O meu puto faz anos e eu não estou

E não posso deixar de me lembrar dos meus colegas do DN, da TSF e de outros órgãos de comunicação social que correm o risco de ficar sem emprego. Esses sim, numa situação difícil e que trocariam comigo de bom gosto. Nada como colocarmos as coisas no ponto certo e sabermos olhar numa perspetiva realista com um ângulo que permita ficar no essencial. E o essencial é sermos felizes. "Apesar de tudo eu aqui e o Lourenço lá, somos. Apesar dos pesares".



Estou no Brasil em trabalho há duas semanas e por aqui vou continuar. Adoro esta vida e não a troco por nada. Mas hoje, sábado, o meu puto tem a festa do fim de mais um ano escolar e amanhã, domingo, faz 5 anos. E eu não estou. O meu campeão, a pessoa que primeiro mudou a minha vida e que lhe deu um sentido verdadeiro e extraordinário para além do que alguma vez imaginei. Melhor só no dia em que a maravilhosa e doce Maria se juntou a nós e nos transformou numa família ainda maior e mais feliz.

Desculpem a pieguice, mas custa-me. Não poder abraçá-lo logo pela manhã e dizer-lhe que gosto mais dele do que de mim e que farei tudo o que for possível para que um dia quando me for embora ele fique bem, orgulhoso do pai e a sorrir de alegria pela memória dos grandes momentos que passámos pela vida fora. E trabalhar nestas coisas, longe de casa, também faz parte desse plano.

O Lourenço é o meu amigão, a companhia para tudo, a doçura e a inteligência em pessoa, o menino que jura ser homem mas que não dispensa a chucha e o "fofinho" e que espera sempre receber tudo tal como a mana. Seja o que for, mesmo o que não pode ser.

É a pessoa que me faz levantar da cama às oito da manhã para lhe aquecer o leitinho e vesti-lo, mesmo que esteja tão cansado que dou comigo na cozinha sem ter percebido como fui lá parar. É a minha primeira boa memória da manhã, quando depois de vermos os desenhos animados aninhados no sofá vou deixá-lo à porta e ele se despede de mim com um abraço e com um piscar de olho maroto como só ele sabe fazer. É a forma de me dizer que vai ficar bem, mesmo que só me volte muitas vezes a ver no dia seguinte à mesma hora. Se aguentar o cansaço e o sono ainda espera que eu chegue à noite para que lhe conte as histórias que nunca são iguais às da mãe mesmo que sejam as mesmas dos mesmos livros.

O Lourenço é a pessoa a quem peço para tomar conta da mãe e da irmã enquanto não estou e que recebe esse pedido com visível orgulho e satisfação. Ainda que tenha a certeza de que o angustia pensar que pode não ser capaz de cumprir essa responsabilidade. Porque ele odeia não ser capaz, não ser o primeiro e não ser o melhor. Já vai melhorando, porque já repete vezes sem conta que o mais importante é fazer o melhor e ser ele próprio, e que isso não tem preço.

Mandei-lhe a prenda por um amigo e tenho a certeza que a mãe vai ter dificuldade  em convencê-lo de que não pode andar no dia de anos vestido de Neymar, com o novo equipamento do Brasil. Sei que vai replicar logo que então quer vestir-se de Ronaldo, com o equipamento do Real Madrid ou com o casaco de Portugal  - de inverno - com o número 7, ou de Rui Patrício, com o equipamento do Sporting. São os heróis dele e nenhum foi influenciado por mim. Sempre escolheu o que quis e vai continuar a fazê-lo. Tal como eu. A diferença é que nas minhas decisões ele pesa como chumbo e nas dele eu não conto nem uma grama. Porque é uma criança. E decide sempre pelo que quer e o faz mais feliz. Sei que está à minha espera para lhe contar como foi falar com o Capitão América no Maracanã e para jogarmos à bola como se não houvesse amanhã. Com a bola nova, com as cores do Brasil.

Hoje, sábado, o meu puto, o meu campeão tem a festa do fim de mais um ano escolar e amanhã, domingo, faz 5 anos. E eu não estou. Custa-me. Mas pensando bem a ausência e a distância nunca se sobrepõem ao verdadeiro amor. E não posso deixar de me lembrar dos meus colegas do DN, da TSF e de outros órgãos de comunicação social que correm o risco de ficar sem emprego.  Esses sim, numa situação difícil e que trocariam comigo de bom gosto. Nada como colocarmos as coisas no ponto certo e sabermos olhar numa perspetiva realista com um ângulo que permita ficar no essencial. E o essencial é sermos felizes. "Apesar de tudo eu aqui e o Lourenço lá, somos. Apesar dos pesares".



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