"Tornou-se crime dizer a verdade". Relator da ONU apela à libertação de Julian Assange

por RTP
Julian Assange foi detido em 2019 na embaixada do Equador, onde estava asilado, estando atualmente a aguardar no Reino Unido extradição para os EUA. Vikie Flores - EPA

Os esforços para a libertação de Julian Assange, fundador da WikiLeaks detido há mais de dois anos numa prisão britânica, intensificaram-se esta semana, numa altura em que se aproxima a cimeira do G7 no Reino Unido. Para além de uma petição e de uma ação em Genebra, a libertação do ativista australiano foi também pedida pelo relator especial da ONU para a Tortura. A noiva de Assange já alertou para o "estado terrível" em que se encontra o parceiro, "incapaz de formar uma frase" por alegadamente ter a saúde física e mental afetada.

A detenção de Assange é “um dos maiores escândalos judiciais da História”, considerou na semana passada o relator especial Nils Melzer, que é também representante da Suíça para os Direitos Humanos na Academia de Genebra.

Para o responsável, os casos de Assange, de Edward Snowden (ex-funcionário da CIA que divulgou informações confidenciais da Agência de Segurança Nacional dos EUA) e de Chelsea Manning (ativista norte-americana que tornou públicos telegramas diplomáticos) são os “esqueletos nos armários dos países ocidentais”.

“É a história de um homem a ser perseguido no nosso lado do mundo por ter dito a verdade”, considerou Melzer. “Ele expôs crimes de guerra, ele expôs tortura, ele expôs corrupção. É uma verdade inconveniente”.

“Estão a ensinar aos vossos filhos que é bom ou mau dizer a verdade?”, questionou o relator da ONU, acrescentando que não pode deixar os seus próprios filhos viverem num mundo onde “se tornou crime dizer a verdade”, pois “assim que isso acontecer, significa que vivemos em tirania”.

Na passada sexta-feira, em Genebra, foi colocado um monumento temporário a Assange, Snowden e Manning. A instalação artística móvel, criada em 2015 por Davide Dormino, chama-se “Algo a dizer?” e mostra as três figuras em cima de cadeiras, com uma quarta cadeira vazia junto a elas.

Foto: Magali Girardin - EPA

No mesmo dia foi aberta uma petição pelo Clube de Imprensa de Genebra a exigir a libertação imediata de Assange, que é também jornalista. “Em nome do respeito pelos Direitos Humanos e pelos valores promovidos pelas organizações de Direitos Humanos de Genebra”, pede-se às autoridades britânicas que “recusem a extradição de Julian Assange e reponham a sua liberdade”, escreveu aquela entidade, solicitando ainda ao Governo norte-americano que “deixe cair a acusação”.

O Clube de Imprensa de Genebra apelou também aos Estados democráticos como a Suíça, para que “assegurem que Julian Assange dispõe de um território de refúgio onde possa proteger-se de novas acusações”.
Assange “num estado terrível, incapaz de formar uma frase”
Apesar de não ter sido ainda dado como culpado por qualquer crime, o ativista australiano permanece há dois anos na prisão de segurança máxima de Belmarsh, no Reino Unido, local onde já estiveram detidos alguns dos mais perigosos criminosos britânicos, incluindo terroristas e assassinos.

Os Estados Unidos continuam a pedir a extradição, que em janeiro deste ano foi recusada por um juiz alegando preocupações com a saúde mental de Assange. No sábado, a noiva do ativista disse que este se encontra “num estado terrível, incapaz de formar uma frase”, uma vez que está confinado 22 horas diárias numa pequena cela.

“O Julian não é violento, não é uma ameaça para a sociedade. Ele é jornalista e este caso é acerca da liberdade de informação. Esta situação envergonha o sistema judicial do Reino Unido”, declarou Stella Morris ao jornal Daily Mail.

Para a noiva de Assange, “é altura de o presidente Joe Biden deixar cair as queixas contra Julian, e [o primeiro-ministro britânico] Boris Johnson devia pedir-lhe que o faça na cimeira do G7 na Cornualha, esta semana”.

“Esperemos que, nesse momento, a Justiça prevaleça”, concluiu Morris.

A 47ª cimeira do G7 vai realizar-se no Reino Unido entre 11 e 13 de junho. Para além do Reino Unido, participarão também os Estados Unidos, o Canadá, a França, a Alemanha, a Itália, a União Europeia e o Japão.

Julian Assange, de 49 anos, foi detido em abril de 2019 na embaixada do Equador, onde estava asilado, estando atualmente a aguardar que o tribunal tome uma decisão sobre a sua eventual extradição para os Estados Unidos, que têm contra ele 18 acusações por ter divulgado documentos confidenciais em 2010.
pub