Médio Oriente. Sem cessar-fogo à vista, líderes do Hamas são alvos de Israel

por Inês Moreira Santos - RTP
Mohammed Saber - EPA

Apesar dos pedidos internacionais para um cessar-fogo urgente, os ataques na Faixa de Gaza continuaram, pela décima noite consecutiva. A pressão internacional para o fim do conflito aumentou, e embora haja recetividade por parte do Hamas, Israel não dá sinais de pretender terminar a campanha militar em curso, admitindo ainda ter como principal alvo os líderes do grupo islâmico.

O exército israelita ampliou os ataques a alvos de militantes palestinianos e voltou a bombardear a Faixa de Gaza na madrugada desta quarta-feira, destruindo infraestruturas militares, prédios residenciais e matando, pelo menos, mais seis pessoas.

Apesar dos esforços internacionais e de ter havido um curto período, na noite entre terça e quarta-feira, sem qualquer ataque de nenhuma das partes, Israel voltou a atacar tendo como alvo as casas dos líderes do Hamas.

Os moradores de Gaza relataram nas últimas horas que viram pilhas de tijolos, cimento e outros entulhos de casas que abrigavam 40 membros da família al-Astal, uma das famílias de militantes do Hamas. Segundo os relatos da imprensa local, um míssil de alerta atingiu o prédio na cidade de Khan Younis, ao sul, cinco minutos antes do ataque aéreo, permitindo que todos escapassem do local.

Já o exército israelita afirmou que atingiu alvos dos militantes palestinianos nas cidades de Khan Younis e Rafah, com 52 aviões a atacar 40 alvos subterrâneos num período de 25 minutos, avança o Times of Israel.

As autoridades israelitas admitiram, entretanto, que têm tentado "várias vezes" matar um dos chefes do grupo islâmico, Mohammed Deif - chefe da ala militar do Hamas, as Brigadas Izzedine al-Qassam, que sobreviveu a repetidos atentados, incluindo o último grande conflito em 2014, mas o seu paradeiro é desconhecido.

"Durante esta operação, tentamos assassinar Mohammed Deif. Tentamos matá-lo várias vezes", admitiu o porta-voz das forças israelitas, Brig Gen Hidai Zilberman.

Segundo a BBC, só na cidade de Gaza houve mais de 70 ataques israelitas, durante a madrugada, e cerca de 50 bombardeamentos na cidade Khan Younis, no sul da Faixa de Gaza.

Entre as seis vítimas mortais já confirmadas, nestes últimos ataques, foi identificado um jornalista palestiniano.

Os ataques aéreos israelitas continuaram, contudo, ao longo da manhã desta quarta-feira, desta vez com as Forças de Defesa de Israel a atacar novamente a rede de túneis subterrâneos de Gaza. As forças militares de Israel lançaram ainda foguetes contra a passagem de peões em Erez e na passagem de Kerem Shalom, onde ajuda humanitária estava a ser levada para Gaza, forçando o encerramento das duas.
Base aérea israelita bombardeada?
Os militares israelitas lançaram centenas de ataques aéreos que dizem ter como alvo a infraestrutura do grupo islâmico Hamas. Contudo, os militantes palestinianos dispararam também mais de 3.700 rockets contra Israel, na noite passada. De acordo com a BBC e Al Jazeera, o alvo seria uma base aérea no sul de Israel.

Durante a noite as sirenes soaram nas zona sul e centro de Israel, inclusive nas cidades de Ashkelon, Ashdod, Rehovot, Nes Ziona e Palmachim.

O Hamas afirma que atacou a base aérea de Palmachim pela segunda vez, Israel nega, no entanto, que alguma das suas bases militares tenha sido atingida.

A Reuters avança ainda com a morte de dois trabalhadores tailandeses e sete feridos que terão sido provocados ainda na terça-feira numa quinta israelita logo depois da fronteira da Faixa de Gaza, tendo o Hamas e a Jihad Islâmica reivindicado o ataque.

As autoridades israelitas dizem que os palestinianos, ao lançarem os rockets na última noite, romperam a "cúpula de ferro", mataram perto de uma dezena de pessoas e destruiram mais de uma centena de edifícios, sobretudo no sul de Israel. Todavia, garantem que as suas defesas aéreas têm uma taxa de intercetação de 90 por cento dos rockets lançados pelo Hamas.

