"Mal-entendido" entre Suíça e EUA sobre compra de caças americanos gera controvérsia

A compra de 36 caças americanos F-35A pela Suíça, anunciada em setembro de 2022 com um preço fixo de seis mil milhões de francos suíços, voltou a reacender a controvérsia no país helvético. Apesar de Berna ter garantido um preço fixo acordado no momento da compra, a administração Trump alega agora tratar-se de um "mal-entendido" e exige aos suíços centenas de milhões a mais, culpando o aumento nos custos de produção e a inflação pelo aumento do preço. Face à polémica e à crescente pressão política, a Suíça encetou conversações com os EUA para encontrar uma solução diplomática e criou uma CPI para investigar possíveis falhas nas negociações com o outro lado do Atlântico.

Rachel Mestre Mesquita - RTP /
South Korean Defence Ministry - AFP

Como o contrato celebrado entre as partes exclui um recurso legal, a Suíça está a manter conversações com os EUA em busca de uma solução diplomática para tentar evitar pagar o aumento do preço dos caças norte-americanos encomendados para fortalecer a sua força aérea. 

Em junho, os Estados Unidos informaram a Suíça de que o preço dos F-35A seria mais caro devido ao aumento dos custos das matérias-primas e da energia, assim como à inflação elevada nos EUA, com os custos adicionais a rondarem entre os 650 milhões de francos e os 1,3 mil milhões de francos, de acordo com o Governo Suíço. 

Segundo o Departamento de Defesa dos EUA, o pedido feito à fabricante Lockheed Martin - empresa norte-americana especializada em defesa e segurança - só será concluído quando os jatos começarem a ser produzidos, e o preço só será definido nessa fase.
"Um contrato é um contrato"

O preço fixo mencionado nos contratos refere-se apenas a essa etapa da produção e não à aquisição global, conforme a posição dos EUA. No entanto, o Governo suíço contesta esta interpretação e afirma que, com base em pareceres jurídicos, os termos do contrato assinado entre as partes garantem um valor fixo na aquisição total pelo que rejeita pagar custos adicionais. 

Segundo o ministro suíço da Defesa, Martin Pfister, estão em curso negociações com as autoridades dos EUA para encontrar uma solução diplomática, uma vez que o contrato impede uma ação judicial: "Continuamos a acreditar que encontraremos uma solução com as autoridades dos EUA, porque elas também têm interesse em ser vistos como um parceiro contratual fiável", disse. 

Urs Loher, chefe da Agência suíça de Aquisições de Defesa Armasuisse, afirma que "com a aquisição dos caças F-35A, deparamo-nos subitamente com uma realidade diferente, apesar de um preço fixo claro", segundo a Reuters. "Um contrato é um contrato", destaca.

Num comunicado de imprensa, divulgado em 22 de setembro de 2022, a Armasuisse anunciou a celebração de um contrato entre os dois países para a aquisição dos caças americanos F-35A e explicou que os "preços e as condições contratuais estão definidos de forma vinculativa neste contrato".  Além disso, refere que "a Suíça e os EUA negociaram uma cláusula específica e assinaram uma declaração separada que estabelece a natureza de preço fixo do acordo".

Recorde-se que a controversa compra de novos caças pela Suíça foi feita após um referendo em 2020, que aprovou à justa (50,1 por cento) a compra aviões de guerra de última geração para defender o território suíço, depois de o Governo ter afirmado a necessidade de renovar a sua frota de F/A-18 até 2032. Na altura, a decisão foi fortemente contestada num país, conhecida pela sua neutralidade, com a oposição a considerar esta uma escolha desnecessária. 


CPI investigará possíveis falhas na negociação

Na altura, os caças americanos F-35A venceram a concorrência por apresentar, à data, o melhor custo-benefício, segundo critérios da lei suíça. No entanto, os custos inesperados cobrados à Suíça estão a levantar questões sobre a transparência em contratos internacionais de Defesa, nomeadamente relativos a aquisições militares. 

Na sequência das fortes críticas da oposição, o Governo suíço anunciou esta terça-feira a criação de uma comissão parlamentar de inquérito para investigar possíveis falhas na negociações eventuais omissões de informação ao Parlamento e à população

Os partidos de esquerda estão a pressionar o Conselho Federal para a realização de uma nova votação no Parlamento ou até mesmo de um novo referendo, caso o preço fixo não seja respeitado.
Maior cooperação em defesa e segurança 

Até ao momento, a Suíça já desembolsou cerca de 700 milhões de francos suíços (cerca de 749 milhões de euros) e tem previsto outro pagamento de 300 milhões de francos suíços para este ano (cerca de 321 milhões de euros).

Se Berna e Washington conseguirem chegar a um acordo, os jatos americanos devem ser entregues à Força Aérea Suíça entre 2027 e 2030, embora já estejam a operar noutros países membros da NATO, a que a Suíça não pertence. 

Recentemente, um relatório anual revelou também que os suíços querem uma maior cooperação em matéria de segurança e defesa com a NATO.

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