Pacto global das migrações adotado por mais de 150 países

por RTP
Dois migrantes que fazem parte da caravana que fez a travessia de milhares de quilómetros nos últimos meses, na tentativa de chegar aos Estados Unidos Adrees Latif - Reuters

O documento foi formalmente adotado esta segunda-feira em Marraquexe durante uma conferência intergovernamental após vários meses de negociações. Entre os líderes reunidos esta segunda-feira na capital marroquina está o primeiro-ministro português, António Costa. O pacto sobre as migrações tem como base a defesa dos Direitos Humanos e suscitou várias reações negativas a nível mundial. Há várias ausências assinaláveis, desde logo os Estados Unidos e vários países europeus com fortes movimentos nacionalistas e anti-imigração.

“Pacto Global para uma Organização Segura, Ordenada e Regulada” (The Global Compact for Safe, Orderly and Regular Migration) é o nome do documento aprovado e adotado a partir desta segunda-feira por um grupo de líderes reunido esta segunda-feira em Marraquexe, a capital de Marrocos. 

O acordo, negociado ao logo dos últimos 18 meses entre os 193 Estados-membros das Nações Unidas, estabelece várias diretrizes no âmbito das migrações a nível mundial, desde logo a defesa dos Direitos Humanos e dos direitos das crianças migrantes.  A Assembleia Geral das Nações Unidas vai adotar uma resolução formal de apoio a este acordo no próximo dia 19 de dezembro

Com objetivos e medidas concretos, este pacto prevê que os países lidem de forma ordeira com as migrações, incluindo a gestão dos fluxos migratórios nas fronteiras, mas também ao nível da informação e da integração nas comunidades. 

Destaca-se particularmente a proibição de detenções arbitrárias, com a prisão dos migrantes a apresentar-se como último recurso.

Ainda que este acordo não tenha natureza vinculativa para os signatários, um total de 15 países ficou de fora, incluindo os Estados Unidos, uma decisão que vai ao encontro das várias políticas anti-imigração adotadas pela Administração Trump.  

O exemplo norte-americano foi seguido por outros países onde os movimentos nacionalistas e adversos ao acolhimento de refugiados têm crescido, com o distanciamento em relação a este acordo por parte de Itália, Áustria, Holanda, Polónia, Hungria, República Checa, Bulgária, Letónia, Estónia, Eslováquia. 

Israel, Austrália, Chile e República Dominicana também ficaram de fora deste pacto ou não participaram na conferência. 
Acordo "não é contrário" à soberania

Portugal marcou presença nesta conferência que decorre em Marraquexe até terça-feira. Durante a manhã, o primeiro-ministro António Costa  

“Há muito que os portugueses percorrem o mundo. A nossa visão da migração foi também influenciada pela existência de uma diáspora portuguesa bem integrada há muito tempo, que totaliza mais de cinco milhões de pessoas e está presente em todos os continentes”, salientou.  



A delegação portuguesa presente na capital marroquina conta não só com o chefe de Governo mas também com o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, e a secretária de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, Teresa Ribeiro.  

“A migração é ao mesmo tempo um desafio e uma oportunidade, deve ser abordada em conjunto e a nível global através da promoção e o reforço de mecanismos de natureza multilateral que envolvam países de origem, de trânsito e de destino. Este acordo não é contrário à soberania nacional. Cada país conserva o direito de definir a sua própria política nacional de migração e de proteger e defender as suas fronteiras”, referiu o primeiro-ministro português. 

No mesmo sentido, o secretário-geral das Nações Unidas, o português António Guterres destacou que "é muito mais provável que as políticas nacionais tenham sucesso num contexto de cooperação internacional".

"As migrações sempre estiveram presentes. Mas, num mundo onde ela é cada vez mais inevitável e necessária, esta deve ser bem gerida e segura, e não irregular e perigosa. (...) É verdade que alguns Estados não estão aqui connosco hoje. Só espero que eles vejam o valor deste pacto para as suas próprias sociedades e se juntem a nós neste esforço", acrescentou Guterres.


"Hoje, mais de 80 por cento dos migrantes de todo o mundo deslocam-se entre países de forma segura e ordeira. Mas a migração não regulamentada tem um custo humano terrível. Um custo em vidas perdidas durante perigosas viagens, através de desertos, oceanos e rios. Um custo em vidas destruídas por traficantes, empregadores sem escrúpulos e outros predadores", disse ainda António Guterres.

Segundo os números das Nações Unidas apresentados pelo secretário-geral, mais de 60 mil migrantes morreram em movimento para outros países desde 2000. "Isto é um motivo de vergonha coletiva", clamou o representante máximo da ONU presente na conferência.

Francesco Rocca, da Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e Crescente Vermelho, reconheceu em declarações à Al Jazeera que vários países que se opuseram ao pacto "são importantes em termos de influência económica”.

“O documento não interfere nas políticas ou leis internas, mas apenas na preservação da dignidade dos seres humanos. Qualquer Estado de boa-fé deveria ter concordado com este pacto”, acrescentou.

Por sua vez, a representante especial da ONU para as Migrações, Louise Arbor, considera "surpreendente que tenha havido tanta desinformação sobre o que o pacto diz. O documento não impõe nenhuma obrigação aos Estados", referiu a responsável, citada pelo jornal Le Monde.

Para além das críticas vindas dos países que optaram por não subscrever o pacto global para a migração, há quem considere que este documento é insuficiente, particularmente no acesso dos migrantes a ajuda humanitária ou na garantia dos direitos dos trabalhadores migrantes, coo destaca o mesmo diário francês na edição desta segunda-feira.
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