Médio Oriente. Trump empenhado num plano de paz que exclui palestinianos

por RTP
Trump (à esq.) recebe Netanyahu na Casa Branca. Kevin Lamarque, Reuters

O líder da Autoridade Palestiniana, Mahmud Abbas, deixou Donald Trump pendurado ao recusar atender a chamada telefónica do presidente norte-americano nesta segunda-feira, véspera do anúncio do novo plano de paz da Casa Branca para o Médio Oriente. Um rearranjo da região que os palestinianos vêem como uma machadada final em todas as suas aspirações.

Esta segunda-feira têm lugar os encontros do presidente Trump com o primeiro-ministro israelita Benjamin Netanyahu e o líder da oposição e adversário de Netanyahu nas eleições – as que passaram, e resultaram num empate técnico, e as próximas de 2 de Março –, o general Benny Gantz.

Os encontros foram marcados para a véspera do anúncio na Casa Branca de um novo plano de paz para o Médio Oriente. Trata-se de um projecto que Donald Trump queria já ter apresentado nos últimos meses de 2019, mas esse momento acabou por coincidir com o impasse eleitoral em Israel, com Netanyahu incapaz de negociar uma coligação e formar governo.Palestinianos vêem neste plano um golpe de misericórdia contra quaisquer aspirações que pudessem ainda ter.

No entanto, tendo o anúncio do novo plano sido adiado para finais de Janeiro, o calendário coincide agora com o processo de impeachment de Trump, já no Senado, na fase de julgamento. Amanhã, terça-feira, é esperado que o presidente norte-americano revele pormenores desse acordo trabalhado nos últimos três anos pelo seu genro, Jared Kushner, conjuntamente com outros dois assessores da equipa do presidente, Avi Berkowitz e Jason Greenblatt.

Dos pormenores que acreditam constar do documento, os palestinianos temem estar aqui completamente encostados à parede, apenas a aguardar a machadada final a todas as suas esperanças de construir um Estado independente na Cisjordânia, Jerusalém Oriental e Faixa de Gaza.

Os responsáveis palestinianos vêem neste plano norte-americano o golpe de misericórdia a quaisquer aspirações que os territórios ocupados pudessem ainda ter.
Plano financeiro ou suborno

Já anteriormente os palestinianos haviam manifestado os seus receios face à visão da Administração Trump para a região. No Verão passado foi denunciada uma jogada de Washington para condicionar os seus interesses na região através de um plano de revitalização da economia dos territórios árabes na ordem dos 50 mil milhões de dólares. Uma tentativa de suborno, na perspectiva de algumas facções palestinianas.

De momento, Trump coloca todas as suas fichas em Netanyahu e Gantz, confiando que o acordo dos dois candidatos às terceiras legislativas deste ciclo eleitoral será suficiente para arrumar um assunto há décadas indomável para a diplomacia norte-americana.

A urgência de Trump aponta à implementação imediata do acordo: "Têm seis semanas para colocar o plano em prática", declara o presidente norte-americano, sabendo-se que neste mês e meio não haverá um novo executivo firme em Israel.

Por todas as razões, este é um plano que vai sempre assentar numa base de desconfiança por parte dos palestinianos, particularmente depois de Washington ter no passado mês de Novembro invertido um dos princípios da política norte-americana que vinha de décadas ao anunciar que deixava de ver como ilegais os colonatos israelitas da Cisjordânia.

O anúncio foi feito pelo secretário de Estado, Mike Pompeo, colocando a Casa Branca em total oposição à lei internacional, já que estes povoamentos das terras palestinianas levam o carimbo de "ilegal" pela generalidade das organizações mundiais, como as Nações Unidas ou a União Europeia.

O reconhecimento de Jerusalém como capital de Israel também não ajudou às relações entre Estados Unidos e Autoridade Palestiniana.
Acordo tripartido mas a dois

A ausência das lideranças palestinianas destes encontros na Casa Branca é outro sinal do fraco reconhecimento que a solução deverá colher na região e, eventualmente, da falta de jeito ou de empenho que a equipa de Trump terá colocado para chamar à assinatura desta nova solução aquela que é a parte mais interessada: os palestinianos.

De acordo com o Haaretz, Donald Trump terá, num esforço de última hora, tentado falar com o líder da Autoridade Palestiniana, mas, refere o jornal israelita, Mahmud Abbas não atendeu as chamadas do presidente dos Estados Unidos.

O vaticínio dos palestinianos é este: o plano de paz não pode funcionar sem eles.

O primeiro-ministro palestiniano, Mohammad Shtayyeh, já veio acusar Donald Trump e Benjamin Netanyahu de estarem a usar este acordo como cortina de fumo para esconder os seus próprios problemas. Trump enfrenta um processo de impeachment por abuso de poder e Netanyahu arrisca pena de prisão efectiva caso seja condenado em vários casos de corrupção.

“Este plano serve agora para proteger Trump de ser destituído e proteger Netanyahu de ir para a cadeia - e não, não é um plano de paz”, declarou Shtayyeh à margem de uma reunião em Ramallah, deixando um pedido: “Nós rejeitamos esse plano e pedimos à comunidade internacional para não participar nisto, já que contradiz os fundamentos do direito internacional e os direitos inalienáveis dos palestinianos”.

“Isto não é senão um plano para acabar com a causa palestiniana”, lamentou Shtayyeh, alinhado com as posições que vêem o plano - que deverá ser conhecido amanhã - como um nado-morto.

À conta da decisão de Trump de avançar apenas com a parceria israelita, Abbas deixou já claro que os norte-americanos não voltarão a ser vistos como um negociador honesto, dando a ideia de que estão acabados enquanto intermediários de qualquer conversação entre israelitas e palestinianos.
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