Nigéria. Centros e escolas religiosos encerrados por abusos e tortura

por RTP
Um rapaz de 15 anos mostra as cicatrizes, após ter sido libertado no final de setembro de 2019, de uma escola islâmica, em Kaduna, juntamente com centenas de outros adolescentes. Reuters

A polícia nigeriana anunciou a libertação de 259 pessoas, detidas num alegado centro de reabilitação administrado por uma mesquita no bairro de Ojoo, em Ibadan, no sudoeste do país. "Homens, mulheres e crianças estavam reféns num centro de detenção ilegal", esclareceu Fadeyi Olugbenga, porta-voz da polícia do estado de Oyo.

Esta foi a mais recente de uma série de operações policiais realizadas desde setembro passado em vários pontos da Nigéria, para encerrar este tipo de estabelecimentos religiosos, que retêm pessoas em condições miseráveis e muitas vezes sob tortura, ali internadas para alegada reabilitação.

No caso do centro de Ibadan, foi a fuga de um rapaz de 18 anos que levou à intervenção "rápida" das autoridades.

Ao todo "estavam ali encerradas 259 pessoas, que imploravam auxílio, quando chegamos", revelou o porta-voz da polícia, citado pela Agência France Presse.

Imagens divulgadas pelos media mostraram homens jovens e rapazes, de caras emaciadas e corpos esqueléticos, sentados no exterior do edifício onde haviam estado retidos.

"Alguns estavam ali há anos e tinham problemas de saúde, estão a receber cuidados médicos", afirmou Olugbenga. "Os que interrogamos contaram que eram alimentados uma vez a cada três dias, por vezes ainda menos", referiu.

O proprietário e outras oito pessoas foram detidas, mas "as investigações prosseguem, para se obterem mais detalhes", acrescentou o porta-voz.
Tortura e sevícias
Uma dúzia de intervenções das forças de segurança permitiu encerrar outras tantas "casas de correção" e escolas islâmicas na Nigéria, desde setembro. Num delas, em Lagos, a polícia libertou 15 pessoas acorrentadas num local de oração.

No final de setembro, em Kaduna, centenas de rapazes adolescentes foram libertados de uma escola islâmica, com cicatrizes e sinais de castigos corporais e de torturas.

Muitas das centenas de pessoas libertadas nas últimas semanas sofrem de doenças mentais ou toxicodependência. Todas denunciaram condições de detenção atrozes, algumas vezes sob tortura e incluindo abusos físicos e sexuais.

Os centros de reabilitação privados - muitas vezes informais - estabelecidos por comunidades religiosas, estão espalhados por toda a Nigéria, o país mais populoso de África, com elevados níveis de pobreza e escassos serviços públicos.

As altas taxas de consumo de drogas e a falta de instalações de reabilitação empurram as famílias a inscrever os seus filhos nestes centros. Em outubro, após mais uma das operações policiais para desmantelar estas comunidades, o Presidente nigeriano, Muhammadu Buhari, condenou com firmeza as condições de funcionamento.

"Nenhum Governo democrático responsável poderá tolerar a existência de câmaras de tortura e de sevícias físicas contra detidos em nome da reabilitação", afirmou.

O Governo não está contudo isento de críticas e a diretora do Centro para a Democracia e o Desenvolvimento, Hassan Idayat, considera-o mesmo responsável, de certa forma, pela situação revelada desde setembro.

"Este fenómeno espalhou-se devido à falta de instituições de saúde mental", afirmou à AFP. "O Governo tem de investir urgentemente na saúde mental".
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