Alexandra Reis. Medina assume que "processo de nomeação não correu bem"

por Mariana Ribeiro Soares, Joana Raposo Santos - RTP
José Sena Goulão - Lusa

O ministro das Finanças esteve no Parlamento esta sexta-feira para prestar esclarecimentos, a pedido do PSD, em relação à indemnização da TAP a Alexandra Reis. Em resposta aos deputados, Fernando Medina assumiu que o processo de nomeação de Alexandra Reis para secretária de Estado do Tesouro "não correu bem", mas reiterou que não tinha conhecimento da polémica indemnização porque "não ocupava qualquer lugar no Governo".

Fernando Medina assumiu que “as coisas não correram bem no processo de nomeação” de Alexandra Reis para secretária de Estado do Tesouro. “Não é adequado fazer-se uma nomeação de um membro do Governo que depois se constata poucas semanas depois que, por circunstâncias não conhecidas à data da nomeação, colocam em causa a sua autoridade política”, afirmou.

“Isto não devia ter acontecido desta forma sem o conhecimento do Ministério das Finanças. Há aspetos para esclarecer”, admitiu, recusando, no entanto, retirar consequências políticas para si próprio.

"Sabendo o que sei hoje, não a tinha nomeado", afirmou. “Se eu pudesse evitar tinha evitado”, garantiu.

O ministro das Finanças garantiu que desconhecia a indemnização de 500 mil euros que foi paga a Alexandra Reis na altura da sua saída da TAP e reitera que só tomou conhecimento pela comunicação social.

Fernando Medina lembrou que “não ocupava qualquer cargo no Governo” na altura em que foi paga a indemnização a Alexandra Reis e acrescentou que quando tomou conhecimento da situação através da comunicação social tomou “as decisões que se impunham”. “Assumi a responsabilidade”, afirmou.

“Este processo todo ocorreu antes de eu ocupar funções como ministro das Finanças”, sublinhou.  Fernando Medina garantiu ainda que não foi "encontrado registo" no seu ministério sobre a indemnização recebida por Alexandra Reis.

"O meu antecessor, o ministro João Leão, e o antecessor secretário de Estado do Tesouro - com tutela da TAP - Miguel Cruz, disseram que não tinham essa informação [da indemnização]. Não constava nas pastas de transição do ministério e não foi encontrado registo dessa informação nos registos do ministério", garantiu Fernando Medina durante uma audição na Comissão de Orçamento e Finanças.

O deputado do PSD, Hugo Carneiro, instiu na questão da indemnização e questionou se Medina não viu uma notícia do Expresso, em maio de 2022, que dava conta de uma indemnização milionária a Alexandra Reis pela sua saída da transportadora aérea.

“Não vi essa notícia mas admito que várias pessoas a tenham lido. Mas não havia nada que chamasse particularmente a atenção”, respondeu Medina, sublinhando que as suas fontes “não são notícias de jornais”.

“O que posso garantir é que não tomei a decisão, não participei na decisão, não fui informado da decisão pela razão direta de que não era membro do Governo”, frisou.

Mariana Mortágua, do Bloco de Esquerda, questionou Medina sobre qual foi, ao certo, a justificação dada por Alexandra Reis para a atribuição dessa indemnização. Segundo o ministro, a ex-secretária de Estado transmitiu que “não havia vontade por parte da comissão executiva da TAP em que esse mandato continuasse e entenderam ser feito (…) um acordo que depois levasse à renúncia de Alexandra Reis”.

Ainda em resposta ao deputado social-democrata, o ministro afirmou que esteve com Alexandra Reis apenas uma vez enquanto presidente da Câmara de Lisboa. "Pessoalmente, creio que terei estado com a engenheira Alexandra Reis, enquanto presidente da Câmara Municipal de Lisboa, uma vez, acompanhada pela CEO TAP", afirmou o governante.

"Alexandra Reis não faz parte do nosso grupo de amigos, não o fez. Repito, estive com a engenheira Alexandra Reis uma vez enquanto presidente da Câmara Municipal de Lisboa, antes de a convidar para secretária de Estado do Tesouro", reiterou.
Currículo de Alexandra Reis era "amplamente positivo"
Em resposta ao deputado do PSD Hugo Carneiro, Fernando Medina explicou que a nomeação de Alexandra Reis para a NAV, em junho de 2022, cabia ao Ministério das Infraestruturas e, por isso, apenas assinou o despacho.

