Primeira-ministra francesa apresentou a demissão, Macron não aceitou

por Andreia Martins - RTP
Ludovic Marin - Reuters

Na sequência das eleições legislativas de domingo, que resultaram numa Assembleia Nacional divida e sem uma maioria absoluta, a primeira-ministra Elisabeth Borne colocou o seu lugar à disposição. A proposta foi recusada pelo presidente francês “para que o Governo possa continuar em funções e agir nestes dias”.

O pedido de demissão surge numa altura em que Emmanuel Macron se prepara para iniciar uma ronda de reuniões com vários partidos para encontrar uma solução governativa.

O presidente francês vai receber os representantes de várias forças políticas no Palácio do Eliseu entre hoje e quarta-feira para “construir soluções que sirvam os franceses”, na ausência de uma alternativa que substitua a maioria relativa de Emmanuel Macron.

Perante o perigo de instabilidade e ingovernabilidade após as eleições legislativas, o chefe de Estado francês procura entendimentos com os representantes das forças políticas que deverão formar os vários grupos parlamentares do novo Parlamento.

“Como garante das instituições, o presidente da República está determinado a agir no interesse dos franceses e das francesas”, vincou a equipa de Emmanuel Macron.

O Ensemble, partido que apoia o presidente, obteve uma maioria relativa de 245 deputados, muito aquém dos 289 lugares necessários para formar uma maioria absoluta na Assembleia Nacional.
Um Governo frágil
Com a substituição garantida da ministra da Saúde e da ministra da Transição Ecológica, que falharam a reeleição nas legislativas de domingo, o recém-empossado governo de Elisabeth Borne inicia a legislatura numa posição de grande fragilidade.

Após o pedido de demissão entretanto recusado por Macron, a primeira-ministra irá reunir-se esta terça-feira com todo o Governo na residência oficial de Matignon ao início da tarde.

No horizonte deste Governo está já uma moção de censura, que deverá ser apresentada pela coligação Nupes (Nova União Popular Ecológica e Social) no início de julho. A aliança, que junta o França Insubmissa, o Partido Socialista, Partido Comunista e Verdes, foi a segunda força política mais votada, tendo garantindo a eleição de 131 deputados.

Emmanuel Macron inicia as reuniões esta terça-feira ao receber o representante dos Les Républicains, Christian Jacob. Uma coligação com o centro-direita - a quarta-força política mais votada, que garantiu a eleição de 61 deputados - seria suficiente para formar uma maioria governativa.

No rescaldo das eleições, o partido que representa a direita tradicional francesa excluiu a possibilidade de uma aliança governativa, mas recusou-se, por outro lado, a unir forças com a coligação de forças representada por Jean-Luc Mélenchon para aprovar a moção de censura.

“Estaremos sempre disponíveis para entrar em acordo, para convencer sobretudo os moderados que estão connosco neste Parlamento”, afirmou a porta-voz do Governo, Olivia Grégoire, na segunda-feira.

“Uma vez que não há uma maioria alternativa, coloca-se a questão de como operar as transformações necessárias para o nosso país. É este o objetivo dos encontros com as forças políticas: dialogar e negociar pelo interesse superior da nação e construir soluções que sirvam os franceses”, indicou a equipa do presidente francês à agência France Presse sobre as reuniões.
Primeira maioria relativa desde Mitterrand

Na ausência de um acordo governativo entre vários partidos, o executivo será obrigado a negociar dossier a dossier para conseguir aprovar legislação.

Sem maiorias absolutas, a Assembleia Nacional está de novo ao centro do xadrez político em França. A Quinta República que, desde logo, deu primazia ao poder presidencial a partir de 1958, justamente para evitar a instabilidade vivida no anterior regime parlamentar.

Esta será a primeira vez desde François Mitterrand que um presidente francês terá de lidar com um cenário de maioria relativa no parlamento. Na altura, Mitterrand lidou com três diferentes executivos de três diferentes primeiros-ministros, entre 1988 e 1993.

Destaque também para o facto de este ser um cenário inédito no século XXI e que ocorre pela primeira vez desde que o calendário eleitoral francês foi invertido, em 2001, com as eleições presidenciais a ocorrerem antes das eleições presidenciais. 

Por estes dias, o presidente francês irá receber também os representantes do Partido Socialista (que concorreram a estas eleições na coligação Nupes) e do Rassemblement National. De acordo com a agência France Presse, Marine Le Pen irá integrar a delegação que será recebida no Eliseu em nome da terceira força política mais votada.

Do lado dos Nupes, o líder do Partido Socialista, Olivier Faure, e do Partido Comunista francês, Fabien Roussel, serão recebidos por Emmanuel Macron. Jean-Luc Mélenchon não deverá reunir com o chefe de Estado francês, adianta a AFP.

Na segunda-feira, o líder da França Insubmissa desafiou a primeira-ministra Elisabeth Borne a submeter-se a uma moção de confiança na nova Assembleia Nacional. “Seria derrotada”, concluiu.

No entanto, Mélenchon enfrenta dificuldades dentro do próprio grupo multifacetado que representou. No rescaldo das eleições, o líder da esquerda radical propôs aos vários elementos dos Nupes a criação de um único grupo parlamentar na Assembleia Nacional, ao contrário do que tinha sido planeado por socialistas, comunistas e Verdes aquando da candidatura. A hipótese foi rejeitada pelos parceiros eleitorais.

c/ agências
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