Novo recorde de 120 milhões. População de deslocados à força já equivale à do Japão

por Graça Andrade Ramos - RTP
A crise de refugiados no Sudão mantém-se a segunda mais grave do planeta, logo após a Síria Alfatih Alsemari - Reuters

Pelo 12º ano consecutivo, o número de pessoas forçadas a deixar as suas casas, em fuga da violência e da perseguição, alcançou um novo pico em maio de 2024, revelou a agência das Nações Unidas para os Refugiados no seu relatório anual.

São agora 120 milhões de pessoas, o equivalente à população japonesa, que é o 12º país mais populoso do mundo, sublinhou a ACNUR.

Uma em cada 69 pessoas no mundo, ou 1,5 da população mundial, é atualmente um deslocado forçado. O correspondente a quase o dobro de uma em 125 pessoas deslocadas de há uma década.

Novos conflitos no Sudão, em Myanmar e em Gaza, assim como o fracasso em resolver conflitos mais antigos, contribuíram para o aumento, considerado pelo diretor da agência da ONU, Filippo Grandi, uma "acusação terrível ao estado do mundo".

Grandi apelou os governos a enfrentar as raízes do problema em vez de usar os refugiados para ganhos políticos e de recorrer a soluções rápidas como o encerramento de fronteiras.

É essencial a cooperação entre os países para encontrar soluções mais duradouras, considerou.
Os piores casos
No Sudão, o que começou como uma guerra entre generais em abril de 2023 empurrou para a fuga mais de nove milhões de pessoas. Em Gaza, a guerra entre Israel e o Hamas obrigou desde outubro à deslocação estimada de 75 por cento da população, correspondente a 1.7 milhões de seres humanos.

A maior crise humanitária de deslocados, contudo, continua a ocorrer na Síria, onde a guerra iniciada em 2011 continua a impedir 13.8 milhões de pessoas de regressar a casa.

Conflitos armados na República Democrática do Congo e em Myanmar forçaram vários milhões a abandonar as suas aldeias durante o ano de 2023, prosseguiu a ACNUR.

O mais recente relatório sobre as Tendências Globais, publicado em junho de 2024, aponta as tendências estatísticas sobre o deslocamento forçado das populações humanas.


"Por trás destes números frios e em ascenção, há inúmeras tragédias humanas. Este sofrimento deve galvanizar a comunidade internacional a agir urgentemente para enfrentar as causas na origem do deslocamento forçado", referiu Filippo Grandi na apresentação do relatório.

"Já é tempo das partes em conflito respeitarem as leis básicas da guerra e a lei internacional", acrescentou. 

"O facto é que, sem melhor cooperação e esforços concertados para enfrentar os conflitos, as violações de direitos humanos e a crise climática, os números de deslocados irão continuar a aumentar, provocando nova miséria e respostas humanitárias dispendiosas", acrescentou.
Não vão para longe

A agência da ONU para os refugiados frisou também ser falso que todos os refugiados e outros migrantes tenham ido para os países mais ricos, sublinhando que a vasta maioria dos refugiados são acolhidos por países vizinhos, com 75 por cento a residir em países de médio ou baixo rendimento que, todos juntos, produzem 20 por cento ou menos do rendimento global planetário.

O maior aumento nos números de deslocados vem aliás de pessoas que fogem da guerra mas permanecem no próprio país, que subiram para 68.3 milhões, de acordo com o Centro Internacional de Monitorização de Deslocações. O equivalente a uma subida de quase 50 por cento em cinco anos.

Desde 2012, o número de deslocados praticamente triplicou e deverá continuar a crescer, indicou Grandi.

"A não ser que se dê uma mudança nas geopolíticas internacionais, infelizmente, consigo antever os números a subir", referiu.
Sinais de esperança
O relatório mostra que em todo o planeta, mais de cinco milhões de pessoas deslocadas internamente e um milhão de refugiados regressaram a casa em 2023, o que indica algum progresso em soluções de longo prazo. As chegadas para realojamento aumentaram para quase 160 mil em 2023, outro sinal positivo.

"Os refugiados – e as comunidades que os acolhem – necessitam de solidariedade e de apoio. Eles podem contribuir, e fazem-no, para a sociedade, quando são incluídos", sublinhou Grandi.

"Igualmente, o ano passado, milhões de pessoas regressaram a casa, representando um importante vislumbre de esperança. As soluções existem – vimos países como o Quénia, liderar o rumo na inclusão de refugiados – mas exigem compromisso real", acrescentou o diretor-geral da ACNUR.

O relatório propôs ainda novas perspetivas sobre o impacto da crise climática e como, cada vez mais e de forma desproporcionada, esta afeta as populações forçando-as a deslocar-se.
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