Irão quer que ONU suspenda também sanções ao armamento na votação de dia 18

por Lusa
Reuters

O embaixador do Irão em Lisboa defendeu hoje que as Nações Unidas devem também suspender as sanções ao armamento impostas a Teerão quando se votar, domingo, na resolução 2.231, o levantamento das restrições impostas pela ONU em 2015.

Numa declaração à agência Lusa, Morteza Damanpak Jami, considerando os Estados Unidos como "extremistas irracionais", lembrou que a natureza da resolução em causa é "diferente" das anteriormente revogadas pelo Conselho de Segurança contra o Irão.

"Ao contrário da perceção dos extremistas irracionais em Washington, é uma resolução de levantamento de sanções, não uma para aplicar, estender ou manter as sanções", sublinhou o diplomata iraniano, lembrando o Plano de Ação Conjunto Global (JCPoA - Joint Comprehensive Plan of Action), conhecido como Acordo Nuclear do Irão.

Nesse sentido, nas declarações à Lusa, Jami defendeu que os membros do Conselho de Segurança da ONU "devem adotar a abordagem positiva de suspender automaticamente as limitações relacionadas com armas ao Irão", de acordo com o cronograma estabelecido na resolução.

Em 2018, Washington retirou-se unilateralmente do acordo nuclear, plano assinado em julho de 2015 entre o Irão e os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (China, Estados Unidos, França, Reino Unido e Rússia), mais a Alemanha.

A 20 de agosto passado, Washington ativou formalmente na ONU um controverso e incerto procedimento para exigir o restabelecimento das sanções internacionais contra o Irão, acusando-o de violar o acordo de 2015, alegando um "notável não respeito em relação aos seus compromissos" previstos no texto destinado a impedir Teerão de se dotar de uma bomba atómica.

"É claro que qualquer ação aventureira dos Estados Unidos e os seus poucos aliados regionais para impedir a implementação da resolução no levantamento das limitações de armas ao Irão terá uma ação decisiva" de Teerão, alertou.

"Nos últimos dois anos, o Irão sofreu as piores sanções unilaterais dos Estados Unidos e, devido à inação e falta de medidas tangíveis e significativas dos restantes signatários do acordo nuclear, especialmente os membros europeus, não recebeu nenhum benefício económico significativo disso acordo", sustentou.

Jami salientou que, se o Irão não beneficiar do fim das limitações ao embargo de armamento contidas na resolução, "deixará de fazer sentido o país continuar" no JCPoA, e refutou a ideia de que se as sanções forem levantadas a paz e a estabilidade serão afetadas.

"O engraçado é que, em 2019, o regime dos Estados Unidos, o regime sionista de Israel, alguns países europeus e alguns países fracos e intimidados do Golfo Pérsico, alegando que o levantamento das limitações de armas do Irão sob a resolução afetará negativamente a paz e segurança na região, queriam que isso não se cumprisse e fez todo o possível para evitar que isso acontecesse", referiu.

"No entanto, de acordo com fontes mundialmente confiáveis, eles próprios são os maiores exportadores ou importadores de armas da região. Segundo os relatórios dessas fontes, o valor total das importações de armas do Irão entre 2009-2018 foi equivalente a apenas 3,5% das importações de armas da Arábia Saudita no mesmo período", reivindicou.

Por isso, refere o embaixador iraniano em Lisboa, "algumas das limitações restantes" nas transferências relacionadas com armas para o Irão "devem ser completamente eliminadas".

"[Os membros do Conselho de Segurança da ONU) devem facilitar o levantamento das restrições estabelecidas na resolução a partir de 18 de outubro. [...] Todos devem evitar qualquer postura não construtiva ou ação destrutiva contra a implementação das disposições da resolução das Nações Unidas", insistiu.

Para o diplomata iraniano, as partes europeias do acordo nuclear (Alemanha, França, Reino Unido e Rússia) e os Estados-Membros da União Europeia (UE) "devem estar cientes" de que qualquer ação ou posição tomada contrária às disposições da resolução "não é apenas contra as suas obrigações ao abrigo do JCPoA, mas também entrará em conflito com o procedimento".

"Embora em conformidade com o plano de ação, as limitações de armas da UE ao Irão continuarão até outubro de 2023, mas a União e os seus membros são obrigados a tomar as medidas necessárias, incluindo o levantamento das restrições de viagem a pessoas e entidades listadas na resolução 2.231, e abster-se de qualquer ação que impeça o levantamento das restrições estabelecidas na resolução", frisou.

"Só então podemos confiar na boa vontade dos demais países que integram o plano de ação e ter esperança em preservar o acordo nuclear com o Irão", afirmou Jami à Lusa, que insistiu na ideia de que se for tomada qualquer ação contra os interesses iranianos depois da votação de 18 de outubro, "não há justificação para a presença do país no acordo".

"Dessa forma, iremos testemunhar a morte de um acordo que é considerado um modelo de sucesso da função da diplomacia e do multilateralismo no sistema internacional contemporâneo", concluiu.

Os Estados Unidos pretendem utilizar uma cláusula contida no acordo assinado com Teerão, em 2015, ainda pela administração de Barack Obama, para recuperar todas as sanções internacionais que pesavam então sobre o Irão, desencadeando o mecanismo conhecido por `snapback`.

Este mecanismo baseia-se numa contestada interpretação jurídica, através da qual Washington invoca o estatuto de Estado parte do acordo nuclear com o Irão, do qual se retiraram unilateralmente em 2018.

Segundo a resolução do Conselho de Segurança de 2015 que aprovou o acordo, os "Estados parte" têm a possibilidade de denunciar unilateralmente um "desrespeito significativo" dos compromissos por parte de outro signatário.

Ao ser acionado este mecanismo, inédito, inicia-se um prazo de 30 dias, findo o qual são restabelecidas (`snapback`) as sanções, sem que outros membros do Conselho de Segurança possam exercer o poder de veto.

Os Estados Unidos estão isolados nesta interpretação, com os outros países do Conselho, que continuam a apoiar o acordo nuclear, a defenderem que Washington perdeu o estatuto de Estado parte ao decidir retirar-se do acordo.

 

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