Desnuclearização da Península Coreana. O objetivo mantém-se inalterado do primeiro para o segundo encontro entre Donald Trump e Kim Jong-un, que começa esta quarta-feira na capital do Vietname. Desde que há oito meses os líderes norte-americano e norte-coreano se encontraram em Singapura, poucos foram de facto os progressos neste dossier. Muito focados na fotografia final, Trump e Kim saíram desse encontro inaugural com um plano de intenções mais simbólico do que concreto.
O facto de não haver sinais de reais progressos na desnuclearização da Península Coreana não significa, porém, que o encontro histórico de Singapura, a 12 de junho do ano passado, tenha produzido um resultado nulo. Antes de tudo, serviu para aliviar a tensão na região, onde os receios de uma escalada eram razão de inquietações para os sul-coreanos, principais aliados dos Estados Unidos naquela zona do globo.
O final da Cimeira de Singapura, durante o qual estiveram reunidos a sós, foi marcado por sorrisos e abraços, uma cordialidade sem suspeitas que alimentou mais a imprensa do que a diplomacia bilateral. Donald Trump viria dizer que estabeleceu “laços muito especiais” com Kim Jong-un, o que abria caminho a um novo tipo de relação entre os dois países. Kim Jong-un era agora visto como “muito inteligente”, um negociador “muito digno e difícil”, o oposto do epíteto de "Rocket Man" com que o brindara escassos meses antes.
Pyongyang mostrava-se finalmente empenhada em trabalhar pela "completa desnuclearização" da península, reiterando a promessa na declaração de Panmunjom, a 27 de abril, no encontro entre Kim Jong-un e Moon Jae-in, o Presidente sul-coreano.
Contudo, um embróglio ficou dessas rondas negociais até hoje, véspera da Cimeira de Hanói: estão ainda por definir os detalhes do processo de desnuclearização da Península Coreana. E é nesse sentido que Hanói deverá produzir o que falhou no pós-Singapura: “progressos reais”.
Agenda presidencial
Um mestre da propaganda em nome próprio, o Presidente Trump não tem deixado de tirar proventos do encontro de há oito meses. Disse-o em voz alta para inimigos e aliados que "se não fosse o presidente os Estados Unidos e a Coreia estariam agora numa guerra terrível".
E, para cantar vitória, é possível que Trump possa vir a baixar a fasquia em relação à Coreia do Norte. Seja por vir a tornar-se mais realista, seja por essa pressa de assinar um acordo com alíneas concretas, o mais provável é que as exigências norte-americanas venham nestes dois dias no Vietname fazer o seu caminho numa linha ténue, sem o bluff de 2018. Mas, não esquecendo que o secretário de Estado Mike Pompeo manteve uma agenda activa de quatro reuniões com Pyongyang nos últimos meses, não é de desprezar que o resultado de Hanói esteja já definido e os procedimentos de quarta e quinta-feira sejam meramente cerimoniais.
Pedras no caminho
Com a reunião a ter como cabeças-de-cartaz Donald Trump e Kim Jong-un, na sombra permanecerá o suspeito do costume: Pequim, na pessoa do Presidente chinês, Xi Jinping.
O líder coreano não dará um passo sem a bênção do seu maior – aliás, único – aliado. E Trump sabe-o, devendo igualmente ter consciência de que a guerra comercial que aqueceu nos últimos meses com a questão das taxas às importações da China desempenhará esta semana o seu papel à mesa das conversações.
O líder coreano não dará um passo sem a bênção do seu maior – aliás, único – aliado. E Trump sabe-o, devendo igualmente ter consciência de que a guerra comercial que aqueceu nos últimos meses com a questão das taxas às importações da China desempenhará esta semana o seu papel à mesa das conversações.
Consciente de que precisa da China para uma pressão final no dossier da efetiva desnuclearização da Coreia do Norte, Trump aliviou nos últimos dias o discurso sobre a taxação das importações chinesas, manifestando-se disponível para um acordo a contento das duas partes. O novo posicionamento da Administração norte-americana não terá deixado de ter em vista que o aliviar da tensão com Pequim será fundamental para evitar que uma intervenção silenciosa da China venha a minar um acordo sobre o arsenal nuclear norte-coreano.
A escolha de Hanói
Hanói não foi uma escolha feita ao acaso. Outrora inimigo declarado dos Estados Unidos, o Vietname mantém agora uma relação saudável com Washington, que poderá estar aqui a mostrar aos norte-coreanos como um regime isolado foi em três décadas capaz de operar uma mudança na sua estrutura socio-produtiva que lhe permite agora manter um tecido económico robusto e uma integração nos mercados internacionais.
Mais aprazível para a estrutura mental da liderança norte-coreana será, no entanto, o facto de o Partido Comunista do Vietname ter liberalizado a economia sem garantir do outro lado da moeda direitos civis ou políticos aos seus cidadãos. Uma mão-de-ferro sobre a imprensa é outro dos primados de que o regime não abdica.
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