Covid-19. Um ano de vacinas que expôs a desigualdade no mundo

por RTP
Lusa

O Reino Unido começou o esquema de vacinação contra a Covid-19 há um ano. Dezanove dias depois começava o processo de vacinação em Portugal. Também outros países europeus promoviam a toma das vacinas para combater a propagação do vírus SARS-CoV-2. Um processo que permite extrair lições e que revelou o melhor e o pior da medicina moderna.

A britânica Margaret Keenan foi a primeira pessoa vacinada no mundo há um ano, depois das fases de ensaio. A primeira de oito mil milhões de doses administradas em todo o mundo ao longo de 12 meses, implicando um esforço muito significativo dos serviços de saúde dos diferentes países.
 
Investigadores e indústria farmacêutica lutaram contra o tempo para produzir um conjunto de vacinas que combatesse os efeitos da Covid-19 reduzisse a velocidade de propagação do vírus. Os primeiros meses foram marcados por desafios à distribuição das vacinas e pela desconfiança de alguns grupos, que continuam a rejeitar a vacinação.
 
Para evitar que os Estados-membros competissem entre si e obter melhores preços, a Comissão Europeia centralizou a compra para o conjunto dos países. Depois de implementado a diferentes velocidades entre os países, 53 por cento das pessoas no continente europeu têm o esquema de vacinação completo.
Por outro lado, as vacinas tornaram ainda mais evidente o fosso entre economias desenvolvidas, que atualmente já ministram a terceira inoculação e se preparam para vacinar as crianças, e as economias pobres. Apenas sete por cento das pessoas estão totalmente vacinadas no continente africano. Um número que espelha a desigualdade no acesso às vacinas e à saúde, denunciando ainda a distância entre os discursos e as ações dos governantes.
Desigualdade no acesso às vacinas

A iniciativa COVAX, em que sob os auspícios da Organização Mundial da Saúde os países ricos se juntavam para fazer chegar aos países pobres as vacinas anti-Covid-19, prossegue num ritmo lento. Até há dois dias, tinham sido distribuídas 610 milhões de vacinas a 144 países participantes. A meta inicial definida era a distribuição de dois milhões de vacinas até ao final do ano. O objetivo foi agora adiado para o primeiro trimestre de 2022.

Enquanto a COVAX lutava para garantir financiamento, os países ricos lutaram por conta própria, assinando acordos unilaterais com os fabricantes das vacinas e compravam os suprimentos limitados.

O interesse dos países do hemisfério Norte em assegurar vacinas suficientes para inocular os cidadãos, segunda e terceira vez, incluindo a vacinação das crianças, suplantaram o discurso da importância de partilhar o recurso limitado.
 
No contexto da propagação da nova variante Ómicron, que será ainda mais rápida do que a atual variante dominante, Delta, crescem os apelos para uma distribuição mais igualitária da vacina.

“Quanto mais deixamos que a pandemia se perpetue, ao não impedirmos as desigualdades no acesso às vacinas ou não adotando medidas sociais e de saúde pública de maneira apropriada e consistente, mais daremos a este vírus a possibilidade de ter uma mutação que não podemos prever nem impedir", advertiu o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus.

A variante Ómicron, comunicada pela África do Sul, já chegou a todos os continentes.
Portugal anuncia doação a países lusófonos

Portugal pretende doar seis milhões de vacinas contra a Covid-19, o triplo das entregues até agora, aos países de língua portuguesa, anunciou esta terça-feira o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva.

"É muito importante para nós, ao mesmo tempo que vacinamos a nossa gente, ter um programa de cooperação com os países de língua portuguesa, especialmente os de África e Timor-Leste, um programa de doação de vacinas. Neste momento já doámos dois milhões de vacinas e o nosso propósito é chegar aos seis milhões", declarou Augusto Santos Silva, na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque, em entrevista à ONU News.

A vacinação "é um esforço" que cabe a todos, acrescenta o chefe da diplomacia portuguesa, para depois notar que Portugal é uma exceção quanto ao nível de população vacinada.

"Portugal é dos países do mundo com maior nível de vacinação. A nossa população adulta está praticamente toda vacinada. Nós já estamos a vacinar os mais velhos com a terceira dose. Desse ponto de vista somos uma exceção, a maioria do mundo não está neste estágio", comentou.

"Uma coisa é certa: enquanto houver região do mundo em que a vacinação não esteja generalizada, nenhuma outra região do mundo pode dizer que está segura", salientou, convidando os restantes membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa a colaborarem na doação de vacinas contra a Covid-19.

A covid-19 provocou pelo menos 5.261.473 mortes em todo o mundo, entre mais de 265,80 milhões infeções pelo novo coronavírus registadas desde o início da pandemia.

Em Portugal, desde março de 2020, morreram 18.572 pessoas e foram contabilizados 1.172.420 casos de infeção, segundo dados da Direção-Geral da Saúde.
Desconfiança dos efeitos secundários

Os números da eficácia das vacinas são encorajadores, com uma redução das infeções pela variante Delta, bem como dos números de mortes e de hospitalizações. O epidemiologista Henrique Barros referiu que a “adesão dos portuguese à vacina terá poupado 200 mil infeções, menos 135 mil dias em enfermaria, menos 55 mil dias em unidades de cuidados intensivos” e pouparam-se 2300 vidas.

No entanto, ainda se desconhece o impacto das vacinas na nova variante Ómicron.

A história das vacinas não pode ficar ainda sem mencionar os raros, mas graves, efeitos secundários.

Em março, ficou esclarecido que a vacina Oxford/AstraZeneca poderia causar uma síndrome de coagulação sanguínea, chamada trombocitopenia trombótica imunológica, que também está associada à vacina Johnson & Johnson, sendo mais provável em crianças.

Em junho, foi revelado que as vacinas Moderna e Pfizer/BioNTech ocasionalmente desencadeiam uma forma de inflamação do coração chamada miocardite. Ocorre com mais frequência em pessoas mais jovens, principalmente do sexo masculino, embora a incidência de miocardite após o Covid-19 seja seis vezes maior.
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