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Tancos: Figueiredo Lopes admite possível quebra de confiança nas instituições

por RTP
Fotografia: Nacho Doce - Reuters

Em entrevista à Agência Lusa, o antigo ministro da Defesa considerou que o furto de material de guerra em Tancos pode gerar uma quebra de confiança nas instituições, mas considera que é prematuro atribuir responsabilidades, uma vez que ainda decorrem as investigações. O ex-ministro social-democrata rejeitou ainda o regresso ao serviço militar obrigatório e sublinhou a importância de uma maior cooperação e investimento em Defesa entre os países da União Europeia.

António Figueiredo Lopes admitiu esta segunda-feira que o roubo de material em Tancos poderá significar uma quebra de confiança nas instituições centrais da Defesa. Em entrevista à agência Lusa esta segunda-feira, o antigo ministro com a pasta da Defesa admitiu que casos como o de Tancos, que envolvem o furto de armas podem gerar um sentimento de “insegurança” entre os portugueses.

"Como infraestrutura crítica, uma das consequências de qualquer violência sobre essas infraestruturas, neste caso o furto de armas, gera normalmente um sentimento de insegurança e pode gerar alguma quebra de confiança nas instituições que detém essa responsabilidade", reconheceu.

No passado dia 29 de junho, o Exército anunciava que os Paióis de Tancos, em Santarém, tinham sido alvo furto de granadas de mão, anticarro e explosivos, entre outros materiais.

Na última terça-feira, a Procuradoria-Geral da República anunciou que abriu um inquérito ao caso por suspeitas da prática dos crimes de associação criminosa, tráfico de armas internacional e terrorismo internacional.

Paralelamente, no Exército, decorrem averiguações internas. Azeredo Lopes, ministro da Defesa Nacional, afirmou desconhecer problemas de insegurança naquela base militar e determinou uma inspeção extraordinária às condições de segurança dos paióis.

Para o antigo o ministro da Defesa, que ocupou o cargo em 1995, tendo sido antes Secretário de Estado da Defesa, o furto de material de guerra na base de Tancos é "uma ocorrência muito grave que demonstra uma vulnerabilidade numa infraestrutura crítica militar".

No entanto, Figueiredo Lopes considera que o incidente ocorrido no mês passado “não abala nem pode abalar a confiança que os portugueses têm na instituição militar”, conduzida por “homens e mulheres que se pautam por valores e princípios éticos que colocam o princípio da abnegação e do empenhamento pessoal como regra da sua conduta”, sublinhou.

O ex-ministro salientou ainda que o Exército tem participado “de uma maneira muito generosa e eficaz em missões de serviço público como se viu agora nos incêndios de Pedrógão".
“Tiro ao alvo”
A questão da confiança dos portugueses nas Forças Armadas é crucial para o ex-ministro, que defendeu que o tratamento do problema colocado pelo furto de Tancos "tem de ser feito com a maior transparência, porque a transparência é uma condição fundamental para a confiança".

O ex-governante recusou juntar-se aos que já pediram a demissão do ministro da Defesa Nacional, Azeredo Lopes, e do Chefe do Estado-Maior do Exército, general Rovisco Duarte, considerando que é prematuro qualquer espécie de "tiro ao alvo".

“Tudo aquilo que se possa hoje falar sobre a assunção de responsabilidades é prematuro porque os factos não estão averiguados e todo o cenário envolvente está ainda por esclarecer. Obviamente que há responsabilidades e a vários níveis, há responsabilidades políticas e há responsabilidades operacionais, mas não adiantaria de nada se neste momento de uma maneira precipitada começássemos a fazer um pouco o tiro ao alvo", declarou o antigo responsável.

Figueiredo Lopes disse ainda concordar "plenamente" com o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, quando diz que é preciso “avaliar e desenvolver exaustivamente os factos, retirar responsabilidades e as devidas consequências doa a quem doer".

O ex-ministro da Defesa, professor universitário, antigo deputado na Assembleia da República e no Parlamento Europeu, atual presidente da Associação Eurodefense Portugal, assinalou contudo que furtos de armas em instalações militares "acontecem com alguma frequência noutros países”, muitas vezes que até têm uma melhor preparação para situações semelhantes.

"Basta pensar no que aconteceu em França em pleno cenário de ataques terroristas em que houve também um furto num paiol deste tipo e foram desviadas armas e mais tarde se veio a reconhecer que algumas delas foram parar às mãos de terroristas", lembrou.

