Mais de 11 mil migrantes detidos na Bielorrússia desde o início do ano

por Andreia Martins - RTP
Nas últimas semanas as atenções têm estado concentradas em Bruzgi, na Bielorrússia, junto à fronteira com a Polónia. EPA

A informação foi avançada na quinta-feira pela agência russa RIA, que cita o Conselho de Segurança da Bielorrússia. Desde o início de 2021, foram detidos mais de 11.500 migrantes e cerca de cinco mil foram deportados. Estes números são divulgados no mesmo dia em que a Human Rights Watch divulga um relatório avassalador sobre a crise na fronteira entre a Polónia e a Bielorrússia. A organização não-governamental adianta que pelo menos 13 pessoas morreram e pede uma intervenção mais humana por parte de Varsóvia e Bruxelas.

De acordo com o chefe do Conselho de Segurança da Bielorrússia, Alexander Volfovich, um voo de repatriamento, que deveria ter partido na quinta-feira para o Iraque, acabou por não acontecer. Estes 200 migrantes que iriam fazer esta viagem de regresso, estão retidos no aeroporto, acrescenta a agência.

A Bielorrússia adianta que tem operado vários voos de repatriamento nas últimas duas semanas como resposta à pressão da União Europeia, que já anunciou novas sanções contra o regime de Alexander Lukashenko.

Também na quinta-feira, a Human Rights Watch publicou um novo relatório sobre a situação na fronteira entre a Polónia e a Bielorrússia, local de difícil acesso para jornalistas e organizações não-governamentais ao longo dos últimos meses. A organização adianta que pelo menos 13 migrantes morreram nas últimas semanas, incluindo um bebé sírio de 1 ano.

Morrer aqui ou ir para a Polónia: A responsabilidade partilhada de Bielorrússia e Polónia pelos abusos na fronteira”, é o documento onde se relatam violações graves dos Direitos Humanos de ambos os lados da fronteira. A HRW esteve nos dois países durante o mês de outubro de 2021 e fez entrevistas de fundo com 19 pessoas, incluindo homens e mulheres que viajavam sozinhos e famílias com filhos.

De recordar que a crise migratória das últimas semanas entre Bielorrússia e Polónia é o culminar de uma questão que se arrasta há vários meses, desde o sequestro de um voo da Ryanair para detenção de um passageiro por parte do regime de
Misnk. O aparelho fazia a ligação entre duas capitais europeias em maio de 2021 e foi desviado para a detenção do jornalista, considerado opositor do regime.

Em resposta ao sequestro, a União Europeia desencadeou novos mecanismos sancionatórios contra a Bielorrússia, a que Minsk respondeu por sua vez, abrindo as fronteiras do país e facilitando os vistos a migrantes e refugiados que são posteriormente incentivados a entrar na Polónia, Lituânia e Letónia por via terrestre. Perante renovadas sanções, Alexander Lukashenko recuou e tem procurado devolver os migrantes que chegaram ao país aos locais de origem.

Enquanto a Bielorrússia fabricou esta crise sem ter em conta as consequências humanas, a Polónia partilha responsabilidades pelo grande sofrimento na zona da fronteira. Homens, mulheres e crianças têm sido atirados de um lado para o outro na fronteira, durante dias e semanas num clima glacial, a precisar desesperadamente de ajuda humanitária que está a ser bloqueada de ambos os lados”, refere Lydia Gall, investigadora da HRW para a Ásia e Europa.

A organização não-governamental dá o exemplo de um homem de 35 anos, vindo da República Democrática do Congo com a mulher e três filhos, todos com menos de 7 anos, que diz ter sido expulso por guardas polacos em outubro sem qualquer possibilidade de pedir asilo.

“Disseram-me que não há asilo, não há nada, volta de onde vieste. Pegaram em nós e fizeram-nos regressar à Bielorrússia, à zona neutra”, conta.

Em resposta a estas acusações, Varsóvia nega que tenha havido pushbacks de migrantes, ou seja, pessoas retiradas sem que seja dada oportunidade de apresentar um eventual pedido de asilo. No entanto, uma alteração recente à legislação polaca prevê que os guardas fronteiriços possam devolver no imediato os migrantes que atravessem indevidamente a fronteira.

Até 16 de novembro de 2021, houve pelo menos 29.921 pushbacks na fronteira polaca, denuncia a Human Rights Watch.

Neste âmbito, também a Bielorrússia é claramente acusada de maus tratos a estes migrantes, que ficam “detidos e sem alimento, água ou abrigo, impedidos de voltar a Minsk ou aos seus próprios países”. Mas, para além de apontar o dedo ao regime de Minsk, a Human Rights Watch critica a União Europeia por não ter falado publicamente das responsabilidades polacas nesta crise humanitária.

“A Comissão Europeia deve começar por mostrar solidariedade para com as vítimas na fronteira que estão a sofrer e a morrer de ambos os lados. A Bielorrússia pode ter orquestrado a crise, mas isso não isenta a Polónia e as instituições da União Europeia das suas obrigações em matéria de Direitos Humanos. Bruxelas deve pressionar Varsóvia a dar primazia à preservação da vida humana na resposta a esta crise”, considera Lydia Gall.
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