Hospital S. João encerra serviço farmacêutico noturno por falta de pessoal

por RTP
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O hospital de São João, no Porto, tem de encerrar os serviços farmacêuticos durante a noite por falta de pessoal, deixando também de poder dar apoio noturno a grande parte da região. A bastonária da Ordem dos Farmacêuticos alerta que a segurança dos doentes está posta em causa nos hospitais por falta de profissionais e diz que só lhes falta “lavar o chão”.

A denúncia foi feita pela Ordem dos Farmacêuticos e comunicada numa carta enviada à ministra da Saúde na qual a bastonária alerta que a segurança dos doentes está em causa em muitos hospitais públicos, avisando para a dificuldade de garantir a segurança no circuito do medicamento 24 horas por dia.

“Não estamos na iminência de fechar nenhum serviço, mas já começámos a diminuir a atividade. Vou-lhe dar um exemplo. A norte do país, já só tínhamos, em junho quando escrevi ao senhor ministro, um hospital – do S.João do Porto – que dava apoio a todo o Norte do país em prevenção entre as 20h00 e as 8h00 da manhã. A partir deste momento, vamos deixar de ter”, afirmou a bastonária da Ordem dos Farmacêuticos, Ana Paula Martins.

Na carta agora enviada à nova ministra da Saúde, a que a agência Lusa teve acesso, em causa está a falta de recursos humanos, à semelhança do que já tinha acontecido com os hospitais de Matosinhos e Gaia.

O diretor dos serviços farmacêuticos do São João, Paulo Carinha, também já apontou para um "aumento de incidência e situações de potencial erro", tendo inclusivamente remetido cartas ao primeiro-ministro e ao Presidente da República sobre o assunto.

Numa dessas cartas, a que a agência Lusa teve acesso, Paulo Carinha afirma que "o risco de ocorrência de erros graves", por cansaço, excesso de trabalho e acumulação de tarefas, é "demasiado grave para poder ser ignorado".

Num documento remetido à Presidência da República em setembro passado, o responsável relatou mesmo que só em agosto houve três erros com medicação e pelo menos um deles foi grave, com dano para o doente, que teve de ser internado por intoxicação.

Paulo Carinha alude mesmo a uma "situação dramática" vivida no seu serviço, que agora tem de encerrar durante o período noturno.

No ofício enviado à administração do hospital no mês passado, o diretor dos serviços farmacêuticos do São João refere que é imprescindível a entrada imediata de oito farmacêuticos e quatro técnicos superiores de diagnóstico e terapêutica.

A falta de profissionais nos serviços farmacêuticos dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde está a fazer com que a atividade tenha de ser reduzida nalgumas unidades, de forma a continuarem a garantir a segurança nos serviços prestados, como a preparação de medicamentos, diz a bastonária da Ordem.

Segundo Ana Paula Martins, também no hospital de São João, como "em outros grandes centros hospitalares", teve de haver "redução do número de horas de preparação de citotóxicos" (para doentes oncológicos) e de nutrição parentérica (endovenosa).

"Não estamos neste momento em condições, em algumas zonas do país, de assegurar durante 24 horas por dia a segurança no circuito do medicamento", lamenta a bastonária, referindo que estão em falta cerca de 150 farmacêuticos e mais outros tantos técnicos de diagnóstico e terapêutica para assegurar o trabalho das farmácias hospitalares.

Ana Paula Martins diz que os serviços estão a ser forçados a reduzir o número de horas em que estão a garantir as necessidades dos hospitais, para poderem fazer o trabalho em segurança.

Na carta à ministra Marta Temido, a Ordem frisa que em vários hospitais não há farmacêuticos suficientes para a sua função, acrescentando que ainda têm de fazer trabalho de outros profissionais, que são também escassos.
“Só nos falta lavar o chão”
“Nós já não conseguimos garantir a segurança dos doentes”. A afirmação é da bastonária dos Farmacêuticos, que diz mesmo que nem sequer conseguem substituir as pessoas em baixa de parto ou de doença.

“Só nos falta lavar o chão [das farmácias]. Se for preciso, fá-lo-emos, mas gostava que não fosse preciso”, desabafou.
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A denúncia consta da carta enviada a Marta Temido, onde a bastonária expressa preocupação com a possível falta de segurança, apesar de ressalvar que não tem denúncias de casos concretos com doentes específicos.

"Temos todas as razões para acreditar que os farmacêuticos, ao avisarem que a situação está a degradar-se totalmente, estão a querer chamar a atenção para o que pode acontecer e que querem moralmente não se sentir responsáveis. Judicialmente podem até ter responsabilidade, mas moralmente, para um profissional de saúde, isso tem muita importância", afirma a representante dos farmacêuticos.

Ana Paula Martins questiona a ministra sobre em quem cairá a responsabilidade se houver um problema grave com a troca de medicamentos como já aconteceu no passado.

"Não vamos assumir responsabilidades que não são nossas", avisa.

Já em junho do ano passado, a bastonária tinha escrito uma carta ao anterior ministro Adalberto Campos Fernandes, alertando para a necessidade de contratar mais profissionais para as farmácias hospitalares.

Aquando da passagem, no verão passado, para as 35 horas de trabalho semanais, a Ordem dos Farmacêuticos promoveu um estudo em que concluiu que seriam precisos mais cerca de 150 farmacêuticos e quase o mesmo número de técnicos de diagnóstico e terapêutica para cumprir as necessidades mínimas dos hospitais públicos.

"Desde junho até agora pouco ou nada aconteceu. Terão entrado dois a quatro farmacêuticos dos que estavam planeados, mas está muito longe da necessidade", indica à Lusa.

A bastonária avisa que há hospitais a reduzir horários dos serviços farmacêuticos e com dificuldades na preparação de medicação para doentes oncológicos (citotóxicos) e de nutrição parentérica (nutrição por via endovenosa).

Fica também comprometida a realização de alguns ensaios clínicos, nos quais são necessários farmacêuticos, "retirando competitividade aos hospitais".

"Queremos fazer mais, somos capazes de fazer mais, mas não nos deixam. Depois, quando saímos e vamos para o setor privado, as nossas competências são aproveitadas. Começamos já a ver projetos inovadores no setor privado que só eram habituais no SNS [Serviço Nacional de Saúde]", afirma Ana Paula Martins na carta.

A Ordem dos Farmacêuticos lembra também que a carreira destes profissionais não tem ainda a sua implementação terminada.

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