E se em Portugal for aprovada a vacinação contra a Covid-19 para os adolescentes?

por Inês Moreira Santos - RTP
Kathleen Flynn - Reuters

A Agência Europeia de Medicamentos (EMA) deu luz verde, na passada sexta-feira, à administração da vacina da Pfizer e da BioNTech contra a Covid-19 a adolescentes entre os 12 e os 15 anos. Agora cada Estado-membro da União Europeia tem de decidir quando ou se pretende usar a vacina nestas faixas etárias. Embora as autoridades de saúde ainda não tenham anunciado a decisão, o Infarmed garante que estão a decorrer "atualmente vários ensaios clínicos" e que "não parece ser necessário o desenvolvimento de vacinas especificas para este grupo etário".

Embora os riscos de desenvolver sintomas graves ou de morrer com Covid-19 sejam menores em crianças e jovens, sabe-se que também podem contrair o vírus e transmiti-lo. Além disso, os mais novos têm sofrido indiretamente com a pandemia e as medidas de combate à Covid-19.

Por estas razões, os especialistas da alemã BioNTech começaram a avaliar, já no início do ano, a segurança e eficácia da sua vacina em adolescentes com pelo menos 12 anos.

Ainda não começou a ser implementada, mas a vacinação contra a infeção provocada pelo SARS-CoV-2 em jovens com menos de 16 anos não é uma novidade. À medida que os países mais desenvolvidos se aproximam dos objetivos de vacinação para adultos, vão alargando o universo de cidadãos a vacinar.

No início do mês de maio, o Canadá tornou-se o primeiro país do mundo a aprovar o uso da vacina da farmacêutica Pfizer em adolescentes com mais de 12 anos.

Seguiram-se os Estados Unidos: o regulador norte-americano aprovou, em meados deste mês, o uso de emergência da mesma vacina nesta faixa etária. Entretanto, a farmacêutica Moderna anunciou que também prevê pedir, em junho, à Agência de Segurança Alimentar e do Medicamento dos EUA (FDA, na sigla em inglês) para aprovar também a sua vacina em adolescentes entre os 12 e os 17 anos de idade.

Denominada por Comirnaty, a vacina de RNA mensageiro desenvolvida pela farmacêutica norte-americana Pfizer e pelo laboratório alemão BioNTech, já tinha sido autorizada pela EMA para todas as pessoas a partir dos 16 anos e recebeu a autorização de introdução no mercado condicional em toda a UE a 21 de dezembro de 2020.

E agora o regulador europeu aprovou também o fármaco para a administração em jovens entre os 12 e os 15 anos.

"Sendo esta vacina contra a Covid-19 de origem biotecnológica, teve que seguir obrigatoriamente para a sua aprovação o procedimento centralizado, ou seja o pedido foi efetuado à EMA, avaliado pelo seus Comités de peritos que emitiram uma recomendação sobre a aprovação (...) da vacina cabendo à Comissão Europeia a decisão final", explicou em declarações à RTP Fátima Ventura, diretora da Unidade de Avaliação Científica do Infarmed.

A decisão segue na mesma linha das recomendações dos reguladores do Canadá e dos EUA, mas cabe agora às autoridades de cada país da UE decidir se vai alargar a vacinação aos menores desta faixa etária e a partir de quando.

Os ensaios clínicos em desenvolvimento já demonstraram que tanto a vacina da Pfizer como a da Moderna - que ainda espera aprovação dos reguladores de medicamentos - são seguras e eficazes em crianças e adolescentes a partir dos 12 anos. Mas a questão, agora, é saber se as autoridades de saúde portuguesas pretendem alargar a vacinação aos adolescentes e até se podem começar a imunização antes do próximo ano letivo.
Haverá vantagens na imunização dos adolescentes?
São vários os estudos que referem que as crianças e os adolescentes, em praticamente todo o mundo, foram dos grupos mais afetados pela pandemia, pelo encerramento das escolas, as limitações sociais e os confinamentos impostos pelos Governos.

Até há umas semanas, os planos de vacinação contra a Covid-19 só previam a vacinação de pessoas acima dos 16 anos, na maioria dos países. Mas a imunização dos mais novos tem sido debatida e estuda há já alguns meses.

Foi ainda em janeiro que, numa reunião de executivos e especialistas da BioNTech em Mainz, na Alemanha, surgiu uma questão colocada por muitos pais: "Quando poderá a vacina ser aprovada para as crianças?".

A Alemanha já tinha manifestado interesse em começar a vacinar os mais novos até ao fim do verão, de forma a garantir que podem voltar com segurança ao ensino presencial já no próximo ano letivo. Além disso, os adolescentes são dos grupos que mais preocupam os peritos em saúde pública, considerando os comportamentos e os contactos sociais próprios destas faixas etárias.

Por isso, agora que a EMA já deu um parecer favorável, a Alemanha será o primeiro país da UE a administrar a vacina contra a Covid-19 a crianças e jovens em idade escolar, já a partir de dia 7 de junho.

Ainda não há informação sobre que posição tomará a Direção-Geral da Saúde relativamente à inoculação dos adolescentes a partir dos 12 anos, mas o Governo da Madeira já anunciou que pretende concluir o processo de administração da vacina da Pfizer aos jovens dessas idades antes do início do próximo ano letivo.
Ensaios clínicos são fundamentais
Os especialistas consideram que a vacinação de crianças de todas as idades pode ser fundamental para pôr fim aos surtos, uma vez que algumas investigações demonstraram que as crianças mais velhas podem ter um papel importante na propagação do vírus, embora normalmente não fiquem gravemente doentes.

