Pacto orçamental e economia sobre a mesa do Conselho Europeu

por RTP
A contribuir para o ambiente de relativa acalmia que se vive em Bruxelas esteve ontem a injeção de 529,53 mil milhões de euros aplicada pelo BCE a 800 bancos europeus Tim Brakemeier, EPA

A assinatura de um tratado orçamental para a introdução de limites constitucionais às derrapagens das contas públicas deverá ser o resultado mais significativo de um Conselho Europeu que começa hoje sem drama em Bruxelas. Apagada da agenda, por vontade de Berlim, a cimeira circunscrita à Zona Euro que deveria abordar o alcance do novo Mecanismo Europeu de Estabilidade, sobra aos líderes da União Europeia a exploração de fórmulas para fomentar o crescimento. Embora haja indícios de que a chanceler alemã, Angela Merkel, pode estar menos relutante.

“Virar a página” da crise das dívidas soberanas é, ao mesmo tempo, o tema genérico e o propósito otimista da cimeira de chefes de Estado e de governo que tem início previsto para as 18h00 (17h00 em Lisboa). Sem o cunho de emergência emprestado a anteriores reuniões do Conselho Europeu, na esteira da aprovação do segundo programa de resgate financeiro da Grécia, os líderes têm por diante uma agenda que se anuncia morna. Carta dos 12

A servir de pano de fundo aos trabalhos da cimeira estão os números da Comissão Europeia que situam a Zona Euro numa fase recessiva.

É com o argumento da recessão em mãos que o presidente do Governo espanhol, Mariano Rajoy, tenciona advogar em Bruxelas que as metas para o défice público de Madrid sejam aligeiradas, ainda que o Executivo comunitário não esteja disposto a fazer concessões imediatas.

Por iniciativa de britânicos e italianos, 12 primeiros-ministros europeus assinaram uma carta de pendor liberal a defender que, para além do terramoto das dívidas soberanas, a Europa está também confrontada com “uma crise de crescimento”. Pelo que é “necessário” avançar para uma modernização das economias, reforçando a competitividade e corrigindo desequilíbrios.

Além do Reino Unido e de Itália, o documento teve as assinaturas dos primeiros-ministros de Espanha, Holanda, Irlanda, Finlândia, Suécia, Polónia, República Checa, Eslováquia, Letónia e Estónia. O primeiro-ministro português não foi convidado.

O eixo franco-alemão fez publicar, por seu turno, uma carta separada em que a ênfase é dada à coordenação das políticas fiscais.


Além do Tratado sobre a Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária, a assinar na manhã de sexta-feira por 25 Estados-membros (Reino Unido e República Checa não subscrevem o documento), estará em cima da mesa a conclusão da primeira fase do Semestre Europeu, esperando-se a adoção de uma série de orientações de Bruxelas para as políticas orçamentais e económicas – entre as quais a discussão prévia, a nível europeu, dos orçamentos nacionais.

A própria amplitude do pacto orçamental, que comporta a denominada “regra de ouro” de um limite constitucional de 0,5 por cento do Produto Interno Bruto para os défices estruturais, fica à partida condicionada aos resultados de um referendo a realizar na República da Irlanda. Mesmo que o presidente do Eurogrupo, Jean-Claude Juncker, tenha já antecipado que a consulta popular anunciada em Dublin “não provocará as mesmas consequências dramáticas” de 2001 e 2008, quando os irlandeses rejeitaram, respetivamente, os tratados de Nice e de Lisboa.

O novo tratado pode começar a ser colocado em prática após a ratificação por 12 dos 25 Estados subscritores. A ratificação é necessária para que um país do grupo da moeda única possa recorrer ao futuro Mecanismo Europeu de Estabilidade.

