Geringonça à direita? Fim da maioria absoluta do PS nos Açores deixa tudo em aberto

por Andreia Martins, Carlos Santos Neves - RTP
Sem maioria absoluta, o líder regional dos socialistas e atual chefe do Governo Regional, Vasco Cordeiro, reivindicou uma vitória "clara e inequívoca" André Kosters - Lusa

Das 13 forças políticas que se candidataram às eleições regionais, sete conseguiram garantir entrada na Assembleia Legislativa dos Açores, três das quais pela primeira vez: Chega, Iniciativa Liberal e PAN. Mas o grande destaque da noite vai para o fim da maioria absoluta do PS na Região Autónoma, o que poderá significar um ponto final em 24 anos de hegemonia dos socialistas.

Num parlamento com 57 deputados, o PS necessitava de 29 mandatos para conseguir alcançar a maioria absoluta que tem sido recorrente nas últimas duas décadas nos Açores. Desde 1996 que os socialistas lideram a Região Autónoma, primeiro com Carlos César e depois com Vasco Cordeiro, a partir de 2012.

No entanto, tal como na primeira vitória eleitoral de 1996, também este domingo - e pela segunda vez na história - o PS não conseguiu renovar a maioria absoluta alcançada nas eleições de 2000, 2004, 2008, 2012 e 2016, tendo alcançado apenas 25 mandatos, com 39,13 por cento dos votos.
  
Numa primeira reação a estes resultados, o líder regional dos socialistas e atual chefe do Governo Regional, Vasco Cordeiro, destacou que o PS obteve uma vitória “clara e inequívoca” ainda que não goze de maioria absoluta.
O responsável referiu que o PS continua a ser um “referencial de estabilidade” para os Açores, mas assumiu o compromisso de olhar ao que "obriga o quadro parlamentar" que resulta das eleições deste domingo.

Por fim, o líder regional disse ainda estar disponível para trabalhar, "em diálogo, em concertação" para que "sejam os Açores e os açorianos que ganham" condições para superar o contexto da pandemia.

Mas, perante um parlamento mais fragmentado, outros partidos também se mostraram abertos ao diálogo. É o caso do PSD, que conseguiu garantir 21 mandatos, tendo alcançado 33,7 por cento dos votos.

José Manuel Bolieiro, líder do PSD Açores, sublinha que este escrutínio representa uma "mudança histórica" para os Açores, considerando que, a partir de agora, será no parlamento que se centra a decisão política.

O social-democrata felicitou ainda os partidos que alcançaram lugares no parlamento regional pela primeira vez, assumindo uma posição de "diálogo" para defender os interesses dos Açores.

Questionado sobre coligações do PSD, José Manuel Bolieiro admite que estas eleições deixaram um "quadro polivalente" em que “tudo” pode acontecer, incluindo uma solução de liderança da oposição.
O líder regional laranja mostrou-se disponível para assumir responsabilidades mas nunca pela via de uma declaração "unilateral", ou seja, sem dialogar com outros partidos.

Sobre a disponibilidade para dialogar com o Chega, que elegeu dois deputados, José Manuel Bolieiro diz que o diálogo no parlamento "não exclui ninguém".

“Devo afirmar hoje, como sempre, que atitudes extremistas e populistas não me comovem, nem creio que interessam aos açorianos, mas também acho que os açorianos já deram provas, e os seus representantes, de que não são extremistas nem populistas”, salientou.

Na reação aos resultados, os líderes nacionais de PS e PSD não quiseram intrometer-se na constituição do Governo regional e nas decisões das estruturas locais.

António Costa felicitou o PS Açores pela vitória, mas disse que é ao partido do arquipélago que cabe encontrar soluções.
Já Rui Rio destacou o resultado “francamente positivo” do PSD Açores, mas assumiu a dificuldade de desenhar uma geringonça à direita para governar no arquipélago.
O CDS-PP foi a terceira força política mais votada, com 5,5 por cento dos votos. O partido consegue eleger três deputados a que acrescenta mais um parlamentar, em coligação com o PPM.
"Foi um voto útil para a mudança de que os Açores precisam", disse Francisco Rodrigues dos Santos, presidente do CDS-PP, acrescentando que o partido “lidera à direita”. 
Três novos partidos, CDU de saída
A eleição fica ainda marcada por saídas e entradas de peso no Parlamento regional. Desde logo, a CDU não conseguiu garantir a reeleição do único deputado eleito em 2016, ao contar apenas com 1,6 por cento dos votos.

O PCP reconheceu que a CDU teve "um resultado particularmente negativo" e que a não eleição de um deputado significa um “empobrecimento democrático". Repete-se o cenário da eleição de 2004, altura em que os comunistas também não conseguiram garantir um lugar no Parlamento regional.

Numa noite em que o Bloco de Esquerda anunciou o voto contra o Orçamento do Estado para 2021, o partido conseguiu eleger dois deputados, com 3,82 por cento dos votos.

Pedro Filipe Soares, líder parlamentar do Bloco de Esquerda, afirmou na leitura do escrutínio que os dois candidatos eleitos "estão aptos para fazer o que é necessário fazer".
No entanto, um dos grandes destaques da noite vai para a entrada em cena de três novos partidos: o Chega, que participou pela primeira vez neste ato eleitoral regional, estreia-se como a quarta força política, com 5 por cento dos votos. O partido de André Ventura consegue, desta forma, eleger dois deputados.

Também a Iniciativa Liberal, que concorreu pela primeira vez à assembleia legislativa dos Açores, conseguiu 1,93 por cento dos votos, o que garante a eleição de um deputado.

O PAN, que já tinha participado na eleição de 2016, consegue este ano entrar no Parlamento regional pela primeira vez, ao garantir um mandato.

O PPM conseguiu nesta noite eleitoral eleger mais um deputado, para além do representante em coligação com o CDS-PP.

Nota ainda para a abstenção nestas eleições, que foi de 54,58 por cento, a segunda maior de sempre, mas ainda assim inferior à taxa de abstenção verificada em 2016.

Há quatro anos, a abstenção nas eleições regionais açorianas atingiu 59,16 por cento, um recorde absoluto nestes sufrágios. Praticamente em uníssono, todos os líderes partidários, regionais e nacionais, saudaram os açorianos por diminuirem os número da abstenção neste que foi o primeiro escrutínio num contexto de pandemia.
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