Perigos no Prato. Aplicações para telemóveis já permitem interpretar rótulos

por Sandra Salvado - RTP
Imagem de arquivo Reuters

Uma boa alimentação começa na escolha do que comemos. Essa escolha tem consequências diretas na saúde de cada um de nós mas exige tempo. Com o objetivo de facilitar a vida ao consumidor há já no mercado diversas aplicações para telemóveis que permitem identificar quais os aditivos alimentares seguros, suspeitos ou perigosos para a saúde. O tema faz parte de uma investigação do programa Linha da Frente "Perigos no Prato".

Esta é uma investigação Linha da Frente que pode ver na íntegra aqui.

Os dados são oficiais. As doenças que mais afetam os portugueses estão direta ou indiretamente relacionadas com uma alimentação inadequada.

Morrem cerca de 31 mil pessoas por doenças cardiovasculares em Portugal, sendo esta a principal causa de morte no país. A diabetes afeta mais de 13 por cento da população portuguesa. E seis em cada dez portugueses têm excesso de peso, ou seja, 5,9 milhões.

E o que estamos nós a comprar? O mais barato? O que está mais perto? O que é mais saudável ou o que nos faz mal?

Tem ideia de quantos E’s comemos? O mesmo é dizer quantos aditivos alimentares ingerimos por dia?

Corantes, conservantes, emulsionantes, estabilizadores, espessantes ou intensificadores de sabor são apenas algumas das categorias dos mais de trezentos aditivos alimentares, autorizados em Portugal e identificados pela letra E.
Aditivos com efeitos negativos nas crianças
Analisámos dezenas de rótulos à lupa e descobrimos que há aditivos que podem causar efeitos negativos na atividade e na atenção das crianças.

São vários os produtos onde constam estes aditivos: gelatinas, gelados, iogurtes, bolos, bolachas, gomas , licores ou refrigerantes.

A lista de corantes alimentares acerca dos quais deve ser incluída informação adicional nos rótulos faz parte do regulamento 1333 de 2008. São eles o E110; E104; E122; E129; E102 e o E124.


Aditivos que podem causar reações alérgicas, como urticária, rinites, asma, alterações da visão, hiperatividade ou problemas respiratórios.

Existem várias aplicações disponíveis que permitem aos consumidores identificar os aditivos nos alimentos que consomem, entre as quais a Chemical Maze, Food Additives ou Eat Informed.


“Como cidadão comum tenho uma aplicação no telemóvel e como tenho filhos quando compro um produto vou ver imediatamente qual é o aditivo e consigo saber as implicações à luz do conhecimento atual e devo-lhe dizer também, enquanto cidadão, que há muitos produtos que deixaram de estar em minha casa”, salientou à reportagem do Linha da Frente o diretor da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura em Portugal, Francisco Sarmento.


À medida que surgem novos dados científicos são feitas avaliações para rever a segurança, retirar ou corrigir os limites máximos permitidos nos aditivos. Uma responsabilidade da Autoridade Europeia para a Segurança Alimentar.

“Quando se utilizam corantes nos alimentos ou intensificadores de sabores muitas das vezes é para dar ideia do que lá não está ou a pobreza dos ingredientes que lá estão. Não faz sentido adicionar um corante amarelo no creme pasteleiro para dar a ideia que estão lá ovos, quando não existe uma grama de ovos ou estarmos a adicionar corantes laranjas a rissóis de camarão para dar a ideia que existe lá mais camarão. O consumidor efetivamente é enganado”, disse à reportagem do Linha da Frente Nuno Lima Dias, engenheiro químico na Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor.

Há no mercado diversos aditivos alimentares que não deixam de ser motivo de dúvida e preocupação, causando alguma polémica, como é o caso do corante cor carmim, extraído da cochonilha. Um inseto, parasita de catos, com habitat natural na América do Sul, América Central, Sul da Europa e na India.

Apesar de ser classificado como corante natural, o E120, também designado nos rótulos por carminas, pode provocar reações alérgicas e choque anafilático, ou seja, comichão, urticária, inchaço nos lábios, na língua e nas pálpebras ou dores abdominais intensas.

São necessários cerca de 70 mil insetos esmagados e fervidos para produzir apenas quatrocentos e cinquenta gramas deste corante. 

O carmim é amplamente utilizado na indústria alimentar, nomeadamente, em carnes processadas, conservas de fruta ou iogurtes.
10,1 por cento em segurança alimentar
Está provado que existe uma relação direta entre os hábitos alimentares inadequados e a saúde da população.

O estado nutricional dos portugueses é disso reflexo. Os resultados do último Inquérito Alimentar Nacional, de 2016, revelam que 10,1 por cento da população ainda se encontrará em situação de insegurança alimentar. 

Alexandra Bento, Bastonária da Ordem dos Nutricionistas, diz que "não temos o cenário alimentar que gostávamos de ter nem temos o sistema alimentar que necessitamos de ter", caso contrário "não estávamos a padecer das doenças que estamos a padecer. Muitos de nós somos hipertensos, desde logo as crianças com peso a mais, doença cardiovascular, determinados tipos de cancro muito devido àquilo que comemos ou que não comemos".

Portugal está integrado num lote de países, a par da quase totalidade dos estados europeus, do Canadá e do Brasil, onde o consumo de carne chega a ser dez vezes superior, oscilando entre os 50 e os 100 quilos anuais.

Os dados constam de uma análise realizada pelo centro de investigação da Universidade de Oxford.
Sulfitos podem provocar reações alérgicas
O género alimentício onde se regista o maior número de incumprimentos continua a ser o grupo das carnes.

Os problemas são os mesmos do passado: sulfitos proibidos em carne picada, temperaturas altas e elevado número de bactérias, algumas indesejáveis.

Os aditivos proibidos que servem para manter a carne vermelha com aspeto fresco são há seis anos denunciados pela Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor, que voltou aos talhos e supermercados.

“Os sulfitos podem provocar reações alérgicas a pessoas e essas reações podem ir desde dores de cabeça, náuseas, problemas digestivos, cutâneos e respiratórios. É muito frequente as pessoas que fazem alergias aos sulfitos desenvolverem asma. Mas há efetivamente produtos onde os sulfitos estão autorizados mas é obrigatório que seja indicado que contém sulfitos”, refere Nuno Lima Dias, engenheiro químico na Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor.



Em 2050, seremos 9,5 mil milhões, a maior parte a viver em cidades.

Os cálculos da ONU indicam que será preciso aumentar a produção alimentar em 60 por cento.

Um número que pesa no Planeta, onde a área agrícola está a diminuir e os solos correm o risco de ficar esgotados por uma agricultura intensiva.


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