Morte de Mahsa Amini. Aumenta o número de mortos em protestos

por Cristina Sambado - RTP
Homenagem a Mahsa Amini em Berlim Clemens Bilan - EPA

Os iranianos foram para a rua pela 10ª noite consecutiva para protestar pela morte de Mahsa Amini, desafiando o poder judicial que já advertiu para uma "ação decisiva sem clemência" contra alegados instigadores dos tumultos. Oficialmente, já morreram 41 pessoas desde o início dos protestos, a maioria manifestantes, mas também membros das forças de segurança.

No entanto, várias fontes alertam que o número real de mortos será mais elevado. A organização Iran Human Rights (IRH), sediada na Noruega, afirmou no domingo que o número de vítimas é pelo menos de 57.
Os protestos foram desencadeados pela morte de Mahsa Amini, uma iraniana curda de 22 anos detida pela “polícia da moralidade” a 13 de setembro, acusada de não estar a usar corretamente o hijab (véu islâmico) e de estar a violar o código de vestuário conservador do país. A jovem acabou por morrer três dias depois, quando estava sob custódia policial.
O IRH revela ainda que os cortes contínuos na internet estavam a dificultar a confirmação da contagem das vítimas mortais. Os protestos liderados pelas mulheres espalharam-se por dezenas de cidades iranianas.

Imagens difundidas pela IRH mostram manifestantes nas ruas de Teerão a gritar “morte ao ditador”, no final do dia de domingo.

Fazendo eco de um aviso deixado no dia anterior pelo presidente, Ebrahim Raisi, o chefe do poder judicial, Gholamhossein Mohseni Ejei, no domingo "sublinhou a necessidade de uma ação decisiva sem clemência" contra presumíveis instigadores dos "tumultos".

Centenas de manifestantes, ativistas e jornalistas foram detidos nos protestos noturnos. Nos protestos, algumas mulheres retiraram e queimaram os hijabs, cortaram o cabelo, e algumas dançaram perto das fogueiras enquanto cantavam "zan, zendegi, azadi" (Mulher, vida, liberdade).

As pessoas saíram às ruas em muitas cidades e vilas, incluindo a cidade sagrada de Mashhad, a cidade noroeste de Qazvin, a cidade central de Esfahan, bem como as cidades ocidentais de Hamedan e Yasuj, para mostrar sua "unidade e indignação com os recentes atos de sabotagem perpetrados por desordeiros", acrescentou a agência estatal iraniana IRNA.

O Governo mobilizou, no domingo, milhares de cidadãos em marchas contra os manifestantes que pedem mais liberdades.

O procurador da cidade de Sari, Mohamad Karimi, denunciou no domingo a prisão de 450 "desordeiros" na província de Mazandaran, no norte do país.

Com outros 736 detidos na província de Guilan, o número de detenções conhecidas sobe para 1.186.
Os manifestantes exibiram cópias do Corão, bandeiras iranianas e fotos de Ali Khamenei em Teerão, onde marcharam cantando "morte ao manifestante" e "morte ao insurreto", mas também os habituais "morte à América" e "morte a Israel", que acusam de estarem por detrás dos protestos.


Defenderam ainda a aplicação da lei com slogans de apoio à polícia e ao guia supremo do regime, o ayatollah Ali Khamenei.

As marchas repetiram-se nas principais cidades do país, como Shiraz, Isfahan, Hamedan, Bandar Abas, Qom, Rasht, Ghazvin e até em Sanandaj, capital do Curdistão iraniano, de onde Amini era originária.

No domingo realizaram-se também comícios pró-governamentais, o principal no centro da capital iraniana, Teerão.

Um dos principais sindicatos de professores apelou a estudantes e docentes para que organizassem uma greve nacional esta segunda-feira e outra na quarta-feira. Protestos noutros países
Londres, Atenas, Berlim, Bruxelas, Istambul, Madrid, Nova Iorque e Paris, entre outras cidades, receberam manifestações de apoio às mulheres iranianas.

Em Londres, os manifestantes entraram em confronto com as forças policiais no exterior da embaixada
do Irão em Inglaterra. Cinco polícias ficaram feridos e 12 pessoas foram detidas.

Dezenas de manifestantes em Londres gritaram “morte à República Islâmica”, enquanto agitavam a bandeira nacional do Irão até 1979.

Em Paris, a polícia usou gás lacrimogéneo para impedir os manifestantes de chegar à embaixada do Irão, na capital francesa.

Dezenas de polícias cercaram a embaixada, situada numa das zonas mais exclusivas da capital francesa e com vigilância permanente.

No domingo, a União Europeia condenou o uso generalizado da força contra os manifestantes no Irão, que considera “injustificável e inaceitável”.

Josep Borrell, o chefe da diplomacia da UE, condenou também “a decisão das autoridades iranianas de restringir drasticamente o acesso à internet e de bloquear as plataformas de mensagens instantâneas”, o que “constitui uma violação flagrante da liberdade de expressão”.

Já o realizador iraniano Asghar Farhadi, vencedor de dois Óscares, apelou ao mundo para que mostre solidariedade com os protestos no Irão e saudou as "mulheres corajosas" do seu país.

“Convido todos os artistas, cineastas, intelectuais, ativistas dos direitos civis em todo o mundo, e toda a gente que acredita na dignidade e direitos humanos para que sejam solidários com estes corajosos e poderosos homens e mulheres do Irão, criando vídeos, ou escrevendo, ou de qualquer outra forma", apela o cineasta iraniano, numa publicação na sua página do Instagram.



O realizador prestou homenagem às "mulheres corajosas que lideram os protestos", referindo que estão "simplesmente a exigir os direitos fundamentais dos quais o Estado as privou há anos".

O cineasta afirmou que a maioria das mulheres que protestavam eram "muito jovens, 17, 20 anos".

"Vi a indignação e a esperança nos seus rostos e na forma como marcharam pelas ruas. Respeito profundamente sua luta pela liberdade e pelo direito de escolher o seu próprio destino, apesar de toda a brutalidade que sofrem", acrescentou.MNE iraniano convoca embaixadores britânico e norueguês
O Ministério dos Negócios Estrangeiros do Irão convocou os embaixadores britânico, Simon Shercliff, e norueguês, Sigvald Hauge, após os protestos no país pela morte da jovem Mahsa Amini, avançou a agência de notícias Efe.

Segundo a agência, o embaixador britânico, Simon Shercliff, foi convocado em protesto contra a divulgação de notícias pelos órgãos de comunicação social do Reino Unido em relação à morte nas instalações policiais da jovem Mahsa Amini.

"Em resposta à atmosfera hostil criada pelos media sediados em Londres contra a República Islâmica do Irão, o embaixador britânico em Teerão foi convocado pelo diretor-geral para a Europa Ocidental para se deslocar ao Ministério dos Negócios Estrangeiros", indica a agência de notícias Mehr.

O Ministério dos Negócios Estrangeiros do Irão também convocou o embaixador norueguês por comentários de “ingerência” do presidente do Parlamento, Masud Gharahjani, sobre os protestos no Irão usando a rede social Twitter.

"A internet não está funcionar no Irão. Nas cidades iranianas, os jovens estão nas ruas a gritar por justiça, democracia e liberdade. Os manifestantes estão a enfrentar um regime desesperado que está a reprimir protestos com violência", diz o embaixador numa das várias mensagens.

c/ agências
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