Mali. ONU diz que missão é "insustentável" sem aumento de tropas

por Lusa

A atual situação da missão da Organização das Nações Unidas (ONU) no Mali é "insustentável" sem um aumento do número de tropas no terreno, indica um relatório do secretário-geral apresentado hoje numa reunião do Conselho de Segurança.

O líder da missão da ONU no Mali (Minusma), El-Ghassim Wane, apresentou hoje ao Conselho de Segurança o relatório trimestral e a revisão interna do secretário-geral, António Guterres, sobre a missão, com propostas sobre o caminho a seguir, num momento em que o ambiente de segurança no país permanece "complexo".

A revisão interna da ONU indica que a missão vem sendo estendida "além da sua capacidade" desde 2019, quando o Conselho decidiu expandir o mandato da Minusma ao centro do país - particularmente afetado pela violência - sem aumentar os seus recursos.

A retirada das forças francesas e outras forças europeias durante o ano passado exacerbou ainda mais os desafios da missão, deixando-a incapaz de atender às expectativas do povo do Mali e sujeitando-a a crescentes críticas por parte das autoridades e da população, segundo a revisão de Guterres.

Nesse sentido, são apresentadas três opções para a reconfiguração da Minusma, sendo que a primeira passa pelo número de efetivos da missão, que atualmente é de 13.289 militares e 1.920 polícias.

A esse respeito, o relatório apresenta dois cenários diferentes: um aumento mais ambicioso do teto da força em 3.680 efetivos, que incluiria novas capacidades especializadas, e outro, mais modesto, com a expansão de 2.000 efetivos uniformizados.

Uma segunda opção propõe otimizar o uso dos recursos da Minusma em prioridades estratégicas. Num cenário hipotético, a missão entregaria às forças do Mali alguns acampamentos menores em locais sem necessidade significativa de proteção de civis e aumentaria a sua presença em Ménaka e Ansongo, na região de Gao.

A missão manteria ainda a sua prioridade estratégica de apoiar a implementação do Acordo de Paz e Reconciliação de 2015, que visa abordar as causas do conflito no norte do Mali, assim como continuar o seu apoio ao Governo na estabilização do centro do Mali e na proteção dos civis nessa região.

Se essas condições não forem atendidas, a revisão sugere, como terceira opção, a retirada do pessoal uniformizado e a conversão da Minusma numa missão política especial baseada em Bamako.

A missão política especial continuaria a prestar apoio ao diálogo político e processos de reconciliação; capacitação e boa governança; monitorização; e promoção e proteção dos direitos humanos.

Contudo, a ONU observa que esta opção "provavelmente resultaria numa grave deterioração da situação de segurança no Mali".

Fazendo um ponto da situação no país, El-Ghassim Wane indicou que a persistência dos desafios de segurança no Mali resultou em elevados números de deslocados internos que, em dezembro de 2022, ascenderam a 412.387.

Além disso, 8,8 milhões de pessoas precisam agora de ajuda humanitária, 17% a mais do que no início de 2022, e dois milhões de crianças menores de 5 anos continuam afetadas pela desnutrição aguda.

"Igualmente importante é a necessidade de mobilizar recursos adicionais. Até ao momento, apenas 38% dos 686 milhões de dólares [631,7 milhões de euros] solicitados no Plano de Resposta Humanitária de 2022 foram obtidos", disse o líder da Minusma.

Ao longo da reunião do Conselho de Segurança, vários países consideraram a revisão interna de António Guterres uma boa base para as discussões de renovação do mandato da Minusma em junho.

"Enfatizo a qualidade e lucidez da avaliação do secretário-geral nesta revisão estratégica. (...) Vários países importantes contribuintes de tropas já decidiram retirar-se da Minusma, que corre o risco de ser progressivamente esvaziada da sua substância, quer externamente pelos constrangimentos que enfrenta, quer internamente devido ao enfraquecimento de algumas das suas capacidades críticas", avaliou a diplomata francesa Nathalie Broadhurst.

"Os próximos meses serão decisivos para o futuro da Minusma e o `status quo` não é uma opção. Todas as opções estão sobre a mesa e terão de ser discutidas com todos os interessados: o Mali, a Argélia como líder dos esforços de mediação internacional, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental [CEDEAO] e a União Africana, países vizinhos, países contribuintes de tropas e doadores", acrescentou.

Vários diplomatas apelaram ainda ao Mali que cesse as suas restrições à missão da ONU. Entre as restrições confirmadas no relatório trimestral do secretário-geral estavam 237 pedidos de voos da Minusma que foram negados ou não receberam resposta das autoridades desde 04 de outubro de 2022.

Vários grupos terroristas operam no Mali, nomeadamente os filiados da Al-Qaida e do grupo extremista Estado Islâmico. Além disso, a violência intercomunitária aumentou, num contexto marcado por golpes de Estado em agosto de 2020 e maio de 2021.

O país, pobre e sem litoral, enfrenta desde 2012 a propagação do extremismo e da violência de todos os tipos, mas também uma grave crise política e humanitária. Centenas de milhares de pessoas estão deslocadas devido ao conflito.

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