Moçambique. Confrontos entre tropas estrangeiras e insurgentes alimentam receios de uma escalada

por RTP
Jean Bizimana - Reuters

As tropas estrangeiras enviadas para Cabo Delgado entraram em confronto com os grupos jihadistas armados pela primeira vez na semana passada, o que faz aumentar os receios de uma escalada do conflito nesta região a norte de Moçambique. O país espera receber três mil soldados de países da África Austral para ajudar no combate ao terrorismo no país.

Soldados ruandeses que chegaram recentemente a Moçambique para reforçar a segurança local entraram em conflito com grupos extremistas na semana passada. Poucos detalhes foram adiantados sobre estes confrontos, mas segundo avança The Guardian, as autoridades moçambicanas afirmam que foram registadas várias vítimas entre os insurgentes.

As tropas ruandesas foram das primeiras a ser enviadas para Moçambique para ajudar as forças militares locais a combater os grupos armados que desde 2017 aterrorizam a província de Cabo Delgado, onde se localizam projetos de gás.

A 23 de junho foi aprovado o mandato de uma "força conjunta em estado de alerta" da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) para apoiar Moçambique no combate contra o terrorismo.

A África do Sul vai comandar a força militar conjunta da SADC, de três mil soldados, que vai juntar-se aos cerca de mil soldados que Ruanda já enviou para alguns distritos da província.


Espera-se o envio de milhares de tropas estrangeiras para Moçambique nos próximos meses, de pelo menos sete países diferentes. Segundo o Ministério da Defesa, além de África do Sul e Botsuana, países como Tanzânia e Angola também já confirmaram que vão enviar as suas forças, mas Moçambique também espera por outros soldados de países-membros da SADC.

No domingo, o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, anunciou que as tropas que lutam contra a insurgência do Estado Islâmico na região estão a ganhar terreno e o inimigo a recuar.
Especialistas divididos
Os especialistas mostram-se divididos relativamente ao envio de forças militares estrangeiras para Moçambique, considerando que pode provocar ataques de represália em todo o sul de África, que as frágeis forças de segurança locais terão dificuldades em evitar e combater.

Jasmine Opperman, um especialista no conflito em África do Sul, defende a necessidade do envio de ajuda a Moçambique, mas não acredita que as tropas estrangeiras sejam capazes de derrotar os grupos jihadistas.

“Moçambique precisa de ajuda e isso é claro. Mas será que a presença [das tropas estrangeiras] se traduzirá numa derrota geral para a insurgência? Eu não acho que consigo ser otimista”, afirma Opperman, citado por The Guardian.

Dino Mahtani, especialista em Moçambique do Grupo Internacional de Crise, defende que a ajuda militar pode ser útil “se for feita de forma comedida”.

“As autoridades precisam avaliar o que precisa de ser feito para incentivar os militares a reconsiderar a violência como o melhor método para resolver as divergências”, defende Mahtani, citado por The Guardian. “Se eles simplesmente pensarem que podem derrotar e desmantelar o grupo, podem envolver-se numa guerra invencível”, acrescenta.

Grupos armados, conhecidos localmente como Al-Shabab, aterrorizam a província de Cabo Delgado desde 2017, sendo alguns ataques reivindicados pelo grupo jihadista autoproclamado Estado Islâmico (EI).

A 24 de março, estes grupos armados levaram a cabo um ataque na cidade portuária de Palma, que provocou dezenas de mortos e milhares de desalojados. Este atentado, um dos mais marcantes desde o início da violência em Cabo Delgado, interrompeu um megaprojeto de gás avaliado em 16,8 mil milhões de euros, operado pela petrolífera francesa Total, localizada a poucos quilómetros de Palma.

Os ataques no nordeste do país provocaram mais de 2800 mortes, segundo o projeto de registo de conflitos ACLED, e 732 mil deslocados, de acordo com as Nações Unidas.

c/agências
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