Presidenciais servirão para manter o poder na família Obiang Nguema

por Lusa

As eleições presidenciais, legislativas e municipais na Guiné Equatorial este domingo apenas servem ao mais antigo Presidente em todo o mundo, Teodoro Obiang Nguema Mbasogo, para "manter o poder na família", consideraram à Lusa vários ativistas equato-guineenses.

"Qualquer pessoa diria que a família Obiang Nguema tem sete anos para se despedir do poder, mas o contexto convida-nos a outra reflexão: os Obiang Nguema estão a tecer uma estratégia para manter o poder no seio da família" e estas eleições são um "passo importante" nesse sentido, afirmou à Lusa o coordenador geral da Plataforma Civil Somos+, Joaquin Eló Ayeto.

A Constituição equato-guineense estabelece um mandato presidencial no país membro da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) de sete anos, mas os ativistas contactados pela Lusa dizem que o atual chefe de Estado, com 80 anos, no poder desde 1979, não irá cumpri-lo na totalidade e, antes do seu final, passará o testemunho ao filho, Teodoro Nguema Obiang Mangue, atual vice-presidente, conhecido como "Teodorín".

Ao contrário das outras vezes, em que foi a todos os distritos, este ano Obiang fez campanha apenas nas cidades maiores, nas capitais de província.

"Obiang demonstrou nesta campanha a sua debilidade física. Acharam-no cansado, sem programa", comentou Alfredo Okenve, membro da direção de uma plataforma da sociedade civil "Guiné Equatorial Também é Nossa", autoexilado em Espanha.

"Na minha opinião, no próximo mandato o regime vai impor a figura do sucessor e, neste momento, o que está em primeiro na linha sucessória é Teodorín, o vice-presidente, que irá consolidar-se", disse à Lusa um ativista da Comissão Equato-guineense de Juristas (CEJ) em Malabo, sob condição de anonimato, alegando razões de segurança pessoal.

De acordo com este jurista equato-guineense, "em algum momento, no culminar de um processo que começou há largos meses, vai completar-se a assunção funcional das tarefas do chefe de Estado e, em seguida, essa transição será formalizada, ainda que não saiba quando será".

Antes do final deste mandato, garantem todas as fontes contactadas "teremos o sucessor de Teodoro Obiang no poder e, neste momento, Teodorín é o favorito", na expressão de um ativista da APROFOR - uma plataforma apoiada pela União Europeia de apoio, proteção e fortalecimento de ativistas e organizações da sociedade civil na defesa dos direitos humanos na Guiné Equatorial", que também solicitou o anonimato.

"Claro que na Guiné Equatorial as coisas podem mudar a qualquer momento, mas creio que ele será o próximo presidente, isto se o pai não mudar de opinião de um dia para o outro, o que também pode acontecer. Todos conhecemos os rumores antigos de que Obiang não confia totalmente neste filho", acrescentou.

De acordo com estas fontes, detidas as vozes da oposição, as de políticos assim como de ativistas, para além de mais de 3000 jovens, na sua maioria adolescentes, entre maio e agosto na chamada "Operação Limpeza", conduzida pelo vice-presidente -- os números são de acordo com Okenve e a operação foi amplamente denunciada pela Amnistia Internacional -, as eleições serão "muito semelhantes a todas as anteriores", segundo o ativista da CEJ.

"Não acredito em grandes mudanças porque as circunstâncias também não mudaram muito. Estas eleições são muito parecidas com as anteriores, o partido governante ocupa o espaço nos órgãos de comunicação social, e a comissão nacional de eleições e os observadores não vão ser imparciais. Tudo isto é muito semelhante aos anos anteriores", acrescentou.

Talvez a maior novidade seja a oposição poder vir a ocupar "um lugar ou outro" no Parlamento, prevê Okenve.

"Penso que desta vez, Obiang está disponível para aceitar uma percentagem de votos um pouco abaixo dos 93%. Já do que não estou seguro é que o resto da militância do Partido Democrático da Guiné Equatorial (PDGE, no poder), o entorno do regime, goste disto", ironizou.

A oposição no país ficou nestas eleições reduzida a apenas um partido, a Convergência para a Social Democracia (CPDS), liderada por Andrés Esono Ondo um dos três candidatos à presidência.

Esono Ondo concorre contra Teodoro Obiang e contra Buenaventura Monsuy Asumu, líder do Partido da Coligação Social Democrata (PCSD), um aliado crónico do Presidente, que pela quinta vez lhe "faz o favor de concorrer contra ele, oferecendo ao regime um simulacro de democracia", nos termos do ativista da CEJ.

Segundo Okenve, se Obiang este ano apenas se deslocou às capitais provinciais, também Esono Ondo se apresentou com "um certo cansaço, denotando alguma falta de esperança".

"Penso que se candidata sobretudo para salvar o partido, para dar-lhe notoriedade e impedir que o regime simplesmente o faça desaparecer, mas também por causa do apoio financeiro do Estado aos partidos candidatos, e, se tiver sorte, talvez Obiang lhe dê alguns deputados", afirmou.

Os partidos -- CPDS, PCSD e a coligação de 15 formações liderada pelo PDGE - obtiveram do Estado cerca de 350 milhões de francos CFA (aproximadamente 53,5 mil euros) para aplicarem nas respetivas campanhas, que decorreram "de forma semelhante às anteriores", segundo a fonte da APROFOR.

"O que se destaca nestas últimas semanas é a utilização das redes sociais, onde o vice-presidente fez acusações às oposições e as usou para lhes responder - por exemplo, a oposição pediu um debate público e Teodorín disse-lhes através do Twitter que podiam `debater com as cabras` -- mas esse foi talvez o único novo aliciante", afirmou o ativista.

De acordo com a APROFOR, por outro lado, os candidatos puderam circular pelo país em campanha, na região continental, assim como na insular, o que "não significa que não tenham tido dificuldades".

Num "grande número" de eventos de campanha, "o CPDS foi acossado por grupos do partido no poder, sobretudo de jovens, e isto sob diversas formas: destruíram ou vandalizaram placards, provocaram desacatos com elementos do CPDS".

Não obstante, "em termos gerais, o CPDS pôde fazer campanha no país", reforçou a organização, que, em contrapartida, pouco sabe sobre as condições em que Boanaventura Monsuy e o PCSD fizeram campanha.

"Não há muita informação, não se sabe onde Boanaventura fez campanha, não posso dizer se se deparou com alguma dificuldade. Porém, este partido fazia parte da coligação do Governo, liderada pelo PDGE, nas eleições anteriores", disse o ativista da APROFOR.

A organizações equato-guineenses da sociedade civil não assinalaram a imposição de restrições no acesso à internet e redes sociais, onde decorre a maior parte da discussão política, sobretudo nos maiores centros urbanos.

Em contrapartida, há limitação no acesso aos media oficiais manteve-se. "Mais de 90% das notícias são do partido governante, na televisão a oposição tem uns dois ou três minutos nos jornais diários, se tanto", apontou a CEJ.

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