Dois agentes da polícia de Israel mataram a tiro, no passado sábado, um palestiniano em Jerusalém por suspeitarem que se tratava de um terrorista. A vítima estava desarmada e sofria de autismo. A morte de Hallaq está a ser comparada à de George Floyd, o homem negro que foi asfixiado pela polícia norte-americana na semana passada
Um porta-voz da polícia de Israel disse que o palestiniano teve de ser “neutralizado” depois de ter fugido quando o mandaram parar por suspeitas de ser um terrorista, dado que carregava um objeto que “parecia uma arma”. De acordo com o jornal israelita Haaretz, os dois agentes da Polícia de Fronteira de Israel começaram a disparar e acabaram por abater Hallaq.
Warda Abu Hadid, cuidadora de Hallaq, disse aos meios de comunicação israelitas que tentou alertar a polícia de que ele era autista e não entendia o que lhe estavam a pedir. “Está desarmado, está desarmado”, gritou Hadid aos agentes. “De repente, eles dispararam três tiros contra ele, diante dos meus olhos”, descreveu a cuidadora da vítima.
Fonte da investigação revelou que um dos agentes – que tinha sido recrutado recentemente – é suspeito de ter continuado a disparar mesmo depois de o comandante ter ordenado que parasse, argumentando que não obedeceu, dado que Hallaq ainda estava em movimento.
O departamento de assuntos internos da polícia já abriu uma investigação para averiguar os factos do incidente. Os dois agentes já foram interrogados e de acordo com o jornal israelita, um deles saiu em liberdade condicional e o outro ficou em prisão domiciliária.
O advogado que representa a família de Hallaq adiantou que vai instar uma investigação judicial “por homicídio”. “Segundo os testemunhos, cerca de dez balas foram disparadas diretamente contra Hallaq. Temos a certeza de que ele não representou nenhuma ameaça aos agentes”, argumentou o advogado.
Por seu lado, os advogados de um dos agentes envolvidos no tiroteio dizem que o que aconteceu foi “uma tragédia”, mas defendem que “os agentes agiram exatamente como era esperado da parte deles”.
Os advogados explicaram que os agentes da Polícia de Fronteiras foram notificados pela Polícia do Distrito de Jerusalém de que um terrorista estava em liberdade. “Para todos os efeitos, ele era um terrorista para eles. Eles agiram de acordo com a ordem explícita que receberam dos seus superiores. É preciso recordar que têm ocorrido muitos ataques nesta área e, portanto, os dois agentes agiram de acordo com o protocolo, enquanto faziam o possível para deter o suspeito”, defenderam os advogados em comunicado.
"Vidas palestinianas importam"
O ministro da Defesa de Israel, Benny Gantz, já pediu desculpas pelo homicídio. "Lamentamos muito o incidente em que Iyad Halak foi morto a tiro e compartilhamos o sofrimento da família", disse Gantz. "Estou certo de que esse assunto será investigado rapidamente e que serão retiradas conclusões", acrescentou o ministro.
A morte de Hallaq tem sido apontada como um exemplo da indiferença pelas vidas palestinianas em Israel, à semelhança dos crimes contra afro-americanos nos EUA.
Vários manifestantes saíram à rua em Jerusalém a exigir justiça para Hallaq. Seguravam cartazes que faziam também referência a George Floyd, o homem negro que foi asfixiado pela polícia norte-americana na semana passada.
“Vidas palestinianas importam”, lia-se em alguns cartazes que fazem referência ao movimento Black Lives Matter nos EUA.
O Instituto Palestiniano de Diplomacia Pública, com sede em Ramallah, publicou um cartaz no Twitter onde Hallaq e Floyd aparecem lado a lado e em cima se lê “dois países, sistema semelhante”.
Eyad and George were victims of similar systems of supremacy and oppression. They must be dismantled.
— ThePIPD (@ThePIPD) May 31, 2020
Palestinian Lives Matter. Black Lives Matter.
It is time for justice. pic.twitter.com/EoE0opIKiR
“Eyad e George foram vítimas de sistemas semelhantes de supremacia e opressão. Eles devem ser desmantelados”, escreve o instituto no tweet.
Nos EUA, os protestos na sequência da morte de Floyd estendem-se a todo o país e têm sido marcados por vários confrontos entre as autoridades e os manifestantes que levaram a milhares de detenções.
Homicídio é “prova dos crimes que Israel está a cometer”
Após o recente anúncio do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, sobre o alargamento da soberania israelita nos colonatos da Cisjordânia e no Vale do Jordão, vários incidentes violentos têm ocorrido nos últimos dias.
O porta-voz do movimento islamita Hamas, Hazem Qassem, disse que “executar um palestiniano com necessidades especiais é uma prova dos crimes que Israel está a cometer. Estes crimes estão a alimentar a resistência palestiniana, cuja resposta será realizar ações contra a ocupação”.
"Aqueles que se esforçarem para normalizar os laços com Israel serão responsáveis pelo sangue palestiniano derramado por Israel", disse ainda Qassem.