Rui Rio: "Só vou ser líder do PSD a 19 de fevereiro"

por Andreia Martins - RTP
Fernando Veludo - Lusa

O presidente eleito do Partido Social Democrata não esclarece para já se vai substituir o atual líder da bancada parlamentar, sublinhando que só vai tomar a decisão depois de falar com Hugo Soares e Pedro Passos Coelho. Em entrevista à RTP, Rui Rio falou das polémicas com a comunicação social enquanto foi presidente da Câmara do Porto e admitiu viabilizar um Governo minoritário do PS nas próximas eleições legislativas.

Nesta entrevista conduzida pela jornalista Sandra Sá Couto, a primeira desde as eleições diretas do último sábado, o recém-eleito líder do PSD considerou que a transição no partido deverá ser feita em unidade, com vencedores e vencidos, e sem “hipocrisias” ou “demagogias”.  



A um mês de distância do Congresso que consagra a vitória obtida no último fim de semana, Rui Rio destaca isso mesmo: que só assume de “pleno direito” funções de presidente a partir de 19 de fevereiro. Lembra, nesse contexto, que a direção do grupo parlamentar “é a direção da confiança do doutor Passos Coelho, que é líder até dia 18 de fevereiro”.

"Não quer dizer que não possamos falar, e vamos falar com calma, sem precipitações. Isto não é ao cronómetro", frisou.

Rio recusa por isso tecer comentários sobre as escolhas na sua equipa, dos órgãos nacionais do partido ou no grupo parlamentar, nomeadamente entre os que declararam apoio ao adversário, Pedro Santana Lopes, incluindo o próprio líder da bancada parlamentar, Hugo Soares.

Rio Rio refere que só agora começou a pensar nas soluções para os órgãos nacionais do partido, que serão eleitos no Congresso, e não esclarece se irá procurar consensos, com a inclusão de membros da lista adversária. Certo é que não haverá uma decisão concreta antes de conversar com Pedro Passos Coelho, líder do partido desde 2010.

“Obviamente que não vou tecer publicamente nenhuma consideração sobre isso. (…) Tudo o que possam ler relativamente a fontes bem informadas ou fontes próximas não corresponderá à verdade, porque eu não falei a ninguém sobre isso nem vou falar antes de falar com essas pessoas, como é lógico. O líder parlamentar não vai receber recados meus pela comunicação social”, garante.  

Diz ainda que o confronto pela liderança no PSD foi menos violento do que aquele que aconteceu em 2014 no PS, entre António José Seguro e António Costa. “Nota-se que há feridas do passado que não sei se alguma vez vão passar, porque aquela campanha foi muito violenta”, considera o social-democrata, assegurando que tentou escapar ao “ataque pessoal” nos debates com Pedro Santana Lopes. 
"Certezas" sobre a comunicação social
A imprensa foi um dos temas amplamente abordados durante a entrevista exclusiva à RTP. Rio Rio garantiu que não tem “desconfianças”, mas "certezas" em relação à comunicação social e assume-se como “crítico”.  

“A liberdade de expressão, neste caso de imprensa, é absolutamente vital em democracia. Não é concebível um regime democrático a sério, na sua substância, sem haver uma liberdade de imprensa a sério. Mas essa imprensa também tem de ter muita credibilidade porque tem um papel muito relevante (…) no trazer à opinião publica aquilo que as pessoas têm de saber e que não pode estar escondido. Para isso é preciso credibilidade, para isso não pode fazer um escândalo de 15 em 15 dias”, avisa.

O líder eleito do PSD faz o exame à comunicação social atual e diagnostica vários problemas. “O que vai acontecer é que o escândalo entra na banalidade e perdem a credibilidade. Usar a liberdade de imprensa em nome das vendas ou do lucro (…) é algo que desvirtua os mais elementares princípios democráticos. Quebrar o segredo de justiça para conseguir vender [jornais] é um abastardamento claro daquilo que é a democracia”, considera.  

Dos 12 anos que esteve à frente da Câmara, o novo líder do PSD guarda “a certeza” de que a comunicação social lhe fazia oposição que acabou por favorecer as suas candidaturas. "Na Câmara do Porto isso funcionou em pleno. Aquilo que a comunicação social me fazia deu-me uma ajuda brutal”, considera. 

Na liderança do PSD, Rio não espera uma relação tão difícil com a imprensa. “Adivinho que seja mais fácil, muito mais fácil, até porque a nível nacional, em Lisboa e a nível nacional, há um pluralismo muito maior”, sublinha.  
Semelhanças com Cavaco e Sá Carneiro
Nesta entrevista Rui Rio admite que poderá encontrar obstáculos ao readaptar a sua personalidade recatada às exigências do cargo que passará a ocupar.

“Onde pode haver alguma dificuldade é o facto de eu ter uma posição muito mais recatada de exposição pública do que aquilo que têm normalmente os políticos de topo que estão nos lugares de topo”, admite.  

