Revelações de Erdogan pouco acrescentam ao caso Khashoggi

por Paulo Alexandre Amaral - RTP
Recep Tayyip Erdogan dirigiu-se esta terça-feira ao Parlamento turco EPA

“Um assassino violentamente planeado”. Com este mote, o presidente turco prometia para esta terça-feira a divulgação de toda a verdade sobre o desaparecimento de Jamal Khashoggi a 2 de outubro, depois de ser visto a entrar no consulado saudita em Istambul. Recep Tayyip Erdogan dirigiu-se ao Parlamento turco, mas acabou por apenas juntar as peças do puzzle que são já conhecidas. Em contrapartida, jogou forte na ideia de levar os 18 sauditas alegadamente envolvidos na morte do jornalista saudita perante a justiça turca, confiante de que o rei saudita se mostrará colaborador.

Na intervenção perante o Parlamento turco, o Presidente Erdogan assentou a sua análise do homicídio do caso Jamal Khashoggi na tese de que o episódio mais não foi do que uma eliminação minuciosamente planeada a partir da Arábia Saudita e levada a cabo por 18 pessoas que chegaram a Istambul em dois grupos separados, mas com ações bem definidas.

As versões de Riade relativamente ao desaparecimento do jornalista saudita têm evoluído ao longo das últimas semanas. Desde o não reconhecimento da morte, o lançamento de dúvidas quanto ao seu paradeiro, a narrativa de uma morte durante um “interrogatório que correu mal” no consulado, a ideia de que se tratou de uma entrevista em que o jornalista se envolveu numa contenda com funcionários, até à difusão de imagens montadas com o uso de um “duplo” encenando a saída de Khashoggi do consulado, para, finalmente, Riade admitir nos últimos dias que o jornalista foi morto numa operação não autorizada, um episódio infeliz que não deveria ter acontecido.

Esta manhã, Recep Tayyip Erdogan refez os passos da narrativa – que corre desde os primeiros dias – de que o jornalista foi vítima de um “assassínio selvagem”. Pouco acrescentando ao que era já conhecido da cena e das circunstâncias do crime, o líder turco deixou uma forte mensagem à coroa saudita: não admite encobrimentos e exige que os 18 homens sejam devolvidos à jurisdição turca para serem julgados no país em que alegadamente cometeram o homicídio.As câmaras do consulado terão sido desligadas antes da visita de Jamal Khashoggi.

Um ponto ainda abordado por Erdogan tem a ver com os restos mortais de Jamal Khashoggi. O Presidente fez notar que a operação de liquidação foi levada a cabo por uma equipa de agentes sauditas que chegaram a Istambul em momentos distintos: primeiro aterraram na capital económica 15 deles e num segundo momento chegaram os restantes três.

Os primeiros dirigiram-se para o consulado no dia em que Jamal Khashoggi tinha uma entrevista marcada para levantar documentos com vista ao seu casamento. Os outros três, afirmou Erdogan, fizeram uma curta viagem à Floresta de Belgrado, 90 quilómetros a sul de Istambul, onde já antes se afirmara que poderia ser o local para onde foi levado o corpo desmembrado do jornalista saudita.

Nesse ponto, o líder turco exigiu saber onde se encontram os restos mortais de Khashoggi e esse é um dado que estará seguramente na posse dos sauditas que entraram na Turquia para matar Khashoggi, um jornalista muito crítico do regime, uma voz incómoda que, apesar das versões apresentadas nos últimos dias, o príncipe herdeiro Mohammed Bin Salman tinha toda a conveniência que fosse silenciada, de forma a levar a cabo de forma pacífica o que quer fazer passar por uma campanha reformadora na Arábia Saudita.
"Iremos até ao fundo"
No entanto, já na segunda-feira o porta-voz de Erdogan prometera que “nada ficaria por dizer”: “Desde o início, a linha do nosso Presidente é transparente: nada ficará por dizer. No plano judicial, iremos até ao fundo deste caso”.

A novidade da comunicação do Chefe de Estado assenta neste pormenor: convocando Mohammed Bin Salman para o processo, Recep Tayyip Erdogan exige a Riade que disponibilize os 18 homens detidos no reino por alegado envolvimento na morte do jornalista à justiça turca.

Erdogan sublinhou que o facto de que atirar a culpa para alguns elementos dos serviços de inteligência sauditas, afirmar que se tratou de uma operação levada a cabo sem controlo ou autorizações, não satisfaz as autoridades turcas.
pub