Espanhóis temem "indigestão" de fundos europeus devido a falta de mão-de-obra e de matérias-primas

por RTP
DR

A recuperação económica da vizinha Espanha está ameaçada por problemas que poderão impedir as empresas de aproveitar ao máximo os fundos europeus, particularmente na área da construção.

O sector espera a benesse de 6.8 mil milhões de euros para investir em projetos de reabilitação de casas, ao abrigo do plano de recuperação espanhol pós pandemia de Covid-19, financiado pela União Europeia.

As empresas estão contudo mais preocupadas do que entusiasmadas. Os construtores enfrentam dificuldades em encontrar madeira, alumínio e outras materiais essenciais. O sindicato afeto à UGT espanhola, Fica, referiu ainda à agência Reuters que faltam cerca de 700 mil trabalhadores para absorver o próximo dilúvio de projetos.

“Podem surgir problemas de digestão”, ironizou o presidente da Confederação Nacional da Construção, Pedro Allens, em declarações à Reuters ao referir-se aos problemas de absorção dos fundos.

O setor da construção é um dos maiores pilares da economia espanhola, tendo representado cerca de 10 por cento do PIB de Espanha até rebentar a bolha imobiliária em 2008.

No pico pré-crise empregava três milhões de pessoas, número que caiu para os 900 mil trabalhadores em 2013, o seu ponto mais baixo. Desde então, a força de trabalho recuperou, para cerca de 1.3 milhões, mas patrões e sindicatos apontam a uma só voz a falta de mão-de-obra especializada, sobretudo carpinteiros, pedreiros e canalizadores.

“Temos falta de mão-de-obra e os fundos europeus ainda não chegaram. Quando chegarem, a pressão vai aumentar”, explicou Allens. E “o aumento dos preços dos materiais e a falta de mão-de-obra vão causar estrangulamentos que poderão retardar o ritmo de recuperação”, acrescentou.

Muitos empresários têm alertado para a falta tanto de material em quantidade suficiente como de trabalhadores para fazer face a contratos extra. Escassez que irá aumentar os custos quando os trabalhos começarem, aprofundando os problemas económicos do país.

Tal como outros países europeus e no resto do mundo, a Espanha tem sofrido com o impacto dos atrasos e dos estrangulamentos das cadeias de distribuição globais, agravados pelo aumento dos preços da energia.

O grupo Oficemen revelou quarta-feira que a subida destes últimos agravou em 25 por cento os custos de produção do cimento, cujas exportações registaram em setembro quebras de 6 por cento face a período homólogo de 2020.
Acomodar o aumento dos preços
Em finais de agosto, a expectativa de crescimento do setor por parte da Confederação Nacional da Construção. CNC, era de sete por cento, com base nas projeções da Federação Europeia da Indústria de Construção. A Euroconstruct falava em 5,5 por cento no segundo semestre de 2021 e de seis por cento em 2022. A CNC mencionava um aumento de 7,6 por cento na reconstrução face a 2020, à boleia dos apoios públicos à recuperação de casas, o qual deveria representar por si só um aumento de 10,4 por cento em relação ao anterior exercício. Já para as construções de casas novas a melhoria seria de oito por cento e, na edificação não habitacional, de cinco por cento. A subida nas obras públicas seria de 4,5 por cento. O setor esperava ainda aumentar o efetivo de trabalhadores para cerca de dois milhões.

Quanto ao aumento das matérias-primas, Pedro Allens reiterava na altura a necessidade de aprovação de medidas de reequilíbrio dos contratos em curso, para acomodar as alterações posteriores às adjudicações dos projetos. A CNC apelava o Governo a revogação da Ley de Desindexación.

O grupo das maiores construtoras, Seopan, exigia igualmente um mecanismo de reequilíbrio para as obras em execução e o regresso à revisão de preços obrigatória nos cadernos de encargos de uma obra nova.

A associação das construtoras não cotizadas, Anci, apelava por seu lado a uma reforma da contratação pública para agilizar a execução de projetos, de forma a evitar o problema do aumento dos preços dos materiais.
pub