Tiros durante distribuição de auxílio humanitário em Gaza

Milhares de pessoas precipitaram-se sobre um centro de distribuição de ajuda no sul da Faixa de Gaza, forçando os seus responsáveis a recuar para local mais seguro. Estes responsabilizaram o Hamas, que governa a Faixa de Gaza, por impor "barreiras" que provocaram atrasos "de horas" na distribuição.

RTP /
Imagem captada de um vídeo da precipitação sobre o centro de auxílio em Gaza Foto: AFP

Uma jornalista da Agência France Press (AFP) testemunha da ocorrência, referiu que a multidão se aglomerou em torno de um novo centro de distribuição de ajuda humanitária, em Rafah.

A recém-criada Fundação Humanitária de Gaza (GHF), apoiada pelos EUA, que opera os centros, escreveu que a multidão esta tarde era tão grande que a sua equipa "retirou-se para permitir que um pequeno número de residentes de Gaza recebesse ajuda em segurança (antes) de se dispersar"

"Estava na fila de um ponto de distribuição de ajuda em Rafah com centenas de cidadãos e, de repente, um grande número de pessoas começou a empurrar-me e a entrar de forma completamente aleatória", disse à AFP Ayman Abu Zaid, um deslocado.

"Foi por falta de ajuda e atraso na distribuição, por isso tentaram voltar para buscar o que pudessem", acrescentou.

"A dada altura houve tiros, foi muito assustador, e as pessoas começaram a dispersar, mas algumas continuaram a tentar obter ajuda, apesar do perigo", disse o homem.

O exército israelita esclareceu depois que as suas forças não dirigiram tiros aéreos contra o centro de distribuição de ajuda humanitária, mas que dispararam tiros de aviso numa área fora do centro.

Em comunicado, a organização afirmou que o controlo da situação foi estabelecido e que a distribuição da ajuda irá continuar conforme o planeado.

Questionado pela AFP sobre o incidente, o exército israelita referiu-se à declaração do GHF.

"As operações normais (de distribuição) foram retomadas", disse a Fundação, responsabilizando "barreiras impostas pelo Hamas" por provocarem atrasos de várias horas num dos seus centros. O serviço de imprensa do Governo do Hamas em Gaza, por sua vez, denunciou cenas de caos pelas quais responsabilizou Israel e falou de uma "invasão" de centros de distribuição por "milhares de pessoas famintas".

A GHF tem o apoio de Israel e assumiu a distribuição de auxílio em Gaza, sem contar com as Nações Unidas, cujo trabalho é contestado por Israel por considerar que as suas estruturas estão infiltradas pelo Hamas.

A capacidade da GHF em garantir as operaçóes em segurança tem estado contudo a ser colocada em dúvida.

O porta-voz do secretário-geral da ONU referiu que António Guterres lamentou o desespero da população.

"Vimos estes vídeos vindos de Gaza em redor de um centro de distribuição da Fundação Humanitária de Gaza e, francamente, estes vídeos, estas imagens, são desoladores", disse Stéphane Dujarric, descrevendo pessoas "desesperadas por ajuda nestas condições", que a ONU considera estar em contradição com os princípios humanitários.

Washington reagiu criticando a "hipocrisia" da posição da ONU, enquanto o governo israelita se limitou a reconhecer uma "perda momentanea de controlo".

A entrada de ajuda em Gaza tem sido severamente condicionada por Israel nos últimos dois meses, como forma de pressão sobre o Hamas, enquanto prossegue os bombardeamentos, destruindo infraestruturas, e obriga à deslocação das populações. De acordo com agências internacionais, a estratégia israelita agravou o risco de fome "catastrófica" no enclave, referindo que esta poderá afetar meio milhão de palestinianos até setembro.

Israel tem estado a ser acusado de genocídio e os seus próprios aliados ocidentais criticaram severamente o Governo do primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, pelo uso do auxílio como arma estratégica. 

Israel acusa o Hamas de desviar a ajuda em benefício próprio em vez de permitir a sua livre distribuição, propondo um novo sistema de entregas, não afeto a organizações já presentes no terreno, e que foi rejeitado pela comunidade internacional.
Exige ainda a libertação dos reféns ainda retidos em Gaza desde 7 de outubro de 2023, quando foram sequestrados após a invasão do Hamas do sul de Israel.

Netanyahu já disse que o grande objetivo de Israel, além da recuperação dos reféns, é a destruição total do Hamas.

Sob pressão internacional, o governo israelita autorizou nos últimos dias a entrada em Gaza de mais de uma centena de camiões com auxílio, iniciativa classificada como uma "gota de água", face às necessidades de milhares de pessoas.
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