Por isso mesmo, o Infarmed assegurou que "existem, atualmente, vários ensaios clínicos a decorrer com as vacinas contra a Covid-19 já autorizadas, com o envolvimento de crianças e adolescentes".

Quando a Pfizer e a BioNTech solicitaram a aprovação do fármaco ao regulador europeu basearam-se num ensaio clínico que envolveu 2260 adolescentes entre os 12 e os 15 anos, nos Estados Unidos, e que revelou uma eficácia de 100 por cento da vacina.

"Os resultados deste ensaio, anunciados a 31 de março de 2021, mostraram uma eficácia vacinal de 100 por cento nos participantes com ou sem infeção prévia por SARS-CoV-2 e respostas robustas de anticorpos. No ensaio, a vacina também foi geralmente bem tolerada", lê-se num comunicado da empresa. "Os participantes continuarão a ser monitorizados para uma proteção e segurança a longo prazo por mais dois anos após a sua segunda dose".

Os resultados deste ensaio clínico mostraram-se até mais promissores do que no grupo dos jovens acima dos 16 anos, cuja eficácia se revelou de 95 por cento.

"No caso da Vacina Comirnaty, o estudo realizado em mais de dois mil adolescentes entre os 12 e os 15 anos em que cerca de mil crianças receberam a vacina e as restantes placebo, revelou que a resposta imunológica neste grupo é comparável àquela do grupo dos 16 aos 25 anos, sendo a eficácia até um pouco superior no grupo dos 12 aos 15 anos com um valor de 100 por cento (com uma variação de 75 a 100 por cento)", esclareceu Fátima Ventura.

Aquando a decisão do regulador europeu, na sexta-feira, o chefe da Estratégia de Vacinas e Ameaças Biológicas para a Saúde da EMA, Marco Cavaleri, afirmou que o que permitiu a aprovação foi os dados provarem "que a vacina é segura nestas idades".

"Estender a proteção de uma vacina segura e eficaz a estas idades é um passo importante na luta contra esta pandemia", continuou o especialista. "Os dados mostram que a resposta imunitária nestes grupos é igual ou até melhor do que a que vimos nos jovens adultos".

Quanto à segurança, o especialista garantiu que a "vacina foi bem tolerada" e que os efeitos "são muito semelhantes aos que vimos nos jovens adultos".

"Assim que a vacina for implantada, será importante continuar monitorizando o desempenho da vacina e determinar se há algum problema de segurança", disse, acrescentando que os últimos meses mostraram que o sistema de notificação da Europa é capaz de detetar possíveis problemas em vacinas.

No entanto, vários especialistas alertam que o organismo das crianças não é igual ao dos adultos e, exatamente por isso, a avaliação dos efeitos dos fármacos em crianças requer mais tempo e mais custos.
Efeitos secundários dos adultos podem afetar as crianças?
A vacinação contra a Covid-19 começou, para a maioria dos países da União Europeia, no final de 2020 e, nos últimos meses, têm aparecido alguns casos de pessoas que desenvolveram outros problemas de saúde em consequência dos efeitos secundários de alguma das vacinas já aprovadas.

Atualmente, o comité de segurança da EMA está "a avaliar casos muito raros de miocardite (inflamação do músculo cardíaco) e pericardite (inflamação da membrana ao redor do coração) que ocorreram após a vacinação com Comirnaty, principalmente em pessoas com menos de 30 anos de idade". Apesar disso, "atualmente não há indicação de que esses casos se devam à vacina e a EMA está a monitorizar de perto essa questão".

De acordo com o Comité de Medicamentos Humanos da EMA, os benefícios da vacina no grupo etário dos 12 aos 15 superam os riscos.


Já segundo a Pfizer e a BioNTech, nenhum dos adolescentes vacinados, no ensaio clínico, teve covid-19 ou foi infetado pelo SARS-CoV-2, ao contrário do que sucedeu com 16 participantes de um grupo de controlo, aos quais foi administrado um placebo e ficaram doentes.

"O uso da vacina Comirnaty em crianças dos 12 aos 15 anos será o mesmo que em pessoas a partir de 16 anos. É administrada em duas injeções nos músculos da parte superior do braço, com um intervalo de três semanas", lê-se num comunicado da EMA.

Mas relativamente aos possíveis efeitos secundários das vacinas nas crianças, estes "são semelhantes aos das pessoas com 16 anos ou mais", incluindo "dor no local da injeção, cansaço, dor de cabeça, dores musculares e articulares, calafrios e febre". E o regulador europeu reforça que "esses efeitos são geralmente leves ou moderados e melhoram alguns dias após a vacinação".

Segundo a perita do Infarmed, sendo as reações adversas "ligeiras a moderadas e semelhantes ao que já se observou noutros grupos etários", parece não "ser necessário o desenvolvimento de vacinas específicas para este grupo etário ou de redução de dose".

"Tal não significa que o mesmo se possa aplicar a crianças mais jovens", esclareceu a também avaliadora da EMA.

A RTP procurou obter esclarecimentos por parte da Sociedade Portuguesa de Pediatria, que fez depender a divulgação do conhecimento e aprovação prévios deste artigo. Esta é uma exigência que a RTP não pode aceitar por razões éticas e deontológicas.
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