Polícia recorreu a violência para dispersar protesto de imigrantes em Paris

por Inês Moreira Santos - RTP
Christophe Petit Tesson - EPA

A polícia francesa desmantelou violentamente, na noite de segunda-feira, um acampamento improvisado de imigrantes no centro de Paris, entrando em confronto com migrantes e ativistas que se reuniram em protesto. A manifestação aconteceu depois de várias centenas de migrantes terem sido expulsos de um campo de refugiados no norte do país, ficando sem assistência e alojamento.

Cerca de quatro centenas de pessoas montaram tendas na Praça da República, em Paris, em sinal de protesto contra a política migratória francesa e contra a ausência de respostas sobre o alojamento dos que entram no país à procura de asilo político ou económico.

Mas as autoridades tentaram dispersar, de forma violenta, a manifestação e desmantelar o acampamento improvisado. A violência da intervenção policial parisiense foi filmada e as imagens que circulam mostram migrantes a serem arrastados para fora das tendas e gás lacrimogéneo a ser atirado para cima dos presentes. Segundo a imprensa francesa, alguns agentes da polícia usaram os cassetes e agrediram manifestantes em fuga.

Dezenas de tendas foram desmontadas da Praça da República, com alguns dos ocupantes sem alojamento e a serem obrigados a viver na rua. Em protesto pela falta de apoio aos migrantes, alguns voluntários e ativista juntaram-se à manifestação e começaram a gritar "documentos para todos, alojamento para todos!" quando a polícia começou a intervir.

Ativistas e defensores dos direitos dos refugiados que foram ao local para ajudar os refugiados e migrante também foram expulsos pelas autoridade, inclusive a vereadora de Paris Danielle Simonet, do partido de esquerda La France.

As imagens de violência estão gerar revolta em França, tendo o ministro do Interior exigido, entretanto, que se abrisse uma investigação sobre a ocorrência.

"Algumas imagens da dispersão do acampamento ilegal de migrantes na Praça da República são chocantes"
, escreveu Gérald Darmanin no Twitter esta terça-feira.



O ministro do Interior abriu uma investigação e garantiu tomar decisões nas próximas 48 horas, numa altura em que polémica lei da Segurança Global, que pretende proteger as autoridades policiais durante manifestações - um diploma que dá mais liberdade autoritária à polícia e que queria proibir os jornalistas de filmar os agentes de segurança - , volta ao Parlamento para ser debatida.


Por sua vez, as autoridades policiais alegam que só desmantelaram o acampamento porque era ilegal e não havia qualquer autorização oficial para poder estar naquele local.

Agora, vários voluntários tentam encontrar alojamento temporário para todos os requerentes de asilo, refugiados e migrantes que tenham ficado sem um teto depois de serem expulsos do campo de refugiados onde estavam no norte de França.

Corinne Torre, da associação Médicos sem Fronteiras em França, afirmou à Reuters que se trata de pessoas que "estão a andar sem rumo desde a semana passada, porque desmantelam acampamentos sem mediar o que acontece depois".

Segundo a médica, "a polícia tem um único objectivo: arrancar as tendas do chão e fazê-los andar sem rumo, mais uma vez".

A maioria destes migrantes é do Afeganistão, da Somália e da Eritreia. Alguns tiveram o asilo negado, outros estão numa espécie de limbo burocrático enquanto tentam inscrever-se, declarou ainda Torre.
Novo projeto de lei de Segurança Global votado no Senado

Esta polémica surge no momento em que o Governo está debaixo de fogo por causa da futura lei de segurança global, um diploma que dá mais liberdade autoritária à polícia e que quer proibir os jornalistas de filmar os agentes de segurança.

O Parlamento francês vota esta terça-feira no novo projeto de lei de Segurança Global, defendido por Emmanuel Macron, tem gerado controvérsia e críticas por quem considera que se trata de violação do direito de expressão em França.

O artigo 24 do projecto de lei de Segurança Global proíbe qualquer cidadão e jornalista de "filmar membros das forças de segurança com a intenção de prejudicar a sua integridade física ou mental".

Num comunicado de imprensa, associações defensoras dos direitos humanos acusam o governo francês de querer "calar a imprensa, travar liberdades como a liberdade de informação, de expressão e a de manifestar".

Organizações internacionais como a Amnistia Internacional, a Liga dos Direitos Humanos e os principais sindicatos de jornalistas francesas juntaram-se em manifestações na semana passada, para protestar contra esta lei de Segurança Global. Estas argumentam que esta lei pode "levar a mais detenções e violência" e que mediante o medo "de ser preso ou perseguido, a autocensura pode tornar-se a regra".

A verdade é que muitos casos não teriam sido julgados da mesma maneira sem o testemunho em vídeo de jornalistas ou cidadãos.

Recorde-se que, estes confrontos policiais com manifestantes e migrantes ocorre também numa altura em que França está em alerta máximo e a recuperar dos ataques das últimas semanas, devido à publicação e partilha de caricaturas do Profeta Maomé, que muitos muçulmanos têm considerado como um ato ofensivo.
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