Oposição acusa Passos e Portas de propaganda e antevê mais austeridade

por RTP
Pedro Passos Coelho e Paulo Portas fizeram uma declaração conjunta, após o Conselho de Ministros informal, sem direito a perguntas dos jornalistas Manuel de Almeida, Lusa

Ao balanço de contornos otimistas que Pedro Passos Coelho e Paulo Portas fazem do primeiro ano de mandato do Governo de PSD e CDS-PP, a Oposição contrapõe o quadro de um país mais pobre, onde grassa o desemprego. O primeiro-ministro e o ministro dos Negócios Estrangeiros encerraram ontem os trabalhos de um simbólico Conselho de Ministros a insistirem no argumento de que não há alternativa à via de consolidação orçamental traçada no programa da troika. Mas também a sugerirem que “a emergência económica, financeira e social” estará agora “bem mais próxima de ser ultrapassada”. Uma mera manobra de propaganda, na avaliação de PS, PCP e Bloco de Esquerda.

Na véspera da votação da primeira moção de censura ao seu Executivo, apresentada pelos comunistas, Pedro Passos Coelho surgiu ao lado de Paulo Portas, ao cabo de quase três horas de um Conselho de Ministros dedicado ao balanço de 12 meses de governação, com uma fórmula-chave a comunicar aos portugueses. A de que “não há forma de vencer uma crise sem problemas sociais ou políticas restritivas”.É hoje discutida e votada no plenário da Assembleia da República a moção de censura ao Governo apresentada pelo PCP.

Trata-se da 21ª moção de censura desde 1975 e a oitava de assinatura comunista.

A rejeição está garantida. Bloco de Esquerda e Partido Ecologista “Os Verdes” vão votar ao lado da bancada do PCP. O PS abstém-se.


“Que fique claro, por mais duro que seja, e é uma realidade bastante dura. Não há em parte nenhuma do mundo forma de vencer uma crise económica associada a défices excessivos e a dívidas insustentáveis sem problemas sociais ou sem políticas restritivas. Se houvesse, não existiria governo nenhum que não poupasse os seus cidadãos às dificuldades das crises e, no limite, todas as crises seriam evitadas com políticas de estímulo à economia e ao gasto público”, reiterou o primeiro-ministro, numa apologia do caminho de austeridade orçamental temperada pela ideia de que “a emergência económica, financeira e social não está vencida, mas está hoje bem mais próxima de ser ultrapassada”.

“Vencer esta crise implica corrigir os défices acumulados ao longo de demasiados anos, como estamos a fazer, mas só venceremos duradouramente a emergência nacional e a profunda crise se transformarmos profundamente os alicerces da estrutura económica. Só isso permitirá trilhar um caminho de crescimento sustentável que traga mais emprego e mais rendimento”, insistiu Passos Coelho.

Na conceção do primeiro-ministro, “se nuns aspetos as coisas correram melhor do que previsto e noutros aspetos pior, isso não significa que não estejamos a caminhar na direção certa e que os resultados não sejam globalmente positivos, como é importante que aconteça e como os nossos credores externos têm reconhecido regularmente”.“Um Governo resignado e sem soluções”
Também Paulo Portas quis fazer o retrato de um país que “estava muito perto do precipício” e que, “um ano depois”, está “mais perto do dia” em que vai recuperar a “autonomia”. Assinalando o que disse ser a “boa saúde” da coligação entre democratas-cristãos e social-democratas, o ministro dos Negócios Estrangeiros sustentou que, por “cumprir os acordos, honrar a palavra, fazer as reformas imprescindíveis” e pretender “recuperar a credibilidade e autonomia”, Portugal é hoje encarado externamente “como um caso próprio e singular”.

Na intervenção conjunta com Portas, Pedro Passos Coelho elegeu como prioridades no domínio das reformas estruturais – a implementar no próximo ano - o “reforço do processo de privatizações”, a transposição “com celeridade” do tratado orçamental europeu, “de modo a garantir que a dívida pública que vivemos não se repetirá”, a “reforma do Estado e da Administração”, incluindo as vertentes autárquica e das empresas públicas, a reforma da justiça, a “reestruturação e diversificação das fontes de financiamento” da economia, a sustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde e “continuar o movimento” no sentido de “uma maior autonomia pedagógica e organizativa das escolas”.

Passos incluiu a escalada do desemprego no seu discurso, falando de uma “chaga social” que “deve inquietar” o Executivo e impõe “ação e programas adequados”. Uma referência vista como largamente insuficiente pela Oposição. Para o secretário nacional do PS João Ribeiro, ouvido pela Antena 1, o que o primeiro-ministro deixou patente foi a imagem de “um Governo resignado e sem soluções, que ignora a realidade”.

“O primeiro-ministro falou do desemprego como uma estatística, reconhecendo alguma imprevisibilidade e de uma forma resignada. O único resultado indiscutível que temos é que há menos economia, há menos emprego, falhou a decisão de aumentar o IVA. Ignora o aumento brutal do desemprego jovem e que as falências aumentaram 55 por cento. Ignora que a conta da luz aumentou já duas vezes este ano, também o aumento exagerado das taxas moderadoras. No fundo, este exercício de propaganda não apaga o balanço que todos os portugueses fazem de que a sua vida está pior e não sentem nenhuma espécie de justiça naquilo que está a acontecer”, reprovou o responsável socialista.
“Mero exercício de propaganda”
À rádio pública, Vasco Cardoso, da Comissão Política do Comité Central do PCP, resumiu quer as intervenções de Portas e de Passos Coelho quer o próprio Conselho de Ministros informal como um “mero exercício de propaganda”.

“Um ano depois temos um país mais pobre, mais injusto, mais desigual, mais dependente e menos soberano. Esse balanço está expresso nos cerca de um milhão e duzentos mil desempregados, em muitos milhares de micro e pequenos empresários que estão a fechar portas e num quadro que, em nome da dívida e do défice, têm sido impostos brutais sacrifícios, mas nem a dívida nem o défice estão controlados”, estimou Vasco Cardoso.

“É um trabalho contrário aos interesses nacionais, razão pela qual levamos à Assembleia da República o protesto, a indignação, o descontentamento que muitos milhares de portugueses sentem neste momento. Levaremos à Assembleia da República no quadro da moção de censura”, concluiu.

Já Francisco Louçã antecipou, em declarações à agência Lusa, que depois de um Conselho de Ministros “vazio” resta apenas perceber quando é que o Governo “vai tomar novas medidas de austeridade gravosa”: “Este Conselho de Ministros foi basicamente vazio. Parole, parole, parole, porque respostas às dificuldades das pessoas, que são muito mais graves agora, estamos mais próximos do abismo, mais fundo nas dificuldades, respostas não houve nenhuma. A única coisa que não disse é quando é que vai tomar novas medidas de austeridade gravosa. Porque vai tomar. Já todos percebemos que sim”.

“Este Governo quis fazer uma política do desemprego e escusa de chorar lágrimas de crocodilo, porque não há nenhum desempregado que aceite que facilitar os despedimentos, diminuir as indemnizações por despedimento e empurrar as pessoas para fora do trabalho seja uma boa política para Portugal e para as pessoas”, acentuava ontem Louçã.
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