Outro dos pontos incluídos na ordem de trabalhos é a recondução do presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy, que deverá passar a encabeçar, também, futuras cimeiras da Zona Euro. E no plano do simbolismo histórico espera-se que a candidatura da Sérvia à adesão seja oficializada - 13 anos depois da guerra do Kosovo e dos bombardeamentos aéreos da NATO contra Belgrado.
Inversão de Merkel

Atirado para algures durante o mês de março está o reforço das chamadas firewalls, ou “defesas”, da Zona Euro. A relutância de Berlim no que toca ao aumento da capacidade do futuro Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) levou mesmo ao cancelamento da reunião de líderes de países da moeda única que estava prevista para amanhã, imediatamente após o fim dos trabalhos do Conselho Europeu. Mas a imprensa alemã noticia agora que Angela Merkel terá revisto a sua postura.

Segundo o diário alemão Süddeutsche Zeitung, a chanceler estará aberta a aceitar o reforço do MEE dos previstos 500 mil milhões de euros para 750 mil milhões, recorrendo-se ao que sobeja do atual Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF). Para tal, adianta a publicação de Munique, com base em fontes governamentais, o FEEF teria de vigorar por mais um ano.

O Süddeutsche Zeitung assinala que o líder da União Social-Cristã (CSU) da Baviera, uma das formações que integram o Governo Federal, reconheceu ontem mesmo que a coligação no poder “terá de se ocupar com o aumento” do Mecanismo Europeu de Estabilidade.

Num encontro com deputados do seu partido, Horst Seehofer indicou que a perspetiva de cedência do Executivo foi-lhe comunicada quer pela chanceler alemã, quer pelo ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble. Uma inversão de marcha de Berlim obrigaria a CSU a fazer um congresso extraordinário para sufragar o reforço do novo instrumento de financiamento.

O presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, mostrava-se ontem confiante na conclusão “até ao fim do mês” das discussões sobre o reforço do MEE, “antes de encontros entre o G20 e o Fundo Monetário Internacional”. Uma fonte comunitária, citada pela agência France Presse, afirmou, por sua vez, que haverá “um novo encontro” de líderes da Zona Euro “em março”: “Será uma cimeira específica que visa decidir os valores do Mecanismo Europeu de Estabilidade”.
Austeridade em cima de austeridade
Do dossier grego ocupam-se os ministros das Finanças da Zona Euro, que se reúnem ao início da tarde. O Eurogrupo fará um ponto da situação sobre as reformas impostas a Atenas para a concessão do segundo pacote de resgate financeiro, no montante de 130 mil milhões de euros, e de um perdão parcial da dívida helénica por parte dos credores privados do país, que terão de assumir uma depreciação de mais de 50 por cento no valor das obrigações que detêm.

Na véspera do Conselho Europeu, o Parlamento de Atenas aprovou por ampla maioria, numa sessão extraordinária que se prolongou por 12 horas, um novo projeto de lei para cortar nas despesas com saúde pública e criar uma estrutura que unifique as diferentes caixas de previdência atualmente existentes na Grécia - a somar a anteriores pacotes de austeridade orçamental exigidos pela troika do Fundo Monetário Internacional e da União Europeia em troca do segundo empréstimo.

Em matéria de saúde pública, o projeto de lei estipula uma redução de despesas com medicamentos e a fusão de unidades hospitalares. “Duzentos e treze dos 283 deputados presentes” adotaram o texto, de acordo com o vice-presidente do Parlamento, Grigoris Niotis. Votaram favoravelmente os conservadores da Nova Democracia, os socialistas do PASOK e uma dezena de deputados independentes. A esquerda comunista e radical, assim como a extrema-direita, votaram contra.

Na quarta-feira fora aprovado um outro diploma sob o signo da austeridade, tendo ficado selado o despedimento de 150 mil funcionários públicos, o corte de 22 por cento no salário mínimo, que passa a ser de 585 euros brutos, e a redução em 12 por cento das pensões de reforma acima de 1300 euros e em 30 por cento das pensões complementares superiores a 200 euros.
Tópicos
pub