborto e conduzi-los à vitória, tanto na Câmara dos Representantes, como no Senado (as duas câmaras legislativas que compõem o Congresso norte-americano).

“Acho que o maior motivador para os eleitores desta vez será a economia”, prevê o senador republicano Roy Blunt, citado pelo HuffPost.


Já os democratas estão convencidos de que a revogação da Roe v. Wade foi um tiro no pé para os republicanos e o resultado do referendo no Kansas é a prova de que os norte-americanos desaprovam essa decisão e apoiam o direito ao aborto.

De acordo com uma sondagem recente da CNN, 63 por cento dos norte-americanos desaprovam a decisão de revogar a lei, que apenas se concretizou depois de Donald Trump ter nomeado três juízes conservadores para o Supremo Tribunal.

A sentença Roe v. Wade, que em 1973 deu o direito federal ao aborto nos Estados Unidos, foi revogada pela nova maioria alargada conservadora do Supremo Tribunal no final de junho.

Depois da decisão, 11 Estados norte-americanos adotaram proibições ou restrições quase totais, sem exceções em casos de violação, incesto ou risco de vida da grávida.

Outros dez Estados, incluindo o Kansas, têm o direito ao aborto consagrado nas suas constituições estaduais, o que significa que só podem ser alteradas através de referendos.

c/agências
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