Governo de Hong Kong dá lei da extradição como "morta". Manifestantes não acreditam

por RTP
A chefe do executivo anunciou também a criação de um comité de investigação independente Vivek Prakash - EPA

Carrie Lam, chefe do executivo de Hong Kong, afirmou esta terça-feira que a lei da extradição que desencadeou uma das maiores crises das últimas décadas no território está morta e que a tentativa de a implementar foi um “falhanço total”. Os manifestantes, porém, desvalorizaram estas palavras e prometem mais protestos.

“Ainda existem dúvidas sobre a sinceridade do Governo relativamente a esta questão e preocupações de que o processo seja reiniciado pelo Conselho Legislativo”, começou por declarar Lam. “Por isso, reitero aqui que esse plano não existe. A lei está morta”, garantiu.

A lei, que permitiria o envio de pessoas de Hong Kong para a China continental de modo a serem julgadas em tribunais controlados pelo Partido Comunista, originou contestação e violentos protestos nas últimas semanas.Até agora, Carrie Lam tinha sempre recusado retirar definitivamente a proposta de lei.

A chefe do executivo anunciou também a criação de um comité de investigação independente para supervisionar a ação da polícia durante os protestos que se verificaram na cidade e ainda o estabelecimento de uma plataforma para o diálogo com os opositores da lei.

“Vou publicar o resultado deste relatório para que todos saibam o que aconteceu durante o último mês. As pessoas que participaram, tanto manifestantes como polícias, poderão fornecer evidências sobre o que aconteceu”, afiançou.

Carrie Lam assumiu “total responsabilidade” pela crise, mas não atendeu a uma das principais revindicações dos manifestantes, a sua demissão. “Não é fácil um chefe do executivo demitir-se, e eu ainda tenho a paixão e o compromisso de servir o povo de Hong Kong”, declarou.

“Espero que a sociedade de Hong Kong possa dar-me a mim e à minha equipa a oportunidade e o espaço que nos permita utilizar o nosso novo estilo governativo para responder às exigências do povo em relação à economia e subsistência”, apelou.

O que aconteceu nos últimos protestos, reconheceu a chefe do executivo, “mostra que existem problemas mais profundos que não devemos ignorar”.
Protestos vão continuar
Estas palavras “não significam nada de novo”, disse hoje a porta-voz da Frente Civil de Direitos Humanos, Bonnie Leung, referindo-se à declaração da chefe do executivo. “Lam continua a recusar-se a garantir que a iniciativa vai ser removida”.

“Se as nossas cinco exigências não forem ouvidas por Carrie Lam e pelo seu Governo, a Frente Civil de Direitos Humanos continuará a realizar manifestações e comícios”, sublinhou a ativista.Desde o início dos protestos, a 9 de junho, registaram-se 71 detenções.

Também a Amnistia Internacional considera que “a recusa de Lam em reconhecer as consequências fatais da lei extradição promete continuar a inflamar a situação em Hong Kong”.

As exigências dos manifestantes são claras: a retirada definitiva do projeto de lei, a demissão de Lam, que os protestos não sejam identificados como motins, a libertação dos detidos e a abertura de uma investigação sobre a violência policial, reivindicação que foi hoje aceite pela líder de Hong Kong.

Durante as manifestações de domingo, seis manifestantes, quatro homens e duas mulheres, entre os 20 e os 66 anos, foram detidos. Dos seis, um foi detido por se recusar a ser identificado e os restantes por “obstrução e agressão de um agente no exercício das suas funções”", adiantou a polícia de Hong Kong.
O que está em causa
Aqueles que defendem a lei argumentam que, caso se mantenha a impossibilidade de extraditar suspeitos de crimes para países como a China, tal poderá transformar Hong Kong num "refúgio para criminosos internacionais".

Já os manifestantes dizem temer que Hong Kong fique à mercê do sistema judicial chinês como qualquer outra cidade da China continental e de uma justiça politizada que não garanta a salvaguarda dos direitos humanos.

A transferência de Hong Kong e Macau para a República Popular da China, em 1997 e 1999, respetivamente, decorreu sob o princípio "um país, dois sistemas", precisamente o que os opositores às alterações da lei garantem estar agora em causa.

Para as duas regiões administrativas especiais da China foi acordado um período de 50 anos com elevado grau de autonomia, a nível executivo, legislativo e judiciário, sendo o Governo central chinês responsável pelas relações externas e defesa.

c/ Lusa
pub