No entanto, dá como exemplo o caso de Cavaco Silva que, salienta, “também tem esse perfil e não deixou de ser primeiro-ministro durante dez anos, com grande sucesso, e depois Presidente da República, durante dez anos”.

Feita a comparação com antigo chefe de Estado, Rio lembra que também Francisco Sá Carneiro tinha um perfil parecido. Nos traços ideológicos e de personalidade, sente-se mais próximo do líder histórico do PSD. “A minha referência política de sempre é o doutor Sá Carneiro. Eu não sou do PSD, eu sou do Partido do doutor Sá Carneiro. (…) Ainda hoje o doutor Sá Carneiro é a minha referência”. 
Um candidato sem amarras
Recusando-se a ser catalogado como teimoso, mas assumindo-se “convicto”, o líder eleito do PSD rejeita um discurso populista de confronto e oposição agressiva ao PS e não faz promessas irrealistas aos militantes.

Entre as várias metáforas futebolísticas a que recorre ao longo da entrevista, Rui Rio explicou como será o seu PSD comparando-o a uma relação matrimonial: “Se prometemos tudo e mais alguma coisa, vamos ficar amarrados a isso. É preciso namorar bem para que o casamento dê certo. Se namora mal, promete à noiva um Ferrari, férias no outro lado do mundo, uma mansão com piscina, promete-lhe tudo, e depois casa e não tem nada para lhe dar, o casamento começa logo mal. Aqui é a mesma coisa. O namoro é a campanha eleitoral, dizer o que queremos e ao que vimos, para que depois o casamento, ou seja, o exercício do poder, haja os graus de liberdade para podermos fazer aquilo que deve ser feito”.  

E os graus de liberdade com que Rio conta mover-se são também demográficos. Na visão do presidente eleito do PSD, a sua candidatura traz “uma inovação muito grande”: a independência em relação ao que outrora classificou como “a corte lisboeta”.

Garante que “não vai mudar” a sede nacional do PSD de Lisboa para o Porto, mas destaca que a sua candidatura não saiu da capital e que estará atento ao resto do território “muito mais do que é normal”.  

“Para o PSD e para o país acho que isso é uma enorme vantagem. Eu não estou amarrado a interesse nenhum. (…) Quem está no centro do poder cria teias onde está o poder mais fechado, mais enquistado. Somos um país muito centralizado. Isso cria relações, teias de poder, que são prejudiciais para o país como um todo”, refere o líder eleito.  

Destaca a importância de ter sido escolhido para representar um grande partido nacional estando “desamarrado” e “livre para poder decidir”.  
Rio admite viabilizar Governo PS
Sobre a reação do primeiro-ministro às eleições diretas, que considerou que dificilmente teria uma relação pior com o próximo líder que com a atual liderança, Rio interpreta as palavras de Costa como sinal da relação política e pessoal “muito difícil” com Passos Coelho.  

“Se tivesse ganho Santana Lopes, penso que António Costa teria feito o mesmo comentário”, considera. 

Nesta entrevista à RTP,  Rio rejeitou ainda a “clubite” e a rivalidade cega entre PSD e PS. Salienta que os primeiros objetivos do partido passarão por vencer as eleições legislativas com maioria absoluta ou relativa, mas que não exclui a possibilidade de viabilizar um Governo PS. 

Uma situação que, lembra, não se trata de qualquer bloco central. “Estou disponível, face às circunstâncias, para não excluir a hipótese de fazer o que o professor Marcelo fez enquanto líder do partido de deixar o Governo minoritário do engenheiro Guterres governar, ou aquilo que fez o parlamento, deixar em 1985 o governo minoritário de Cavaco Silva governar, ou aquilo que fez o PSD com Manuela Ferreira Leite e com Passos Coelho de deixar um Governo minoritário do PS governar”.

“Não é vender a alma ao diabo”, reitera Rui Rio, na resposta a uma declaração recente da antiga líder do PSD, Manuela Ferreira Leite. 

Assume que pretende a vitória, mas recusa a demagogia sobre um eventual posicionamento inflexível perante outros, lembrando as possíveis desvantagens da “geringonça” criada em 2015. 

“De repente o PS faz um acordo à esquerda, muita gente que votou no PS se calhar não votaria se soubesse que isso seria possível. Não é muito mais transparente o que estou a fazer?”, questiona o antigo autarca do Porto, que assume que essa posição “de risco” foi assumida pela sua candidatura nas eleições diretas, mas que os militantes souberam interpretar. 

Recusa, por isso, um posicionamento que consideraria pouco construtivo para o país. “Entre o PS, o PSD e o CDS acho que há traços comuns que o país ganhava muito que fossem aproveitados, e não estar a inventar diferenças artificiais só para parecer muito diferente. O país tem perdido muito com isso”, refere. 
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