Março: O fim do jardinismo

A 29 de março, a Região Autónoma da Madeira escolheu Miguel Albuquerque como o novo presidente do Governo Regional. Ainda assim, o dia ficou marcado não tanto pela escolha do novo governante, mas pelo ponto final colocado em quase quatro décadas de Alberto João Jardim à frente dos destinos do arquipélago. Com 37 anos de governação, Jardim bateu, embora em democracia, o recorde de longevidade no poder que pertencia a António de Oliveira Salazar.

Entre março de 1978 e março de 2015, muitos anos, muitas decisões e ainda mais polémicas. Ao fim de dez eleições que venceu por maioria absoluta, Alberto João Jardim, presidente do Governo Regional da Madeira, deixou de ser o mais alto representante da região que sempre o admirou e onde se manteve desde os 33 anos de idade.


Vítor Gonçalves - RTP (12 de janeiro)

A decisão tinha sido anunciada a 3 de dezembro de 2014 e foi confirmada nos primeiros meses do ano. Nessa altura, o então líder do PSD na Madeira anunciou que não apresentaria candidatura às eleições para a escolha de um líder no partido.

Miguel Albuquerque, que viria a vencer as eleições legislativas regionais com maioria absoluta, foi eleito para suceder a Jardim no congresso regional do partido.
Pedido de demissão, outra vez
O pedido formal de exoneração de Jardim surge a 12 de janeiro, mas a demissão já tinha sido pré-anunciada aos militantes do PSD-Madeira e à imprensa. Ainda assim, reinava a incerteza. A saída do líder só acontece efetivamente aquando das eleições. Isto porque não seria a primeira vez que Alberto João Jardim apresentava um pedido de exoneração ao representante da República para a Madeira, no Palácio de São Lourenço, para mais tarde voltar atrás na decisão.

A 21 de fevereiro de 2007, o governante madeirense tinha pedido a demissão em forma de protesto contra uma decisão do Governo PS. Jardim queixava-se de uma alteração levada a cabo pelo então primeiro-ministro José Sócrates, que previa a alteração à Lei das Finanças Regionais, determinando o corte de 500 milhões de euros destinados à região. Nessa altura acabaria por se recandidatar nas eleições antecipadas. Desta vez, foi para valer.
PSD-Madeira não arreda pé

Nos planos que traçou para a própria sucessão, Jardim pretendia que o novo líder do PSD o substituísse de imediato, também na chefia do Executivo madeirense. Mas assim não aconteceu e a Madeira acabaria por ir a votos a 29 de março de 2015, com 11 diferentes forças políticas no boletim de voto.


Daniela Santiago, Rui Silva - RTP (30 de março)

As eleições legislativas regionais antecipadas ditaram mais uma vitória arrasadora dos social-democratas madeirenses, que assim conquistaram a 11ª maioria absoluta consecutiva da história. Ainda assim, a figura mais sóbria e discreta de Miguel Albuquerque levou à perda de alguns votos. Na era pós-Jardim, o PSD conseguiu assegurar mais uma vitória esmagadora, com mais de 44 por cento dos votos


Atrás do PSD, que elegeu 24 dos 47 deputados regionais, ficaram o CDS-PP da região, que alcançou mais de 13 por cento. O maior derrotado acabou mesmo por ser o PS, que não conseguiu ir além dos 11 por cento.

Uma das surpresas do escrutínio regional foi o partido Juntos Pelo Povo, a quarta força política mais votada (mais de dez por cento dos votos) e conseguiu eleger seis deputados. Seguiram-se a CDU, com 5,5 por cento de votos, e o PND e o Bloco, que elegeram cada um dois deputados.

Alberto João Jardim deixa uma pesada herança ao sucessor no partido e no governo. Das décadas de coexistência pouco pacífica com o Executivo de Lisboa sobrou um enorme buraco da dívida que ascende aos 1.107 milhões de euros, fruto das mais variadas construções e obras de desenvolvimento quase faraónico de infraestruturas.

Jardim participou na inauguração de mais de 4.850 obras, um número que lhe dá a média de 2,7 cerimónias por dia. Novos desafios
Com o fim da era de Jardim, chegou a pensar-se em novos caminhos políticos. Alberto João Jardim no Parlamento era uma das possibilidades e chegou-se mesmo a pensar que dali viria uma candidatura às eleições presidenciais do próximo ano, especulações que acabaram sem efeito.

De estilo inconfundível e um perfil único na política portuguesa, o governante promete a partir de agora ser discreto e low profile, algo que nunca foi ao longo da longa carreira na Quinta da Vigia, a residência oficial do presidente do Governo Regional da Madeira.

Jardim sai igual a si próprio: “Não tive intenção de magoar ninguém. Mas quando as pessoas são injustas para comigo, levam”.

Chegou a entregar uma proposta de revisão constitucional na Assembleia da República, a 14 de julho. Na página de Facebook de apoio à candidatura presidencial de Jardim em 2016, que aliás ainda se encontra disponível, o ex-número um do Governo madeirense apresenta o projeto para “mudar Portugal”, propondo uma reorganização administrativa das regiões, mandatos de sete anos para o Presidente da República e a dissolução do Tribunal Constitucional.


Paulo Santos - Antena 1 (12 de janeiro)

As ideias exuberantes cairiam por terra. Alberto João Jardim confirmava em outubro que afinal não iria avançar com a candidatura. Afirma não querer protagonizar “quixotismos” na corrida a Belém e assume confiança plena em Marcelo Rebelo de Sousa para assumir esse cargo.

Ainda não foi desta que Jardim regressou ao ativo. Mas para aqueles que conhecem a personalidade do governante ressoa o aviso deixado no último dia de campanha, em que apoiou Miguel Albuquerque: “Não pensem que me retiro da política”.