Violência em Chemnitz. Alemanha investiga ligações da polícia à extrema-direita

por Andreia Martins - RTP
Matthias Rietschel - Reuters

As autoridades alemãs anunciaram a abertura de um inquérito para apurar quem informou os grupos de extrema-direita sobre o mandado de detenção de um iraquiano num caso de esfaqueamento em Chemnitz, no passado fim de semana. O caso em questão levou a protestos violentos por parte de grupos extremistas naquela cidade.

A Alemanha está a investigar potenciais ligações entre a polícia germânica e grupos de extrema-direita na cidade de Chemnitz, na Saxónia. Em causa está o leak de um mandado de detenção de um homem iraquiano de 22 anos que foi emitido pelas autoridades, mas que depressa chegou ao conhecimento de grupos xenófobos.

A divulgação não autorizada destas informações leva as autoridades alemãs a investigar, por via de um inquérito da procuradoria de Dresden, possíveis ligações entre os grupos anti-imigração e a própria polícia daquela cidade.  

Nos últimos dias, a cidade tem sido palco de violentos protestos contra a comunidade imigrante, intensificados pelo crime ocorrido no último sábado em Chemnitz, em que um homem de nacionalidade alemã de 35 anos foi esfaqueado e acabou por morrer.  

Horst Seehofer, ministro do Interior do Governo federal, considera que esta fuga de informação sobre o mandado é “absolutamente inaceitável”.  

Em paralelo com esta investigação, a polícia abriu dez processos contra manifestantes de extrema-direita que fizeram a saudação nazi, um gesto ilegal na Alemanha, durante o primeiro dia de protestos.

Segundo o jornal The Guardian, o documento do mandado de detenção com a identidade do iraquiano suspeito circulou rapidamente em várias plataformas online, em particular através do WhatsApp entre grupos de extrema-direita, incluindo o grupo local Pro-Chemnitz.  

O documento que acabou por vir a público continha os nomes completos dos suspeitos, das vítimas, testemunhas e do juiz responsável pelo caso, bem como a morada do homem iraquiano, um dos suspeitos do homicídio. 

A publicação e divulgação do mandado de detenção veio fomentar ainda mais as preocupações em relação à polícia do estado da Saxónia, suspeita de ter ligações com o partido Alternativa para a Alemanha (AfD) e o movimento Pegida (sigla alemã para Patriotas Europeus Contra a Islamização do Ocidente). 

O sentimento de desconfiança no seio da sociedade alemã até já levou à generalização da alcunha “Pegizei”, (junção de Polizei – polícia em alemão – e Pegida) usada para identificar as autoridades alemãs na Saxónia.  

Outras críticas apontadas à polícia relacionam-se com a resposta pouco robusta perante os protestos que irromperam na cidade de Chemnitz entre domingo e segunda-feira.  
Protestos violentos

As autoridades já reconheceram que houve falta de pessoal e de meios para fazer face às manifestações, mas são agora suspeitas por parte de terem subestimado propositadamente os números presentes naquela manifestação. Desde segunda-feira que a cidade de Chemnitz contou com um reforço policial coordenado com as cidades vizinhas de Dresden e Leipzig.  

Os protestos começaram no domingo após o esfaqueamento de um cidadão alemão de 35 anos, que acabou por morrer. A briga terá envolvido dez pessoas de “várias nacionalidades”, segundo revelava na terça-feira o diário alemão Deutsche Welle. Para além da vítima mortal, mais dois homens de 33 e 38 anos, aparentemente imigrantes, ficaram feridos.

A polícia está a investigar o caso e já deteve dois homens suspeitos, um sírio de 22 anos e um iraquiano de 21 anos. No domingo, na sequência deste caso, um protesto organizado após a circulação de rumores nas redes sociais juntou quase um milhar de pessoas ligadas à extrema-direita.  

Logo no dia seguinte, foram cerca de 6.000 manifestantes, um protesto que foi reforçado por grupos xenófobos e hooligans que viajaram de várias partes do país, segundo o ministério do Interior do estado da Saxónia.

Uma contramanifestação de extrema-esquerda, com cerca de 1.500 pessoas, percorreu igualmente as ruas de Chemnitz, dando lugar a alguns confrontos entre os dois grupos opostos.  

Durante os dois dias, as imagens captadas por vídeos amadores mostram grupos de skinheads a perseguir transeuntes de aparência estrangeira. No total, 20 pessoas ficaram feridas, entre imigrantes atacados, polícias e membros do protesto de extrema-direita.

Desde 2015, a entrada de um milhão de requerentes de asilo na Alemanha durante a recente crise de refugiados tem motivado a ascensão de movimentos extremistas, que culpam o incremento de criminalidade com a chegada destes imigrantes.

Aos protestos da extrema-direita registados nos últimos dias na cidade de Chemnitz juntou-se também outro caso de perseguição e de agressão a um imigrante, que aconteceu na noite de quarta-feira. Um sírio de 20 anos foi atacado em Wisman, norte da Alemanha, por três homens que falavam alemão e que lançaram insultos xenófobos. Este caso está a ser investigado pela polícia como um crime de ódio.
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