Entrevista ao PR. Está a ser ponderado um "Estado de Emergência diferente, muito limitado"

por RTP
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Em entrevista à RTP no dia em que reuniu com o primeiro-ministro e os partidos, Marcelo Rebelo de Sousa admite que está a ser ponderado um novo Estado de Emergência “diferente no sentido de muito limitado, de efeitos sobretudo preventivos e não muito extenso”.

Questionado sobre se Portugal está em emergência nacional, o Presidente da República responde que “verdadeiramente nunca deixámos de estar”, ao recordar a evolução da pandemia no país desde que foi confirmado o primeiro caso de infeção por Covid-19.

António Costa já anunciou que propõe um Estado de Emergência preventivo para evitar dúvidas jurídicas e Marcelo Rebelo de Sousa defende que a questão que se impõe é se é “possível e desejável voltar a um Estado de Emergência de março, abril e maio. É voltar a isto ou uma coisa diferente?”.

O Presidente da República afirma, por isso, que o que está a ser ponderado é um “Estado de Emergência diferente no sentido de muito limitado, de efeitos sobretudo preventivos e não muito extenso apontando para o confinamento total ou quase total”, acrescentando que esta é também "a inclinação" do próprio Governo e dos partidos que ouviu durante esta segunda-feira. “Se perguntar agora se as pessoas querem um confinamento vasto, a resposta é: não”, disse Marcelo.
Marcelo Rebelo de Sousa acrescentou que "é uma maioria que está nos dois terços ou acima dos dois terços" em defesa desse "Estado de Emergência limitado", e observou: "Se isto não é uma maioria clara - uma maioria de revisão constitucional - não sei o que é uma maioria clara".
Economia "não aguenta" um novo confinamento
Questionado sobre se o panorama atual não justifica um confinamento mais rígido, Marcelo responde que “neste momento, há condições sanitárias para estas medidas permitirem retirar conclusões sobre a suficiência dessas medidas” e sublinha que a economia "não aguenta" um novo confinamento.

O clima social aconselha que seja isto que deva ser adotado e a economia não aguenta um confinamento que fosse avançado agora e que tivesse de permanecer duradouramente no tempo”, justifica o Presidente. “Era uma precipitação e uma impossibilidade social e política adotar um confinamento geral”, conclui.

Marcelo acredita que “a capacidade global do SNS, mais o contributo do setor privado e cooperativo, permite fazer frente àquilo que é a evolução previsível se as medidas forem assumidas pelos portugueses”.

O Presidente alerta que se forem seguidos os “modelos puramente matemáticos, temos a possibilidade de duplicação do número de infetados a 15 dias. O que significaria que perto do final de novembro, estaremos com oito mil, nove mil, dez mil infetados”.

Se se verificar esta progressão matemática, “nós teremos uma pressão sobre internamentos e cuidados intensivos que é uma pressão muito séria”, afirma Marcelo, admitindo ainda um “aumento significativo” de vítimas mortais nos próximos dias.

Marcelo explica, por isso, que este novo Estado de Emergência está a ser ponderado para, em primeiro lugar, “possibilitar a ampliação do rastreio” e poder utilizar quem não é profissional em saúde, como as Forças Armadas e funcionários públicos, para fazerem perguntas de rastreio de forma a identificar cadeias de transmissão. Em segundo lugar, para resolver um problema jurídico suscitado pela medição da temperatura no acesso aos serviços públicos e a espetáculos. “Era preciso cobertura jurídica”, explica Marcelo. Em terceiro lugar, para criar condições acrescidas para a utilização de meios do setor privado e do setor social e cooperativo. E, por fim, para criar condições jurídicas para limitar a liberdade de circulação.

Sobre a terceira medida e questionado sobre a razão pela qual não foi tomada mais cedo, o Presidente da República responde que o setor social “nunca deixou de colaborar”. “Mesmo sem a assinatura de acordos explícitos foi recebendo doentes para desbloquear a situação”, explica Marcelo. Em relação à não assinatura de um acordo global, Marcelo justifica que se “pensou que a segunda vaga fosse entre o outono e inverno, não entre o verão e outono”.
“Houve erros e eu sou o maior responsável por eles

Questionado sobre se houve planeamento suficiente durante o verão, Marcelo responde: “Quem é que pode planear quando os problemas surgiam todos os dias? Planeava-se, mas no dia seguinte já estava ultrapassado”.

Marcelo admitiu “erros, improvisos e atrasos” na gestão da pandemia. “Apesar do esforço de agir com antecipação, houve. Não foi possível” evitar, disse o Presidente da República.

“A pandemia nunca parou. Não deu para preparar a segunda fase”, acrescentou o Presidente da República. “Os problemas levantavam-se todos os dias. Quando parecia que a fase pior da pandemia tinha passado, começaram a surgir os problemas dos lares”.

Quando se falava do milagre português, Marcelo diz agora que “não houve milagre nenhum. O que houve foi a resistência dos portugueses, dos profissionais de saúde, dos autarcas”.

“Todos os dias surgiam problemas novos”, relembra Marcelo, sublinhando que os profissionais de saúde foram “apagando o fogo”.

“Houve erros e eu sou o maior responsável por eles. O Presidente da República é o maior responsável pelos erros”, admite Marcelo. “Eu estou a assumir a responsabilidade suprema por tudo isto”, reitera.
“Convinha que não se juntassem três crises”
Questionado sobre o risco de uma crise política, Marcelo lembra que “temos uma pandemia que está a conhecer um agravamento, temos uma situação económica e social que só se agravará em função da duração da pandemia, vamos juntar uma crise política a isto?”.

"Convinha que não se juntassem três crises. Três crises tornam a capacidade do Governo de responder à pandemia pior, a capacidade de responder à crise económica e social pior. Dirão os opositores: ótimo, é da maneira que [o Governo] cai mais rapidamente. Mas não cai. Não cai porque o PR não tem o poder de dissolução do Parlamento nos últimos seis meses do seu mandato até à eleição de novo PR, porque há presidência da UE a seguir, e porque não é indiferente governar com duodécimos de 2020 ou com o dinheiro de 2021”, declarou Marcelo.

“Mas pode cair a seguir?”, questiona o jornalista. Na resposta, Marcelo admite um possível futuro negro para Costa. “Tenho visto com atenção o que acontece lá fora, e conta-se por um ou dois dedos da mão os [Governos] que foram reeleitos em contexto de pandemia. Tem sido Governos a perder eleições e Presidentes a perder eleições, mas quem é eleito é para ser punido perante o que corre mal, não é só para ser louvado“, diz o Presidente da República.

“Dizer que há cheiro a crise, isso há desde que surgiu a pandemia e a crise económica e social, o que é normal é que caiam a seguir”, acrescentou Marcelo, dando o exemplo de Churchill, “que ganhou a guerra e foi corrido a seguir”.

Veja ou reveja aqui a entrevista ao Presidente da República na íntegra.
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