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Segredo da Eterna Juventude

Tem um olhar sublime. Um olhar que desarma. Direto. Franco. Generoso. Sensual. Imensamente jovem. Profundamente jovem. Eternamente jovem. Perla Cristal tem nome de estrela e é uma estrela. Cintila pela carreira de sete décadas e pela energia que nos oferece em cada palavra, em cada pestanejar. Espanha é um dos países com maior esperança média de vida, em todo o Mundo. Perla já fintou a média e entende-se porquê.

“Confesso que vivi…. e bem!” Cita Pablo Neruda com um brilho de mistério e nostalgia nos olhos. Sorri no final, a fazer covinhas ao lado dos lábios, artisticamente pintados de rosa. Um sorriso sedutor, daqueles que as atrizes de Hollywood faziam, nos musicais dos anos 50, depois de conquistarem o galã da película.

Perla Cristal ainda deixa suspiros no ar, apesar dos 85 anos que gozou de vida. “Não quero ir a esse café, está cheio de velhos”, diz-nos antes da entrevista. Olho lá para dentro, nenhum deles terá mais de 70. Esboço um sorriso e avançamos para outro. Entra, cumprimenta toda a gente e pede “una caña”. O copo de cerveja chega tão fresco como o dia, sem sol, em San Lorenzo d´El Escorial. Perla não teme o frio. Tudo serve para sentir-se viva e quanto mais viva, mais jovem, acrescenta.

Participou em 75 filmes, 5 deles galardoados pela Academia de Hollywood. Contracenou com todos os grandes atores em Espanha e muitos outros nos EUA. Em Portugal, esteve um ano, a convite, a fazer uma revista. Foi a primeira mulher a mostrar uma mama, desnuda, num espetáculo na Espanha de Franco. Fez o mesmo na Lisboa de Salazar, com a irreverência e ousadia que mantém na voz, nos gestos rápidos, nas rugas perfeitas desenhadas pela experiência do tempo e de uma vida que teima não parar sem, no entanto, lhe travar o passo.

“O meu segredo?”, pergunta-me, “se o tivesse… vendia-o. Sofri muito. Fiquei viúva aos 47, com uma filha de 5 anos nos braços. A morte do meu marido, da minha mãe, no entanto, nunca me fizeram desistir. Cuido de mim. A primeira coisa que faço pela manhã é tomar um duche e maquilhar-me. À noite, desmaquilho-me e ponho creme nos olhos, no rosto, no pescoço, nos braços, nas pernas, no corpo todo…”. Faz mais um olhar maroto. “Não entendo como há pessoas que aos 40 anos deixam de se arranjar, de gostar delas, de cuidar-se. Não entendo. E depois, há a cabeça! Tudo está na cabeça. Esta tem de

funcionar”, faz sinais com os dedos juntos às têmporas, como se estivesse a apertar parafusos. “Pode doer-me uma perna, um braço, as costas. Tudo isso não tem importância, mas se a cabeça não funcionar… tudo vai atrás.” Devora livros. Discute política nacional e internacional melhor do que qualquer comentador televisivo. É uma força da natureza. Uma irresistível força que nunca vai ser velha. Nunca, porque nunca se sentirá como tal. Perla não sabe. Perla não sabe, mas tem o segredo. Ela descobriu o segredo da eterna juventude.

Espanha é um país de centenários. A esperança média de vida é de quase 83 anos, de acordo com a Organização Mundial de Saúde. Ángel Dúrantez, especialista em Medicina Preventiva, Diretor de um dos maiores centros médicos antienvelhecimento de Madrid, explica-nos que a atitude é um dos pilares fundamentais para uma vida saudável e duradoura. A longevidade só se torna apetecível se for vivida com qualidade e os espanhóis, por inúmeras razões, têm conseguido enganar a morte, tal como os japoneses, e bem. O clima, a dieta mediterrânica, o sistema nacional de saúde e, acima de tudo, a atitude, que os leva para a rua a qualquer hora, faça sol ou chova copiosamente, doa a perna ou a cabeça, contribuem para que a eterna juventude não seja um segredo, mas apenas um aperitivo que se bebe com uma “caña”, um pão tostado com tomate e conversas ruidosas e extrovertidas nas “terrazas” de qualquer esquina.

Despeço-me de Perla Cristal. Volto a mergulhar naqueles olhos enormes, castanhos, pintados de forma minuciosa, como o olhar de um gato. Abraça-me. Tenho a idade da filha. Prometemos um reencontro quando completar 90 anos. Alguns metros depois, olho para trás… acena-me com o copo de cerveja na mão e volta a baixar o olhar felino para a mesa, onde repousa um jornal.

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