Costa a Alegre. “Não me receie como ‘mata-toureiros’”

por RTP
Rafael Marchante - Reuters

António Costa respondeu à carta aberta que lhe foi dirigida por Manuel Alegre, em que este se insurgia contra o "fundamentalismo do politicamente correcto" e pedia ao primeiro-ministro que não discriminasse a tauromaquia na descida do IVA para os espetáculos. Costa responde que defende a liberdade de cada um, mas que Alegre não precisa de o recear como um “mata-toureiros”.

“Não me receie como “mata-toureiros, qual versão contemporânea de ‘mata-frades’”, escreve Costa na carta aberta dirigida a Manuel Alegre, escrita no jornal Público.

“Prefiro conceder a cada município a liberdade de permitir ou não a realização de touradas no seu território à sua pura e simples proibição legal e considero extemporâneo um referendo sobre a matéria”, argumentou o primeiro-ministro.

Numa analogia com o consumo do sal ou do açúcar, António Costa escreve que o Estado não o proíbe, "mas deve informar os cidadãos dos riscos que o seu consumo comporta para a saúde e tem o dever de promover a educação para uma alimentação saudável. E quando o faz não atenta contra a liberdade de escolha alimentar de cada um".

Apesar de admitir que o choca que "o serviço público de televisão transmita touradas", António Costa reclama a sua "própria liberdade" e defende a "liberdade de quem milita contra a permissão das touradas".

"Como homem da Liberdade (Manuel Alegre) tem também de respeitar os cidadãos que, como eu, rejeitam a tourada como manifestação pública de uma cultura de violência ou de desfrute do sofrimento animal", diz na carta publicada no Público.

O primeiro-ministro lembra que a fiscalidade pode ser promotora de políticas e indutora de comportamentos, não sendo, por isso, neutra.

“Será ilegítimo distinguir entre diferentes géneros de espetáculos? Não. Seja por razões económicas, mesmo que muito discutíveis, como se pretende ao não abranger os "festivais". Seja por opções civilizacionais como já acontece com a pornografia”, garante.

“A causa da promoção do bem-estar animal é absolutamente legítima e tem tido, felizmente, progressiva expressão legal, a mais relevante das quais a recente alteração do Código Civil, que deixou de considerar os animais como "coisas". Ou a limitação à utilização de animais em espetáculos de circo”, lembra o primeiro-ministro.

Na carta, o também secretário-geral do PS explica que "por respeito pelo pluralismo e amor à liberdade", não subscreve a frase habitualmente atribuída a Mahatma Ghandi que "o grau de civilização de determinada sociedade pode ser medido pela forma como tratam os animais".

"O diálogo de civilizações exige respeito mútuo, tolerância e liberdade", afirma António Costa, dizendo a Manuel Alegre.

A terminar a carta, o primeiro-ministro afirma: "bem sei que o novo politicamente correto é ser politicamente 'incorreto'... mas então prefiro manter a tradição e defender o que acho certo, no respeito pela liberdade dos outros defenderem e praticarem o contrário".
Alegre em defesa das touradas
O histórico socialista Manuel Alegre escreveu na passada semana uma carta aberta, publicada também no jornal Público, a António Costa em defesa da tourada, pedindo-lhe que "intervenha a favor de valores essenciais do PS: o pluralismo, a tolerância, o respeito pela opinião do outro" e que interceda pela descida de 6% do IVA para todos os espetáculos sem discriminar a tauromaquia.

Esta questão foi suscitada pela ministra da Cultura, Graça Fonseca, que admitiu na terça-feira, em sede de especialidade do Orçamento do Estado para 2019, um eventual alargamento dos espetáculos abrangidos pela redução do IVA de 13% para 6%, mas excluiu a tauromaquia por ser uma questão de civilização. Antes da apresentação do Orçamento do Estado, o Bloco de Esquerda tinha apresentado um acordo com os socialistas neste mesmo sentido.

Na sua carta, Manuel Alegre disse apoiar esta solução governativa, mas coloca dúvidas ao peso do deputado do partido Pessoas Animais Natureza (PAN). Confessa que por vezes sente a sua "liberdade pessoal ameaçada".

"Não por causa do que se passa no mundo. Mas porque o diabo se esconde nos detalhes. Esta´ no fundamentalismo do politicamente correto, na tentação de interferir nos gostos e comportamentos das pessoas, no protagonismo de alguns deputados e governantes que ninguém mandatou para reordenarem ou desordenarem a nossa civilização", afirmou o histórico socialista.
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