Marcelo veta diploma sobre lóbi e promulga regime de cargos públicos

por Carlos Santos Neves - RTP
O Presidente da República refere “três lacunas essenciais” no diploma que procura regular o lóbi em Portugal Rodrigo Antunes - Lusa

Pela 15ª vez em três anos e quatro meses em Belém, Marcelo Rebelo de Sousa exerceu o veto político para devolver à Assembleia da República o diploma que procura regular o lóbi em Portugal, referindo “três lacunas essenciais”. Entre as quais “não prever a sua aplicação ao Presidente”. O Chefe de Estado promulgou, por outro lado, o Estatuto dos Deputados e o regime do exercício de cargos públicos. Mas fê-lo com críticas.

O decreto que mereceu o veto de Marcelo “aprova as regras de transparência aplicáveis a entidades privadas que realizam representação legítima de interesses junto de entidades públicas e procede à criação de um registo de transparência da representação de interesses junto da Assembleia da República”.

Na base da decisão do Chefe de Estado, lê-se no portal da Presidência, estão “três lacunas essenciais, em particular o facto de o diploma não prever a sua aplicação ao Presidente da República”.Durante a discussão do diploma do lóbi, gerou polémica o facto de os agentes envolvidos nesta atividade não serem forçados a declarar património e rendimentos e o abandono da obrigatoriedade de aclararem quem representam.


A nota da Presidência remete para uma carta remetida na sexta-feira ao presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues. Nesta missiva, o Presidente aponta também “a total omissão quanto à declaração dos proventos recebidos pelo registado, pelo facto da representação de interesses”, bem como o facto de não se “exigir a declaração, para efeitos de registo, de todos os interesses representados, mas apenas dos principais”.

Marcelo exorta os deputados a fazerem a reapreciação do diploma “ainda antes do termo desta legislatura, atendendo às três específicas objeções formuladas e correspondentes aditamentos sugeridos”.

Trata-se do diploma aprovado em votação final global a 7 de junho. Colheu os votos a favor de PS e CDS-PP a abstenção do PSD e os votos contra de BE, PCP, PEV, PAN e Paulo Trigo Pereira, deputado não inscrito. O decreto ficou definido em sede de comissão eventual para o Reforço da Transparência no Exercício de Funções Públicos, assentando em projetos dos democratas-cristãos, dos socialistas e dos social-democratas.

Marcelo Rebelo de Sousa ressalva que encara com agrado a tentativa de implementar a transparência junto de “grupos de pressão organizados”, com “representantes devidamente remunerados” e que operam “para influenciarem ações ou omissões dos titulares dos cargos políticos e de outros cargos públicos”.

O Presidente reforça que “mais importante é a terceira omissão” no que toca à aplicação da lei: “No âmbito da aplicação deste decreto deverão incluir-se também o Presidente da República, as suas Casa Civil e Casa Militar, assim como os representantes da República nas regiões autónomas e respetivos gabinetes”.

“Tal decorre de identidade de razões e, desde logo, do regime já vigente da aplicação dos impedimentos respeitantes a todos os titulares de cargos políticos”, argumenta o Presidente da República, para acrescentar que “carece de sentido haver tal identidade de regime legal e ele não existir para o controlo da representação de interesses”.

“Deve, pois, alargar-se o âmbito de aplicação do presente decreto e prever-se a criação de regime específico na Presidência da República, idêntico ao consignado para a Assembleia da República e abrangendo os representantes da República nas regiões autónomas”, propugna.
Parlamento “poderia ter ido mais longe”

Também na sexta-feira o Presidente promulgou duas leis do pacote da transparência – o regime do exercício de cargos públicos e políticos e o Estatuto dos Deputados. Sem deixar de tecer críticas. Marcelo considera que “se poderia ter ido mais longe”.
O novo Estatuto dos Deputados prevê perda de mandato para quem “culposamente” não registar rendimentos, património e interesses, ou para quem não corrija incompatibilidades que venham a ser apuradas.
Ainda assim, o Chefe de Estado aplaude o “alargamento do princípio de exclusividade de funções, embora ainda não completo, e a salutar ampliação das obrigações declarativas e outras entidades”.

Já no que diz respeito ao Estatuto dos Deputados, Marcelo evoca a “posição pessoal, radical, em matéria de exclusividade, impedimentos e conflitos de interesses”, considerando que o diploma não foi “plenamente harmonizado” com a outra peça legislativa. O Presidente da República cita, como argumento para a promulgação, o facto de “menos de oito por cento dos deputados” terem chumbado as alterações ao Estatuto.

As alterações ao Estado dos Deputados foram aprovadas a 7 de junho com os votos favoráveis de PS, PCP, BE, PEV, e PAN, os votos contra do CDS-PP e a abstenção do PSD e do deputado socialista Ricardo Bexiga.

As alterações ao regime de incompatibilidades e impedimentos mereceram os votos a favor de PS, PSD, PCP e PEV, os votos contra do CDS e a abstenção do PAN e de Ricardo Bexiga.

A lei do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, agora promulgada, dita que o registo de rendimentos, património e interesses passa a ter um modelo único, a depositar no Tribunal Constitucional.

Eram já abrangidos por esta obrigação os deputados, o Presidente da República, o Governo, autarcas, gestores públicos de empresas participadas pelo Estado ou administradores de entidades públicas independentes. Passam a estar também abrangidos os candidatos à Presidência da República, juízes do Tribunal Constitucional, magistrados judiciais, magistrados do Ministério Público e o provedor de Justiça.

c/ Lusa

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