“Diz ao teu chefe”. Gravações da morte de Khashoggi podem comprometer príncipe herdeiro saudita

por Joana Raposo Santos - RTP
As autoridades turcas já afirmaram que o áudio não implica explicitamente Mohammed bin Salman Bandar Algaloud - Handout/Reuters

As gravações de áudio da morte de Jamal Khashoggi, recentemente partilhadas pela Turquia com a Alemanha, Arábia Saudita, Estados Unidos, Canadá, França e Reino Unido, poderão fazer referência ao príncipe herdeiro Mohammed bin Salman. Um dos alegados assassinos terá mencionado, durante uma chamada telefónica, um “chefe” que ordenou o homicídio do jornalista.

“O trabalho está feito”, terá dito em árabe, por telefone, um dos 15 homens que foram enviados ao consulado saudita em Istambul a 2 de outubro para assassinar Khashoggi. “Diz ao teu chefe”, acrescentou o mesmo homem, durante uma chamada que se acredita ter sido feita a um dos elos de ligação com Mohammed bin Salman.

De acordo com o New York Times, a voz ouvida foi identificada como a de Maher Abdulaziz Mutreb, um agente de segurança que viajava frequentemente com o príncipe herdeiro. Gravações de vídeo provam que este homem entrou no edifício do consulado poucas horas antes de Khashoggi ter desaparecido.

As autoridades turcas já afirmaram que este ficheiro de áudio não implica explicitamente Mohammed bin Salman e os serviços de inteligência dos Estados Unidos alertaram que, por mais convincente que seja a gravação, esta não constitui uma prova irrefutável do envolvimento do príncipe na morte do jornalista.

Um participante num protesto em frente ao consulado saudita em Istambul utiliza uma máscara do príncipe Mohammed bin Salman. Osman Orsal - Reuters

Na segunda-feira, as autoridades sauditas negaram que o príncipe herdeiro tenha “qualquer conhecimento acerca do assunto”. Quanto ao “chefe” mencionado na gravação, a Arábia Saudita alega que a Turquia já “permitiu aos serviços de inteligência sauditas que ouvissem as gravações, e em nenhum momento foi feita referência a essa frase”.

Há quem considere, no entanto, que a gravação é significativa para o avanço da investigação ao assassínio. “Uma chamada como esta é o mais próximo de uma pistola fumegante que se pode obter”, acredita Bruce Riedel, antigo membro da agência de inteligência norte-americana CIA. “É uma prova bastante incriminatória”.
Gravações “aterradoras”
O Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, afirmou esta terça-feira que as gravações da morte de Khashoggi são “aterradoras” e que chocaram um agente dos serviços de inteligência saudita que as ouviu.

“As gravações são realmente aterradoras”, declarou. “Quando um dos agentes sauditas as ouviu ficou tão chocado que disse: ‘Esta pessoa deve ter consumido heroína, apenas alguém que consuma heroína faria isto’”.

O líder turco acredita que o assassínio foi orquestrado pelas mais altas autoridades sauditas e acusa o príncipe herdeiro de não estar a esforçar-se por descobrir os culpados. “Tem de ser revelado quem deu a ordem de homicídio”, declarou.

Erdogan disse ter discutido a morte do jornalista com os líderes dos Estados Unidos, França e Alemanha numa visita a Paris realizada no passado fim de semana, para o centenário do Armistício que pôs fim à I Guerra Mundial.
“Responsabilizar todos os envolvidos”
As crescentes suspeitas de que Mohammed bin Salman poderá estar envolvido no assassínio de Jamal Khashoggi estão a intensificar a pressão sobre os Estados Unidos, que até ao momento têm frisado não existirem provas suficientes para incriminar o príncipe herdeiro.
A Arábia Saudita representa um dos mais importantes aliados árabes da Administração Trump.

Face a esta pressão, o Departamento de Estado norte-americano anunciou no domingo que o secretário de Estado, Mike Pompeo, disse a Mohammed bin Salman que os “Estados Unidos irão responsabilizar todos os envolvidos na morte de Khashoggi”.

Jamal Khashoggi, jornalista saudita que residia nos Estados Unidos, era um forte crítico da família real do país de origem. No dia 2 de outubro entrou no consulado saudita em Istambul para recolher documentos necessários para o seu futuro casamento e nunca mais foi visto.

A Arábia Saudita já confessou que o jornalista morreu no edifício e a Turquia acredita que foi estrangulado e desmembrado, apesar de não se saber ainda o paradeiro do corpo.
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