O passado inflamou o presente no primeiro debate entre Rio e Santana

por Carlos Santos Neves - RTP
Na RTP, Rui Rio reprovou o currículo de Santana Lopes enquanto primeiro-ministro, ao que o adversário o acusou de ser “siamês” de António Costa Mário Cruz - Lusa

Foi tenso o primeiro confronto televisivo entre os candidatos à sucessão de Pedro Passos Coelho na liderança do PSD, esta noite transmitido pela RTP. A temperatura subiu sempre que se abordou o passado. Sobretudo a passagem de Pedro Santana Lopes pela chefia do poder executivo. Rui Rio falou de “fragilidades”. O adversário chamou-o de “siamês” de António Costa.

Foi quando o jornalista Vítor Gonçalves, moderador do debate, questionou os candidatos à presidência do principal partido da oposição sobre as diferenças entre ambos que se abriu caminho à subida de tom. Na troca de acusações, foi privilegiada a segunda pessoa do singular.Os candidatos mostraram estar de acordo quanto às alterações à lei do financiamento partidário, que mereceram esta semana o veto do Presidente da República. Rio criticou a “opacidade”. Santana apontou a “estranheza do processo”.


Rui Rio começou por pôr de parte quaisquer “clivagens brutais” entre dois militantes de um mesmo partido.

“Temos conteúdos programáticos ligeiramente diferentes, não temos clivagens brutais, naturalmente, teríamos de cavar muito para as encontrar. Mas há duas personalidades completamente diferentes, dois estilos completamente diferentes”, fez notar.

Por sua vez, Pedro Santana Lopes lançaria um primeiro repto ao interlocutor, instando-o a explicar o que quis dizer quando se referiu, no espaço público, a “trapalhadas” durante o período em que foi primeiro-ministro, de 2004 a 2005. Sugeriu mesmo que Rio poderia agora invocar o “argumentário do engenheiro Sócrates”.

“As trapalhadas existiram, se o Presidente da República destituiu a Assembleia foi porque tinha razões para isso”, devolveria o antigo presidente da Câmara do Porto.

Santana não desarmou: “Foste meu primeiro vice-presidente e nunca me disseste isso, nem publicamente nem privadamente. Jorge Sampaio foi um grande adversário do país e do partido, todo o partido reconhece que aquele foi um golpe partidário e constitucional. Como é possível dizeres isso?”.
“Fragilidades” e “siamês”

Ao longo de perto de 30 minutos, as interrupções sucederam-se.

“O que estamos a escolher é o líder do PSD cujo objetivo é ser primeiro-ministro do país. O doutor Pedro Santana Lopes teve um exercício como primeiro-ministro que correu manifestamente mal, se o candidato a primeiro-ministro for Santana Lopes todas essas fragilidades voltam ao de cima”, insistiria Rui Rio.

Pedro Santana Lopes repetiria, adiante, o repto no sentido de ver esclarecidas as “trapalhadas”, indo ao ponto de invocar uma carta que Rui Rio partilhou com António Costa, quando ambos eram, respetivamente, autarcas da invicta e da capital.

“São quase siameses, o Dupond e Dupont és tu e o doutor António Costa”, atirou Santana.

“O teu problema é que passas o tempo a dizer mal de mim”, carregaria, antes de questionar o adversário: “Porque não dizes isso do doutor António Costa?”.

“Porque o PS”, respondeu Rui Rio, “teve a maioria absoluta” nas eleições legislativas que se seguiram à dissolução da Assembleia da República pela mão de Jorge Sampaio. Ou seja, continuou, “legitimaram a decisão” do então Chefe de Estado.

Santana Lopes chamaria ao debate o conteúdo de uma entrevista de Paulo Morais na qual o antigo vice de Rio no Porto considerou que o candidato “já não tira o sono aos interesses instalados”. Insistiu em seguida na pergunta sobre a postura do adversário face ao atual primeiro-ministro: “Combinaste com o António Costa?”.

“Eu nunca combinei nada com o António Costa. Ele é que confiou em ti e te nomeou”, retorquiu Rui Rio, referindo-se ao cargo de provedor da Santa Casa da Misericórdia.

“Eu sei que tens dificuldade em reconhecer a qualidade de trabalho de pessoas do PSD”, acentuaria Santana. “Assinas cartas com António Costa, mais uma vez para bateres em Passos Coelho“.
“Quiseste um Partido Social Liberal”
Sempre a mergulhar no passado, o debate recuou a 1996, quando O Independente noticiou a saída de Santana Lopes do PSD, então liderado por Marcelo Rebelo de Sousa, por alegadamente entender que não havia possibilidade de “regenerar, renovar ou refundar” o partido.

“Quiseste fazer um Partido Social Liberal”, acusou Rui Rio.

Na resposta, Santana desvalorizou a questão, lembrando que também Jorge Moreira da Silva encabeçou um movimento.

Pedro Santana Lopes recordaria os tempos recentes da governação de Pedro Passos Coelho, que “estava a salvar o país, a preparar a saída limpa do programa da troika” enquanto Rui Rio “estava na Associação 25 de abril a assobiar para o lado”.

“Ao menos já deixaste cair a Aula Magna, onde eu não estive”, reagiu Rio, para lembrar que foi à Associação 25 de Abril para “falar do regime, da democracia”.

Com o dedo apontado a apoiantes de Rio como Pacheco Pereira, Morais Sarmento ou Manuela Ferreira Leite, Santana mostrou-se ácido: “Andam escondidos”.

“Eu mostro os meus apoiantes todos, tu foste formalizar a tua candidatura só com dois”, lançou.
E o Bloco Central?
Relativamente a José Pacheco Pereira, Rio Rio admitiu não manter contacto “há algum tempo”, pelo que desconhece se poderá contar com o voto do antigo líder parlamentar social-democrata. “Mas tenho a certeza que vai votar contra ti”, contrapôs.

Outro dos temas candentes do debate foi a possibilidade de uma reedição do Bloco Central, com Pedro Santana Lopes a tornar a recusar “qualquer coligação com o PS”, pré ou pós-eleitoral. E Rio a sublinhar que, “no caso de não haver maioria absoluta, o normal é que a coligação seja com o CDS”.

Ainda assim, o antigo presidente da Câmara portuense sustentou que “há situações em que, por força do interesse nacional, não se pode dizer, como o ministro Mário Lino, jamais".
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