Rei da Bélgica expressa "profundo arrependimento" pelo passado colonial no Congo

por RTP
Presidente da RDC, Félix Tshisekedi (à esquerda) e o rei Filipe da Bélgica (à direita) Francois Lenoir - Reuters

Pela primeira vez na história do país, o rei da Bélgica apresentou o seu "mais profundo arrependimento pelas feridas" infligidas durante o período colonial belga no Congo, atual República Democrática do Congo.

Esta terça-feira marca o 60.º aniversário de independência da República Democrática do Congo (RDC) e o rei Filipe, da Bélgica, enviou uma carta ao presidente da RDC, Félix Tshisekedi, onde lamenta profundamente o passado colonial do país.

"Gostaria de expressar o mais profundo arrependimento por essas feridas do passado, cuja dor agora é reacendida pela discriminação ainda presente nas nossas sociedades", escreveu o monarca.

"Na época do 'Estado Livre do Congo [designação deste território africano quando era propriedade do rei Leopoldo II], foram cometidos atos de violência e crueldade, que ainda pesam na nossa memória coletiva", assegurou Filipe, que reina desde 2013.

"O período colonial que se seguiu [o do Congo Belga de 1908 a 1960] também causou sofrimento e humilhação", acrescentou. A RDC alcançou a independência em 1960, depois de o país ter sido uma colónia belga por 52 anos. Estima-se que milhões de congoleses tenham morrido entre 1885 e 1908, depois de o rei Leopoldo II ter declarado o território propriedade pessoal.

A carta foi descrita como histórica, dado que é a primeira vez que um rei belga expressa arrependimento pelo passado colonial do país.
“Fazer as pazes com as nossas memórias”
Os belgo-congoleses são ainda marcados pelo passado colonial e pela discriminação sistemática do presente.

A morte de George Floyd, o afro-americano asfixiado no final de maio por um polícia branco em Minneapolis, nos Estados Unidos, reavivou o debate sobre a violência do período colonial e o racismo no país.

As estátuas do rei Leopoldo II, acusado pela morte de milhões de congoleses durante a colonização belga, foram vandalizadas na Bélgica na sequência dos protestos antirracistas que têm decorrido em todo o mundo.

Os jovens belgas de descendência congolesa veem as celebrações de 30 de junho como uma oportunidade para defender a igualdade e o fim do racismo na Bélgica. No entanto, o movimento antirracismo teve pouca participação por parte da geração congolesa mais antiga da Bélgica.

Os nossos pais dizem-nos para não protestar porque temem a violência contra nós”, disse Mireille-Tsheusi Robert, fundadora do grupo antirracista Bamko-Cran, à Al Jazeera.

“Vimos os nossos pais serem humilhados e degradados diante dos nossos olhos e eles são os nossos heróis. Não queremos permitir e suportar o mesmo relacionamento que eles tiveram com o resto da sociedade belga”, acrescentou Mireille-Tsheusi.

Na carta enviada ao presidente da RDC, o rei Filipe assumiu o compromisso de "combater todas as formas de racismo" e saudou a iniciativa do parlamento belga em lançar uma comissão de reconciliação para enfrentar o racismo e o passado colonial no país. Esse processo de reflexão pode ajudar os belgas “a finalmente fazerem as pazes com as suas memórias”, afirmou o rei Filipe.
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