"Queimem-nos". Incêndios na Grécia motivam ódio contra migrantes

por Rachel Mestre Mesquita - RTP
Bombeiros tentam extinguir um incêndio florestal que arde perto da aldeia de Makri, na região de Evros, na Grécia, a 22 de agosto de 2023 Alexandros Avramidis - Reuters

Numa altura em que a Grécia tem sido assolada pelos incêndios, as manifestações de racismo online contra migrantes tem aumentado. São acusados nas redes sociais por internautas, com base em alegações infundadas, de terem ateado alguns dos fogos no nordeste do país.

Um grupo de 13 migrantes paquistaneses e sírios é acusado nas redes sociais de ter sido apanhado em flagrante a tentar atear um incêndio junto à cidade de Alexandroupoli, na região de Evros, onde têm deflagrado violentos incêndios desde sábado, fruto das temperaturas altas e ventos fortes.

Esta vaga de acusações e comentários cresceu depois de um residente local ter publicado um vídeo, na rede social Facebook, na terça-feira, mostrando os migrantes amontoados numa caravana e gabando-se de os ter detido por tentarem “incendiar-nos”. "Não os mostrem... queimem-nos!", comentou no vídeo um internauta.

De acordo com as autoridades gregas, o homem que publicou o vídeo na internet, assim como dois alegados cúmplices, já foram detidos e acusados de incitamento à violência racista, afirmando que este comportamento não seria tolerado.

Os imigrantes, de origem paquistanesa e síria, foram acusados de entrada ilegal no país e de tentativa de fogo posto. Segundo o diário grego Kathimerini, uma fonte governamental declarou que as provas contra eles pareciam provir de uma fogueira. A região de Evros, a poucos quilómetros da fronteira com a Turquia, é uma das principais portas de entrada para milhares de migrantes que procuram asilo na União Europeia.

Numa zona remota, uma das mais pobres do país, migrantes tentam regularmente atravessar a fronteira terrestre, apesar do muro metálico de 37,5 quilómetros erguido em 2020 e que deverá ser alargado em 35 quilómetros até ao final deste ano.

Com o aumento da extrema-direita no país, o ressentimento contra os imigrantes – especialmente nas zonas fronteiriças gregas – também tem aumentado. Os habitantes gregos acusam regularmente os requerentes de asilo de roubo e afirmam que a condução imprudente dos traficantes de seres humanos representa um sério risco para a segurança rodoviária da população.

"Queimam-nos, roubam-nos, matam-nos em acidentes de viação", disse Christos Paschalakis, um residente da região de Evros, à agência France Presse.
"Estou absolutamente convencido de que os incêndios foram ateados por imigrantes", acrescentou.
Também Vangelis Rallis, um lenhador reformado de 70 anos da aldeia de Dadia, afirmou: "Não tenho dúvidas de que o incêndio florestal foi provocado por imigrantes".

Alguns meios de comunicação social locais e nacionais também têm alimentado a retórica anti-imigração, através da divulgação de fake news, notícias falsas, nos últimos dias. Como é o caso de um portal de notícias local que noticiou, na terça-feira, que um grupo de 20 imigrantes tinha sido detido nos arredores de Alexandroupoli depois de ter trocado tiros com a polícia. Mas as autoridades gregas já desmentiram estas afirmações.

O norte da Grécia tem sido devastado por violentos incêndios, que já queimaram mais de 60 mil hectares de terras agrícolas e florestais e levaram à evacuação de mais de 14 mil pessoas, incluindo um hospital. Das 20 vítimas mortais nos incêndios desta semana, pensa-se que 19 sejam migrantes.

c/ AFP
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