MPLA tinha "complexos de inferioridade" relativamente a Savimbi -Xavier de Figueiredo

por Lusa

O jornalista Xavier de Figueiredo, autor do livro "Savimbi - Um homem no seu martírio", que é apresentado hoje em Lisboa, defende que o partido no poder em Angola, o MPLA, "tinha complexos de inferioridade" relativamente a Jonas Savimbi.

"Ele tinha consciência de que o MPLA [Movimento Popular de Libertação de Angola] tinha complexos de inferioridade em relação a ele. Eles não só o viam como um adversário de peso, pelas suas qualidades, pelos seus atributos, como também têm um complexo de inferioridade em relação a ele, porque, apesar de tudo, veem nele, embora sem nunca reconhecer isto publicamente, antes pelo contrário, veem nele qualidades que eles não têm", defende.

Em "Savimbi - Um homem no seu martírio", que Xavier de Figueiredo recusa apresentar como uma biografia, o autor procura demonstrar que Jonas Savimbi, fundador e líder histórico da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), "foi alvo de uma longa e destrutiva campanha de propaganda, desinformação e ações encobertas de segurança com o objetivo de o desacreditar e isolar".

"Tenho visto algumas referências que apresentam o livro como uma biografia e não é propriamente isso. Quer dizer, assim, no sentido clássico desse género. Aquilo não é uma biografia, é um livro sobre aquilo que foi a sua vida como homem político, como líder político. Só que as circunstâncias em que exerceu essa liderança política também o obrigaram a ser um chefe militar", acrescenta.

Para Xavier de Figueiredo, o MPLA, que governa Angola desde a independência, em 1975, levou a cabo uma campanha "muito persistente, que varia no seu alcance conforme as circunstâncias", mas que teve sempre como finalidade afastar Savimbi.

O líder da UNITA, que nasceu em 1934, em Munhango, província de Bié, morreu em combate em 22 de fevereiro de 2002, em Lucusse, província de Moxico.

"O livro tem o seu enfoque nessa enorme pressão exercida sobre ele dessa maneira, apresentando-o quase como um monstro, como um tipo perverso, como um tipo que representava um perigo enorme para Angola. Mas eu acho que isso é um sofisma. Eu acho, aliás, que o que move de facto o MPLA é sobretudo a consciência que tem de que ele é um adversário de peso", defende.

"Pelas suas qualidades políticas, humanas, parece que são de amplo reconhecimento. Uma pessoa que tinha grande apreço por ele, era Mandela. O livro tem muitas informações acerca disso", acrescenta.

Xavier de Figueiredo defende, ainda, que a afinidade que se estabelece entre Savimbi e os Ovimbundos, a tribo mais numerosa de Angola, reforça o peso e a importância do líder da UNITA.

"Ele é um adversário de peso de duas maneiras, porque se estabelece uma afinidade natural entre ele e a maior tribo de Angola, os Ovimbundos, e essa identificação dá-lhe uma base eleitoral importante. Política e eleitoral importante. Porque aquela tribo, além de ser a mais numerosa, tem também características como um forte espírito de grupo. Um espírito de lealdade muito grande. E depois Savimbi é um tipo que revela de facto grande génio militar", afirma.

Questionado sobre como seria Angola se Savimbi não tem sido morto em combate, Xavier de Figueiredo reconhece que não é fácil tecer conjeturas: "Nunca temos respostas, mas eu acho que Angola teria sido uma coisa muito diferente se, em vez do MPLA, tivesse sido ele a chegar ao poder no momento da independência".

"Eu acho que ele acabaria por ser sempre morto. Aliás, este subtítulo que eu dei ao livro `Um homem no seu martírio`, resulta das referências convincentes [no livro] acerca dos planos do MPLA para o matar", diz.

Xavier de Figueiredo salienta que, apesar da campanha que o MPLA organizou contra Savimbi, o líder da UNITA nunca reagiu da mesma maneira.

"Ele nunca faz contra propaganda, porque na mente dele o tempo dar-lhe-á razão", afirma.

Com a morte de Savimbi, a UNITA "fica numa situação de orfandade" e, para Xavier de Figueiredo, o "mérito grande" do líder que se segue, Isaías Samakuva, foi o de ter "conseguido segurar a UNITA".

"Samakuva garante, apesar de tudo, a sobrevivência da UNITA numas circunstâncias que eram muito difíceis de facto. Agora a UNITA explode bastante com o Adalberto [da Costa Júnior]", considera, referindo-se ao atual líder do partido do Galo Negro.

"Acho que está mesmo, em termos de aceitação política e de popularidade, no seu apogeu", reforça e acrescenta: "Este Adalberto é um tipo muito combativo. Tem um espírito muito combativo e também parece-me um tipo muito temerário. Não tem medo, mas também aí é muito por demérito do próprio MPLA, que eu acho que está gasto".

Xavier de Figueiredo nasceu em 1947, no Huambo, e iniciou a vida de jornalista em 1971, ao serviço do diário A Província de Angola, em Luanda.

Em Portugal, onde se radicou em 1975, começou por trabalhar no Jornal Novo e, a seguir, na antiga ANOP, agência ao serviço da qual foi o primeiro correspondente permanente da imprensa portuguesa num país africano lusófono -- a Guiné-Bissau (1978-1981), seguindo-se Moçambique (1982-1983). Fundou e dirigiu a primeira publicação de temática africana lançada em Portugal, o quinzenário África Jornal, em 1984.

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