México. Vídeo gera indignação após incêndio que provocou a morte de 38 migrantes

por Andreia Martins - RTP
Um grupo de migrantes dorme junto ao local de homenagem aos 38 mortos do incêndio de segunda-feira, em Ciudad Juaréz. Jose Luis Gonzalez - Reuters

A indignação subiu de tom após a publicação de um vídeo que mostra a inação dos guardas perante o incêndio no centro de detenção em Ciudad Juárez, no México, onde morreram 38 pessoas no incêndio de segunda-feira.

Os migrantes terão queimado colchões em protesto contra as condições no centro de detenção e por receio de serem deportados.

Nas imagens, sem som, surgem dois guardas de uniforme e parece não haver qualquer tentativa de libertar os homens que se encontravam no interior de grades metálicas. Nos cerca de 30 segundos do vídeo, as chamas e o fumo acabam por preencher a imagem enquanto os dois guardas abandonam o local.


“Tratou-se de um movimento de protesto. Supomos que souberam que iam ser expulsos, deportados, e que, em protesto, colocaram colchões na porta da receção do centro e atearam-lhes fogo”, adiantou o presidente mexicano, Andrés Manuel Obrador.

“Nunca imaginaram que isso causaria este terrível infortúnio”, acrescentou Obrador em conferência de imprensa.

Já esta quarta-feira, o presidente mexicano prometeu que se fará justiça. “Não haverá nenhuma tentativa de esconder os factos, nenhuma tentativa de encobrir ninguém”, afirmou.

Dos 68 migrantes que se encontravam no centro de detenção, 38 morreram e 29 ficaram feridos, segundo indicou o Instituto Nacional de Imigração. Eram todos homens e, de acordo com as autoridades mexicanas, tinham sido retirados das ruas de Ciudad Juárez e levados para o centro de detenção na segunda-feira.

Em declarações à Associated Press, a mulher de um dos migrantes que sobreviveu ao incêndio indicou que os guardas deixaram os homens “atrás das grades” enquanto fugiam.

“Havia fumo por todo o lado. Eles deixaram sair as mulheres e a equipa de migração, mas só quando os bombeiros chegaram é que deixaram os homens sair”, disse Viangly Infante Padrón, mulher de um dos homens que se encontrava no centro de detenção.

As autoridades indicaram que 15 mulheres foram libertadas quando o incêndio começou, mas ainda não explicaram porque é que não deixaram sair os homens que se encontravam numa cela.

"Só eles tinham as chaves. A responsabilidade de abrir a porta era deles, de salvar aquelas vidas, independentemente de haver detidos, independentemente de poderem fugir, independentemente de tudo o que poderia acontecer. Eles tinham de ter salvo estas vidas", acrescenta Infante Padrón.

Até ao momento foram identificados mortos e feridos da Guatemala, Honduras, Venezuela, El Salvador, Equador e Colômbia. De acordo como ministro dos Negócios Estrangeiros da Guatemala, 28 das vítimas mortais provinham daquele país.

Ciudad Juárez é uma das maiores cidades do México e fica a poucos quilómetros de El Paso, no Texas, Estados Unidos. É por isso um ponto de passagem frequente para os migrantes que procuram chegar ao território norte-americano vindos de vários países da América Latina.

No passado dia 9 de março, os dirigentes de dezenas de abrigos para migrantes e organizações de defesa de Direitos Humanos publicaram uma carta aberta alertando para os problemas no tratamento dos imigrantes ilegais na fronteira entre o México e os Estados Unidos.

Nas últimas semanas, as tensões entre autoridades e migrantes têm vindo a aumentar, à medida que os abrigos repletos de pessoas deixam de ter capacidade para acolher os imigrantes ilegais que vão chegando de toda a América Latina, à espera de uma oportunidade para passar a fronteira.

A agência de imigração mexicana rejeitou na terça-feira qualquer responsabilidade nesta tragédia. No entanto, para a Amnistia Internacional, o incêndio é a consequência das “políticas migratórias restritivas e cruéis partilhadas pelos Governos do México e dos Estados Unidos”.

“Estes eventos devastadores expõem um sistema verdadeiramente desumano de fiscalização da imigração. Como é possível que as autoridades mexicanas tenham deixado seres humanos trancados sem saída neste incêndio?”, questionou a diretora da Amnistia Internacional para as Américas, Erika Guevara-Rosas.

A responsável critica ainda as declarações “insensíveis e ofensivas” do presidente López Obrador e do Instituto Nacional de Migração, por usarem “eufemismos para desvalorizar a seriedade dos eventos e culpar os migrantes”.
 
Destaca também que estes centros de detenção não são “abrigos” e que quem lá se encontra está privado da sua liberdade.

c/ agências
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