O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, disse na terça-feira que os ataques às forças do Hamas estacionadas na Faixa de Gaza permitiram arrasar a capacidade logística de resposta e ataque daquele grupo, que o seu Governo considera terrorista.

"Os nossos inimigos veem o preço que fazemos pagar pela agressão contra nós, tenho certeza que tirarão as conclusões necessárias", disse Netanyahu, citado pelos jornais israelitas, acrescentando que a operação continuará "enquanto for necessário para restaurar a paz dos cidadãos de Israel".


Além disso, Netanyahu afirmou que o Hamas "recebeu golpes que não esperava" e que Israel fez recuar o grupo designado terrorista pela União Europeia e Estados Unidos por "anos".

Também o chefe da Direção de Operações do exército israelita revelou ter a mesma perspetiva para incapacitar o Hamas, ao afirmar que será um sucesso se o país alcançar cinco anos de paz.

"Se me perguntar o que é razoável para considerar um sucesso, eu diria pelo menos cinco anos e até mais do que isso", afirmou o major general Aharon Haliva à emissora Kan.

Haliva reconheceu, no entanto, que os militares não anteciparam totalmente a decisão do Hamas de alvejar Jerusalém na semana passada, mas que as forças armadas responderam com muito mais força do que o grupo palestiniano esperava.

Estes últimos ataques ocorrem no momento em que esforços diplomáticos visando um cessar-fogo ganharam força na comunidade internacional. As infraestruturas de Gaza, já enfraquecidas por um bloqueio de 14 anos, estão a deteriorar-se rapidamente. Mas os militares israelitas admitem que planeiam continuar nos próximos dias o bombardeamento das redes de túneis do Hamas, os quais estão sob zonas civis em Gaza nos próximos dias.

Pelo menos 219 palestinos foram mortos, nos últimos dias, em ataques aéreos, incluindo 63 crianças e 36 mulheres, e 1.530 ficaram feridos, de acordo com o Ministério da Saúde de Gaza, que não divide os números em combatentes e civis.

O Hamas e a Jihad Islâmica afirmam que pelo menos 20 dos seus combatentes foram mortos, enquanto Israel afirma que o número é de pelo menos 130. Doze pessoas em Israel, incluindo uma criança de 5 anos, foram mortas em ataques com foguetes até agora.
Impasse diplomático

A China, a Noruega e a Tunísia voltaram a convocar uma reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas para se debater a crise no Médio Oriente, mas o encontro à porta fechada obteve o mesmo resultado do que os três anteriores, dada a posição inflexível dos Estados Unidos, que se recusa a aprovar uma declaração a apelar para uma trégua.

"Embora ainda não fale em uma só voz, a posição da esmagadora maioria é clara. Apelo para todos os membros se juntarem aos esforços coletivos pelo cessar-fogo e proteção dos civis", disse o embaixador chinês Zhang Jun.

Mas escalada de violência, que tem levado a sucessivos pedidos de cessar-fogo também provocou um novo apelo do secretário-geral da ONU, António Guterres, a pedir no Twitter à "comunidade internacional" para que assegure "fundos adequados para as operações humanitárias em Gaza", lamentando o "enorme sofrimento humano" e os "danos profundos em casas e infraestruturas vitais" que já se registam desde o acentuar do conflito, que se arrasta desde dia 10 de maio.



De acordo com autoridades médicas presentes em Gaza, já morreram 217 palestinianos, incluindo 63 crianças, tendo 1400 ficado feridos. As autoridades israelitas dão conta, por seu lado, de 12 mortos em Israel, incluindo duas crianças, provocados pelos rockets disparados pelo Hamas.

Os últimos ataques já destruiram, total ou parcialmente, quase 450 edifícios na Faixa de Gaza, incluindo seis hospitais e o único laboratório que fazia testes de Covid-19 em Gaza.

Também o Egito está a colaborar para pôr fim aos combates e, embora não tenham sido alcançados progressos com Israel, as autoridades egipsias dizem acreditar que a pressão internacional possa forçar as negociações, de acordo com um diplomata egípcio.

Recorde-se que escalada da violência começou a 10 de maio, quando o Hamas disparou rockets em direção a Jerusalém em apoio aos protestos dos palestinianos contra o policiamento pesado de Israel no complexo da Mesquita de Al-Aqsa, um local sagrado para judeus e muçulmanos, e a ameaça de despejo de dezenas de famílias palestinianas na região de colonatos judeus.
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