Para Figueiredo Lopes, "estas coisas acontecem, o que é fundamental é saber encará-las como uma anomalia, que sejam devidamente corrigidas e que não se abale dessa maneira aquilo que é a essência e o fundamento principal da existência de Forças Armadas ao serviço de portugueses".
“Regresso ao passado”
Sobre o eventual regresso do Serviço Militar Obrigatório (SMO), o antigo ministro refere que é uma questão que “muito dificilmente se poderá colocar”, mas que ainda assim deve ser debatido. Figueiredo Lopes recusa no entanto “um regresso ao passado”.

“A sociedade evoluiu, estamos hoje noutro tempo e noutra circunstância”, refere o antigo responsável, pelo que o caminho poderá ser “envolver os jovens num ideal de segurança e defesa do seu país” sem que seja necessário incorporá-los nas fileiras do Exército, passando por exemplo pelo desenvolvimento do conceito de “Dia da Defesa Nacional”.

Na visão de Figueiredo Lopes, estas e outras medidas são necessárias porque a sociedade tem na atualidade “uma ideia muito ténue das necessidades da Defesa”.

Para Figueiredo Lopes, "entre o modelo limite que é o regresso ao SMO e os outros, o que é importante é que haja uma tomada de consciência mais equilibrada para as necessidades e compromissos de cada um para a defesa do seu país".
Face às dificuldades dos ramos no recrutamento, Figueiredo Lopes considerou que é um domínio "em que haverá algumas questões para fazer, nomeadamente na motivação e na criação de algumas compensações".
Responsabilidades são dos Estados-membros
Na mesma entrevista à agência Lusa, António Figueiredo Lopes defendeu que a defesa e segurança da Europa não passam pela "construção de um exército europeu", considerando que "a responsabilidade para a defesa continua a permanecer nos Estados-membros".

Face à criação de um fundo europeu de Defesa, "os Estados não têm nenhuma desculpa hoje para não olharem para esses desafios, para não os considerarem como generosas oportunidades em conjunto com instituições europeias e Estados membros", sustentou.

Os atentados terroristas no espaço europeu geraram sentimentos de insegurança e a uma perceção maior de que a segurança e a defesa estão no topo das prioridades, considerou, sublinhando que no "Eurobarómetro" mais recente "mais de 80 por cento dos cidadãos disseram que a prioridade da Europa neste momento é a segurança e a defesa dos cidadãos".

"Isto significa que, em consequência, os responsáveis políticos nacionais e europeus não têm outro caminho que não seja o de iniciarem um processo de revisão e de revitalização de toda a estrutura e arquitetura de segurança e defesa que fomos construindo ao longo dos anos", disse.

O ex-ministro considerou que o debate em curso na União Europeia sobre a Estratégia Global da UE "conduz ao sentimento de partilha de responsabilidades entre os Estados-membros", até porque "nenhum Estado por si só está em condições de resolver os problemas de segurança", sublinhou.

A criação do Fundo Europeu de Defesa e a sua possível aprovação definitiva "prevê um trabalho em dois sentidos: por um lado a Comissão Europeia dispõe-se a investir muitos milhões na investigação e tecnologias de Defesa.

"O estímulo da Comissão vai no sentido de criar projetos comuns, devem servir a mais do que um país. Em termos práticos é preciso estarmos muito conscientes do que se está a passar (...) o desafio não é apenas no quadro da segurança, é no quadro da economia e da investigação tecnológica", disse.
Reforçar investimento na Defesa
"No momento sabemos que a Comissão se dispõe a aplicar 90 milhões de euros até 2020 nos primeiros projetos que forem estabelecidos, a seguir, 500 milhões de euros por ano em projetos de investigação comuns, depois está disponível para apoiar financeiramente em regime de cofinanciamento a parte do desenvolvimento e da aquisição dos equipamentos", representando “oportunidades fabulosas para as indústrias nacionais”, destacou.

Outro indicador que aponta para a necessidade do aumento dos orçamentos e dos investimentos na Defesa é a saída do Reino Unido da União Europeia, já que se trata da "maior potência militar europeia", o país que "gasta mais dinheiro do seu orçamento na Defesa", colocando assim os Estados-membros "perante a necessidade de refletirem sobre como podem colmatar esta saída".

Numa altura em que os Estados europeus membros da NATO são pressionados pelos Estados Unidos a aumentar as suas contribuições para a defesa comum, Figueiredo Lopes sustentou que cabe aos ministros da Defesa estudar como é que se contabiliza o esforço nacional, numa equação que, considera, não deve incluir apenas "a contabilidade dos 2% do PIB".

c/ Lusa
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