Irmã do Líder Supremo do Irão apela ao derrube de regime "despótico"

por Andreia Martins - RTP
WANA via Reuters

É mais um elemento da família do Líder Supremo do Irão a contestar a liderança do país. Numa carta divulgada esta quarta-feira, Badri Hosseini Khamenei, irmã de Ali Khamenei, critica o que considera ser um "regime despótico" que só trouxe "sofrimento e opressão" ao povo iraniano. A missiva é publicada precisamente duas semanas após a detenção da filha, Farideh Moradkhani, sobrinha do guia supremo do Irão, depois de ter participado nos protestos em curso no país desde a morte de Mahsa Amini.

“Eu oponho-me às ações do meu irmão”. As palavras são de Badri Hosseini Khamenei, irmã do Líder Supremo da República Islâmica do Irão, numa carta divulgada esta quarta-feira por Mahmoud Moradkhani, filho que está radicado em França.

Badri Hosseini Khamenei diz-se preocupada com o “povo iraniano, especialmente com as mulheres”. Aponta culpas ao regime vigente desde 1979, considerando que este não trouxe “nada para além de sofrimento e opressão aos iranianos”.

“Expresso a minha solidariedade às mães que lamentam os crimes cometidos pelo regime da República Islâmica desde a época de Khomeini até ao atual período do califado despótico de Ali Khamenei”, escreve Badri Hosseini Khamenei sobre o fundador e sobre a atual liderança no Irão.

Na missiva divulgada esta quarta-feira, a irmã do guia supremo considera que o povo iraniano “merece liberdade e prosperidade” e que a atual revolta no país “é legítima e necessária”.

Afirma ainda que o irmão “não ouve a voz do povo” e apela à Guarda Revolucionária para que “se una ao povo antes que seja tarde demais”.

Badri Hosseini Khamenei disse por fim esperar “o derrube deste poder tirânico no Irão” e sublinha que só os problemas de saúde que a afetam a impedem de participar na onda de protestos que tem varrido o país nos últimos três meses após a morte de Mahsa Amini, uma curda iraniana de 22 anos que tinha sido detida por uso incorreto do hijab.

Desde setembro, várias cidades iranianas têm sido palco de grandes protestos, com os manifestantes a pedirem mais liberdade para as mulheres, mas também a exigir a queda dos ayatollahs, que dirigem os destinos do Irão desde a revolução de 1979.

Nos últimos três meses, as autoridades iranianas detiveram milhares de manifestantes, tendo condenado à morte pelo menos 11 pessoas em julgamentos relacionados com os protestos. De acordo com a organização não-governamental Iran Human Rights, sediada em Oslo, morreram pelo menos 448 manifestantes devido à repressão dos protestos.
Contestação na família Khamenei
A irmã de Khamenei não é a primeira da família do guia supremo a opor-se às políticas da principal autoridade de poder no Irão. Há precisamente duas semanas, Farideh Moradkhani - sobrinha do guia supremo, filha de Badri Hosseini Khamenei - foi detida pelas autoridades após ter sido chamada à Procuradoria Iraniana por ter participado nos protestos.

Farideh Moradkhani e Mahmoud Moradkhani são filhos de Badri Hosseini Khamenei e do sheikh Ali Tehrani, líder destacado da oposição iraniana que morreu em outubro passado, aos 96 anos.

Tehrani começou por fazer parte da revolução de 1979, ao participar ativamente na contestação ao xá Mohammad Reza Pahlavi, mas acabou por ser enviado para a prisão aquando da chegada de Khomeini ao poder.

A família fugiu para o Iraque durante os anos 80, mas o teólogo xiita acabou por regressar ao Irão em 1995, onde foi condenado a 20 anos de prisão. Tehrani foi libertado dez anos antes, em 2005, e morreu em Teerão a 19 de outubro de 2022.
Apelos do ex-presidente Khatami
A carta da irmã de Khamenei, viúva de Tehrani, surge um dia depois de o ex-presidente iraniano, Mohammad Khatami, ter instado o regime a ceder às exigências dos manifestantes “antes que seja tarde demais”.

Khatami, da ala reformista, presidente do país entre 1997 e 2005, teceu elogios aos manifestantes e apelou aos dirigentes políticos para que “estendam a mão” aos manifestantes.

"Não se deve permitir que a liberdade e a segurança sejam colocadas em oposição uma à outra e que, como resultado, a liberdade seja esmagada sob o pretexto de manter a segurança, ou que a segurança seja ignorada em nome da liberdade", afirmou.

Mesmo com a forte contestação nas ruas, a liderança iraniana dá poucos sinais de cedências ou mudanças. No último domingo, chegou a ser noticiado o fim da polícia da moralidade, a quem são atribuídas as culpas pela morte da jovem Mahsa Amini, e uma possível revisão da lei do uso obrigatório do hijab.

No entanto, horas depois, os media iranianos apressaram-se a desmentir a notícia sobre a dissolução daquela autoridade, criada em 2005 para fiscalizar o código de vestuário das mulheres, adiantando no entanto que a polícia poderá vir a ser gradualmente substituída por novas tecnologias de controlo.
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