O Ministro das Finanças esclareceu ainda que o currículo de Alexandra Reis era “amplamente positivo” e que só teria de haver um “juízo crítico” por parte da tutela das Finanças se houvesse “alguma situação anómala”.

“Por regra não tem que haver nenhum pronunciamento por parte do Ministério das Finanças a não ser que haja alguma situação anómala”, explicou Medina.

“Não tem que haver assentimento do currículo”, acrescentou.

Fernando Medina justificou o seu convite a Alexandra Reis para o Governo com o facto de achar que esta tinha o “perfil adequado” para as funções.


“O conhecimento de que dispunha do currículo da engenheira Alexandra Reis, as informações positivas sobre o desempenho da engenheira Alexandra Reis, na TAP e na NAV, por parte da equipa do Governo a que eu pertenço, foram boas razões para (…) lhe ter realizado o convite que dirigi”, elucidou.

Questionado sobre quem referiu o nome de Alexandra Reis para o cargo, o ministro das Finanças respondeu que a engenheira “não era uma pessoa estranha à Administração Pública portuguesa”. “Era uma pessoa com o seu currículo bem firmado”, por ter ocupado funções na TAP e na NAV, insistiu.
Medina e Pedro Nuno Santos faziam acompanhamento “regular” da TAP
Já em resposta a André Ventura, para quem é estranho que alguém se despeça e receba uma indemnização de meio milhão de euros, o ministro das Finanças garantiu que tudo decorreu com regularidade no seu Ministério e defendeu que, “numa matéria desta natureza, tem de haver coordenação ao nível político”.

“Enquanto desempenhei funções enquanto ministro das Finanças em simultâneo com o ministro das Infraestruturas Pedro Nuno Santos, no acompanhamento da TAP, o acompanhamento que fazíamos era regular, próximo, de solidez e de comunicação plena de informação entre os dois ministérios”, assegurou.

“Não terá sido assim no passado, admito”, mas “enquanto ambos ocupámos essa pasta, tudo decorreu com normalidade e com adequação, e estou certo de que assim irá acontecer com o ministro João Galamba”, declarou Fernando Medina.

Medina insistiu que, em conjunto com Pedro Nuno Santos, acompanhou de forma muito próxima a execução do plano de restruturação da TAP. “Esse plano tem vindo a ser cumprido na parte pública, das obrigações que o Estado tinha”, assegurou o ministro, acrescentando que esse plano “tem superado largamente os objetivos que estão inscritos para o desempenho da empresa”.
Medina defende “quadro legislativo próprio” para empresas públicas
Bruno Dias, do PCP, referiu-se a “práticas absolutamente obscenas” e de “um perigo real de contaminação” nas instituições de interesse público.

O deputado comunista disse ainda acreditar que Fernando Medina nem saiba “quantas mais Alexandras Reis poderão andar aí em empresas da sua tutela financeira”. “Tenho ideia que o senhor ministro não sabe, mas a questão que se coloca é se quer fazer e o que está disposto a fazer para ficar a saber”, declarou.

Fernando Medina concordou que “não se devem importar, não se podem importar (…) práticas como algumas das que nós vimos no setor privado e que são manifestamente desajustadas no contexto que vivemos, mais ainda sendo uma empresa 100% detida pelo Estado”, como é o caso da TAP.

Sobre a possibilidade de existirem mais casos polémicos em instituições públicas, o ministro das Finanças argumentou que “a larguíssima maioria das empresas do Estado, que são mais de 140, estão sujeitas integralmente ao abrigo do estatuto de gestor público, e por isso estão obrigadas ao cumprimento estrito das regras” que se colocam a esse nível.

No caso da polémica na TAP, uma das lições a retirar é que “teremos de ter não um estatuto do gestor público que, à la carte, vai-se aplicando ou não se aplicando a estas empresas”, mas sim “um quadro legislativo próprio”, evitando a interpretação livre da aplicabilidade das regras.
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