Salvador Sobral

Qualquer coração devia ser compatível com este rapaz.

A conferência de imprensa do Hospital de Santa Cruz em que se deu a conhecer ao país a situação de Salvador Sobral, depois de receber o transplante de coração, teve um momento raro de intensidade e beleza. Foi quando o cirurgião que o operou respondeu a uma pergunta sobre como é que Salvador tinha recebido a notícia de que havia finalmente um coração para ele. Miguel Abecassis contou que Salvador Sobral só lhe disse três coisas: “perguntou-me se eu estava em forma; depois se podíamos pôr música, clássica; e finalmente, o que me sensibilizou muito, desejou-me sorte”.

Imaginamos facilmente Salvador Sobral a ter essa conversa com o médico, tantas têm sido as demonstrações públicas de coragem, inteligência e sensibilidade que tem dado. Também se percebeu que Miguel Abecassis só a custo conseguiu conter a emoção, num momento ou noutro, ao falar de Salvador. Talvez o momento verdadeiramente a reter desta conferência de imprensa tenha sido quando o cirurgião respondeu sobre as preocupações destas equipas médicas que tão bem trabalham na área dos transplantes, em Portugal. Miguel Abecassis disse que o exemplo de Salvador Sobral é “típico de um gesto de generosidade e amor muito grande “ e que “nos tempos que vivemos, isso provavelmente deve-nos mais fazer refletir do que fazer perguntas acerca de muitas coisas”.

Não ficou totalmente claro o alcance das palavras de Miguel Abecassis, porque também ninguém lhe pediu que esclarecesse o que queria dizer. Mas o médico tem razão. Hoje pergunta-se muito e reflete-se pouco. As respostas que todos queríamos foram dadas. Salvador Sobral recebeu um coração novo, a operação correu bem, o músico está a recuperar, está animado e tem grandes possibilidades de voltar à sua vida normal. Mas o assunto que Miguel Abecassis deixou para reflexão, na conversa com os jornalistas, terá sido outro: depois de três meses internado, no fio da navalha, Salvador Sobral perguntou ao médico que tinha a sua vida nas mãos se estava em forma e desejou-lhe sorte. Põe-te bem depressa, Salvador. O país precisa de ti. E não é só para te ouvir cantar o “Amar Pelos Dois”. É pelo espírito e pela coragem. Pelo que cantas e pelo que dizes.

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